CRÓNICAS

20-12-2003
marcar artigo

CRÓNICAS

CRÓNICAS DA PROVÍNCIA E INTERVENÇÕES PARLAMENTARES

NOTA PRÉVIA

Em virtude dos constantes pedidos do livro supracitado, e não o pensando reeditar, aproveito a Internet para o colocar à disposição do público.

A RAZÃO

Os portugueses são por natureza desinteressados das suas coisas, o que equivale a dizer que desprezam a sua verdadeira cultura para se regalarem com aquilo que importam do estrangeiro e é muitas vezes de péssima qualidade.

Depois, temos da vida um sentido restrito que acaba por abafar o espírito criativo, a inspiração e o gosto.

Quantos portugueses agiram sempre por iniciativa própria, sem conselhos nem ajudas de ninguém, guiados só pela sua sensibilidade, sentido estético e amor à terra onde se nasceu e se ama extremosamente?

Foi pensando em você, que me lê e mal me conhece que eu escrevi e aceitei um dia ser Deputado. Das centenas de crónicas escritas, respiguei algumas, e das intervenções parlamentares os momentos mais significativos.

Na consciência não me pesa a luta em favor daqueles que menos sabem se defender. Pesa-me sim os erros que cometi e que tentarei até ao fim da vida redimir.

Enquanto não o consigo, vou escrevendo sempre tudo quanto a vida me tem ensinado.

Espero que a minha experiência lhe seja de alguma utilidade.

O ESCRITOR É UM IMITADOR DE DEUS

Uma forma feliz de utilizar a existência é sem dúvida a escrita. O mundo das Letras, o sacerdócio da palavra colocada sempre mais ao serviço dos outros do que ao serviço do autor.

O escritor é normalmente um sacrificado que trabalha para os homens da sua geração e, muitas vezes, para os das gerações futuras ficando-lhe a fama de que pessoalmente nada aproveita.

Reparem em Camões, hoje um poeta património da humanidade e que celebramos no dia 10 de Junho como um símbolo desta pátria querida que tanto amamos. Camões morreu à fome.

Apesar de tudo exortamos a juventude a olhar a prática literária como uma das mais interessantes manifestações da actividade humana e uma daquelas que dá ao homem uma maior realização.

Salvo raras excepções nunca a profissão das Letras foi próspera, mas a verdade é que dos homens fabulosamente ricos do tempo de Camões, de Camilo ou de Fernando Pessoa ninguém se lembra. O escritor, esse, viverá eternamente na sua obra e nos seus leitores.

O escritor cria um mundo que lhe agrada. Forja as pessoas que gostaria que existissem. Faz vidas. É, de alguma maneira, um imitador de Deus.

AI DOS VENCIDOS

No jornal “O DIA” de 18 de Março, na primeira página que vem um escrito de José Sampaio contra Marcelo critério.

Um combate desigual, nove assaltos contra um ausente, a esgrima do passado, o não entender o presente, o não esperar pelo futuro.

Depois 50 anos de vida política, de presença pesadíssima no Governo de uma Nação, o professor Marcelo Caetano é acusado e atacado como se tivesse sido ministro em fim-de-semana, como se tivesse o poder absoluto e o jogasse às urtigas, como se tivesse encarnado o próprio Deus sem conseguir o milagre de transformar as pedras em pão e o País em paraíso.

De poucos lados esperávamos uma tão apressada análise a um homem e a uma época, como esta de José Sampaio e do jornal “O DIA”.

A história necessita de facto da frieza do tempo, da calma, do ânimo, da ponderação dos que vierem depois. Intervindo politicamente, isto é fazer política, parece ser a vocação do homem perante a sua própria época deixando a quem vier a tarefa do julgamento e das conclusões.

O Sr. Sampaio é pequeno e parco para saber se os homens que rodearam Marcello Caetano eram muito bons ou muito maus. Se Sr. Sampaio se quer mostrar aos olhos da Revolução um revolucionário terá que agradecer a Marcello Caetano a própria revolução sem o qual, segundo diz, o regime continuaria.

Impressiona a lágrima nos olhos do leão moribundo incapaz de se valer das garras, outrora potentes, para afastar os rafeiros que lhe ladram de perto.

Marcello Caetano, com todos os pecados do ser humano, foi neste País da estatura que os Sampaios nunca terão.

Sampaio, Sampaio, quem és tu?

NOTA: este artigo motivou correspondência vária, com o Professor Marcello Caetano, que no livro saiu com o fac-símile das duas cartas do Professor, mas que aqui irão só em letra de imprensa.

Rio 30.III.78

Sr. Dr. Cunha Simões

Creio que é primeira vez, desde o 25 de Abril, que um jornal tem coragem de tomar a minha defesa contra injúrias bolsadas sobre o meu nome ou a minha obra por um foliculário qualquer.

Por esse motivo, quero dizer-lhe quanto estou grato e ao jornal “A Província”, admirando a coragem, a independência e isenção de que dão provas. Oxalá o público reconheça que o existe de valioso nesse atributos e corresponda com o seu apoio.

Com toda a consideração me subscrevo.

M.Att.de

Marcelo Caetano

Rio II.XI.78

Sr. Dr. Cunha Simões

Recebi sua carta de 24 de Outubro que não me surpreendeu porque há bastante tempo, pela Imprensa e através da nossa comum amiga Maria José Folque, venha apreciando a lucidez da sua inteligência e a sua excepcional coragem moral. É uma página admirável com um testemunho precioso que muito agradeço. Nem sempre de acordo com os juízos nela formulados (embora largamente aberto ao pensamento do meu tempo, poderei ser considerado um “estrangeirado”?), os que me dizem respeito, porém, não me compete discuti-los, pois ninguém é bom juiz em causa própria.

Só uma resposta quero dar à pergunta que, alturas tantas, faz. Por que motivo aceitei em Setembro de 1968 o encargo do Governo, depois de dizer aos amigos e ao próprio chefe do Estado que “não tinha comigo solução para nenhum dos prementes problemas nacionais”? A verdade é que a partir da doença do Dr. Salazar as pressões de amigos e até de desconhecidos que se apresentavam como patriotas inquietos foram muito grandes: “se for convidado não diga que não...” E o próprio Presidente República ao formular-me o convite me informou: ouvi mais 40 pessoas, civis e militares, e 99% puseram à cabeça o seu nome... Tive a sensação de que recusar naquela altura, ao fim de tantos anos de vida pública, seria uma cobardia, a recusa a prestar um serviço que a Pátria me exigia em momento crítico...E disse que sim, com a morte na alma. Devendo dizer que não contava com o acolhimento popular que tive. Também aos íntimos confidenciei a minha convicção de que ia percorrer uma via-sacra, que passara o tempo das grandes manifestações de apoio ao Governo e dos aplausos carinhosos a quem exercia... e nos primeiros tempos os próprios colaboradores mais próximos só traziam informações pessimistas e rumores desagradáveis da opinião pública. Foi quando resolvido pô-los a todos de parte e lançar mão da TV, inaugurando as “conversas em família” e criando através delas um vínculo directo e pessoal com o povo. Nas minhas deslocações à província, logo a seguir, sentiu o impacto dessa comunicação: a gente vinha à estrada para ver de perto aquele de que conhecia a imagem (como se eu fosse um actor, e exclamava. “Olha, é como na televisão!”) Foi isso que me permitiu aguentar cinco anos e meio o regime e fazer um esforço para salvar o que fosse possível, no meio da cegueira dos políticos, da recusa de colaboração dos adversários ou dos reticentes, do egoísmo dos capitalistas, da estupidez da alta burguesia, das ilusões dos intelectuais irresponsáveis, da manobra da Igreja preocupada em não perder algum comboio vindouro e a braços com o problema ultramarino que no o país a direita se recusava a compreender da única forma possível e que a ONU não deixava resolver pela única maneira que seria admissível para Portugal.

Escrever mais livros? Não me sinto com paciência para fazer. Bem basta o que ainda me forçam a dizer em minha defesa...

Sei que a sua mulher é filha do meu condiscípulo Fernando Corte Real: peço-lhe que lhe transmita os meus respeitos.

Creia-me, muito grato e att.

Marcello Caetano

INGRATIDÃO

Se alguém quisesse destacar uma classe importante na sociedade Portuguesa poderia com vantagem lançar mão da figura do ingrato.

Bajulador, servil, pronto para tudo bem enquanto precisa, reconhece na figura do que o protege o senhor supremo.

Com quem adivinha o futuro próximo exagera a sua actuação dando bem a entender que os seus sentimentos não podem durar muito.

Passada que é a necessidade, e satisfeito desejo, o ingrato rejeita o seu protector como algo incómodo e desnecessário.

Tudo se agrava se aquele que fez o favor passa por dificuldades ou precisa de uma mão amiga.

O ingrato como sub produto da humanidade, mostra-se incapaz de ajudar aquele que o ajudou demonstrando assim que não compreende este mundo de Cristo nem o pode aceitar como coisa sua. Infelizmente, esta atitude é agora e de sempre.

Sem falar em Judas, que O traiu, invoquemos a figura de Pedro que negou três vezes o seu mestre por cobardia.

São assim as relações entre os homens.

Pouco mais há a esperar de um mundo em que as relações humanas empobrecem de dia para dia.

A HUMILDADE DE SERVIR O PRÓXIMO

Neste país à beira mar plantado, um jornal deveria reflectir as forças e as fraquezas do Povo que serve e da região que defende, ora perante a centralização política e a exploração desenfreada de toda a província portuguesa por parte de Lisboa. É necessário que os jornais de província se fortaleçam cada vez mais.

Na verdade temos de nos lembrar que Lisboa consome 90 por cento dos impostos recolhidos na província e em nome de um grupo político a que se convencionou chamar Governo de Portugal, mas que nos mantém no mais profunda atraso das regiões da Europa.

Só o jornais conseguiram motivar e consciencializar todos os portugueses para a tarefa que todos temos de fazer em comum sem que para isso se tenham de privilegiar umas regiões em desfavor de outras, mas para que isso aconteça é necessário que os jornalistas saibam traduzir no seu jornal a realidade em que os cerca.

Fazer jornais em cima do joelho é contraproducente, por este motivo é necessário que os jornais de província providenciem para que nestes órgãos de informação se vão preparando pessoas que possam trabalhar a tempo inteiro de modo a emprestar-lhes toda a força e coordenação.

Temos de colocar no pensamento que dirigir um jornal é uma arte que necessita de alguém que alie à qualidade literária e cultural uma visão sociológica do seu tempo, dedicando-se por inteiro, aos interesses fundamentais dos seus conterrâneos e à humildade de servir o próximo.

A MÁ-LÍNGUA EM PORTUGAL

A má-língua em Portugal é a única instituição que funciona.

Nunca ninguém tentou fazer neste país fosse o que fosse que não levantasse de imediato uma onda lamacenta de maledicência.

Por esse mundo Cristo, deixa-se governar quem governa e trabalhar quem trabalha. Em Portugal ainda não se conseguiu esse objectivo. Na verdade, quando é preciso, mas só quando é preciso utiliza-se a crítica inteligente, séria e frontal.

Em Portugal, seja qual for o serviço a prestar ou prestado, injuria-se, sabuja--se, difama-se. É a resposta da incompetência num país em que muitos não querem trabalhar e muitos outros não sabem trabalhar.

O Governo terá dois caminhos: o caminho do passado; via Salazar obrigando a safanão, a meter a viola no saco aos imbecis.

A outra solução é cerrar os ouvidos a quem não merece atenção e ordem nenhuma.

Seja qual for estratégia da maledicência há que continuar o caminho das decisões, da reconstrução, do ressurgimento nacional indispensável ao tal país aonde todos desejamos que dê gosto viver. Faz falta deixar que os outros se sintam livres, senhores da sua iniciativa, da sua imaginação, da sua actividade de trabalho, não inutilizando com os pequenos desgostos os homens que podem e devem transformar Portugal.

Isto mesmo não quer dizer que não haja crítica ou que ela tenha que ser benévola ou inoperante.

Isto mesmo não quer dizer que se afrouxe a guerra sem quartel aos traidores da Pátria e aos que vendem o país todos os dias.

Isto mesmo não quer dizer que não se possa utilizar a máxima severidade para os pseudo democratas e para os trapaceiros políticos que utilizam a liberdade e ingénua das democracias para as aniquilar sem dó nem piedade e para todo o sempre.

NO PAÍS DO IMPROVISO

O improviso é para os portugueses fatal como destino.

O improviso português tem séculos e marca os grandes e os mais terríveis momentos que nos foi dado viver como Nação.

Tanto na paz como na guerra nunca nos preparámos, preferimos sempre actuar rapidamente e em força. E o defeito nem é sequer desta ou daquela facção de portugueses, veio dos confins da monarquia, entrou pela República, aguentou-se no longo período Salazarista, está de pedra e cal na democracia.

Cada ministro das Finanças improvisa um sistema, cada ministro do trabalho tem uma estratégia, cada secretário de Estado dos Desportos tem uma finalidade muito própria e muito pessoal.

Nada foi pensado com tempo, consequentemente.

Acontece, por vezes que se ganha na secretaria o campeonato que se perdeu no campo e todo estamos recordados que antes de principiar o campeonato do Mundo de Futebol os dirigentes federativos abençoavam a crise das Malvinas que eles pensavam afastar a Inglaterra do campeonato do Mundo para nos dar lugar a nós, exemplarmente eliminados nos campos do desporto e o mais curioso, nisto tudo, é que nem nos admiraria muito que se lá fôssemos acabássemos por vencer o campeonato do Mundo devido a essa fúria incontrolada que tem talhado, nesta terra os santos os heróis.

“Mísera sorte, estranha condição” como diria o poeta na expressão que melhor caracteriza este povo a quem alguém chamou por alguma razão especial “vândalos da Europa” que curiosamente vivem na terra do melhor vinho do Mundo, têm 80% do sol do planeta e são na sua inconsciência e no seu improviso, felizes como crianças

Embora pareça mentira é neste país, que uns chamam de subdesenvolvido e outros de país do improviso, que vêm passar férias os tecnocratas de todo o mundo para aprenderem a viver como homens e a desfrutar em prazer e amizade o convívio de um povo que ainda sabe saborear a vida.

SOMOS POBRES PORQUE QUEREMOS

Um país com o clima que temos, situado na Europa, é pobre somente porque quer.

Bastaria organizar-se única e exclusivamente como país de Turismo e todos viveríamos bem e a contento, sendo ainda extraordinariamente úteis para os povos de todo mundo ao proporcionar-lhes o repouso a que todos têm direito.

Preferimos porém minar as potencialidades deste país com milhares de trabalhadores que não trabalham ou trabalham mal e centenas de empresas públicas que mais não fazem do que pagar salários retirados das contribuições de todos nós, mesmo dos mais pobres.

Na verdade, somos pobres só por não ser capazes de reflectir minimamente para tirar deste país tudo quanto Deus nos quis dar de mão beijada e nós temamos em não querer aproveitar.

Contra isto... não há que culpar só o Governo. Todos, mas todos temos igual culpa.

O CONTACTO PRIVILEGIADO COM A NATUREZA

O nosso País, pode representar para o Europeu o oásis, o paraíso terreno, o contacto privilegiado com a natureza.

Na Verdade, talvez não seja a sociedade tecnológica, o grupo ideal para se viver, talvez não seja a sociedade das grandes fábricas a melhor escolha para passarmos os poucos anos que andamos pelo mundo. Por isto mesmo, é provável que Europa evoluída possa beneficiar do “atraso” de Portugal, até agora defendido do assalto tecnológico e do desgaste industrial.

Por um milagre inexplicável conseguimos preservar a gastronomia, o artesanato, o folclore e sobretudo salvaguardar a pureza deste povo acolhedor, hospitaleiro e amigo.

É este o contributo que vamos dar a Europa.

Não concorremos com óperas, nem teatros, nem cinemas, mas aposto que vai fazer sucesso o grupo dos Pauliteiros de Miranda, o Fandango do Ribatejo, a Tourada à portuguesa, a caça à raposa, o cavalo lusitano, o nosso vinho, a nossa aguardente, as alheiras de Mirandela e sobretudo o queijo da serra que é, nem mais, nem menos o melhor queijo do mundo.

Esta pequena lista é realmente a grande moeda troca que mostrará à CEE que fez o melhor negócio da sua vida ao acolher Portugal.

Temos a certeza que a Europa do progresso, da prosperidade e do trabalho duro e organizado nunca se arrependerá de ter recebido este país maravilhoso onde o tempo corre suavemente e tem o verdadeiro paladar da vida.

O paraíso está às portas da Europa e tem o nome mais querido: Portugal.

ORGANIZAR O PRAZER DOS OUTROS

Vêm aí os estados unidos da Europa e com maior ou menor vontade começa a ser pouco possível conservar independências absolutas, isto é: ter a porta fechada e a chave no bolso.

Sendo assim, provavelmente os países distribuirão entre si tarefas a cumprir aconselhando prioridades neste ou naquele sector e distribuindo regalias conforme a execução destas tarefas.

Deste modo, quem tiver características para a Agricultura fará esta ou aquela espécie de Agricultura. Quem tiver características para a indústria e sobretudo quem tiver características industriais e tecnologia avançada intensificará esse ramo em proveito de todos.

E nós?

Nós... agricolamante pobres, industrialmente reduzidos quase a zero, será possível ficarmos reservados para os tempos livres vendendo aos outros o tesouro do nosso sol, da nossa temperatura e a simpatia da nossa gente?

Será possível que o industrial do Turismo do nosso país passe esta segunda actividade nacional para primeira e daí a actividade exclusiva ou quase exclusiva?

E por que não?

Organizar trabalho, isto é, neste caso, organizar o repouso, é contribuir para que a nossa actividade seja mais rentável e mais lucrativa.

Numa Europa de trabalho, não é vergonha, para ninguém, transformar Portugal num autêntico paraíso, onde as estadias serão verdadeiras curas de corpo e de alma.

Não quer isto dizer, que não se trabalhe e não se trabalhe a sério. O que nós temos é de organizar bem o prazer dos outros, preparando Portugal como um verdadeiro país de Turismo onde o ar puro, as águas cristalinas das nossas fontes e riachos, a limpeza das nossas praias e ruas seja um facto suficientemente forte para atrair milhões de outros europeus em cujos países já é difícil respirar o ar despoluído que ainda lhes é oferecido e que teremos de conservar se desejarmos continuar independentes, ricos, prósperos e... saudáveis.

O DOTE COM QUE ENTRÁMOS NA CEE

Quando se fala de Portugal na CEE vem sempre à baila a questão económica como se Europa unida não fosse mais que um casamento de convivência para ganhar mais dinheiro.

Se uma das vantagens da união dos países da Europa é a vantagem económica, em nosso ver não será a principal e muito menos a única.

Fundamentalmente os jovens destas doze nações têm agora um espaço muito maior. A Europa não sendo uma pátria é um amplo campo de amizade, cultura e vivência. E talvez resida aqui a grande conquista desta comunidade fraterna que nos torna cada vez mais cidadãos do mundo.

É lógico pois que a jovem Comunidade sinta dificuldades enormes na sua organização e no seu dia-a-dia porque ela é uma novidade total em relação ao futuro e luta com forças do passado, velhas de muitos séculos e de difícil remodelação.

Espero bem que a Comunidade Europeia não perca a coragem e seja um acto irreversível em relação aos Estados Unidos Europeus, indispensáveis ao equilíbrio das forças que actualmente dominam o mundo.

Mas se para Portugal a grande vantagem da adesão estará na sua evolução económica também Europa poderá tirar vantagem da experiência, da qualidade natural e do engenho do novo mundo que integra.

Em que consiste então o dote com que entrámos na CEE?

Fundamentalmente, consiste numa cultura quase milenária, profundamente original e desconhecida dos europeus.

Como é evidente sofremos ao longo de todos estes séculos alguma influência da Europa e, curiosamente, é esse aspecto que as nossas entidades oficiais desejam mostrar sempre que somos visitados por estrangeiros.

Normalmente escondem, como acto menor de cultura, um espantoso artesanato, uma gastronomia riquíssima e variada, um folclore variado e vistoso que assinala a presença de gentes de todo mundo.

A juntar a isto um clima, uma paisagem e uma gente deslumbrante.

A Europa recebeu um parceiro não poluído, experiente nas andanças do mundo e receptivo a inovações. As trocas serão de igual para igual embora ingenuamente, muitos pensem que os portugueses ficaram beneficiados.

Há quem pense o contrário e é por isso que o mundo soma e segue.

PORTUGAL PODE SER O PAÍS MAIS FORTE E APETECÍVEL

Em relação aos países europeus mais desenvolvidos estamos bastante atrasados, o que não quer dizer que a nossa situação não seja, por via disso mais cómoda e mais capaz de projectar um futuro, provavelmente de melhor qualidade do que aquele que terão os nossos parceiros da CEE.

Estes países sacrificaram ao progresso, aspectos muito importantes os quais passam pelo ambiente, pelo stress, por agressões à natureza e ainda por graves atentados contra a condição humana, o que já fez desencadear um processo acelerado de suicídio, de consumo de drogas, de corrida aos psiquiatras.

Os nossos parceiros da CEE vivem melhor, mas cada vez com menos interesse e alegria.

É certo que não podemos viver a aventura dos países ricos, mas se por um lado ficamos mais pobres em divisas, ficamos por outro mais ricos de oportunidades ao poder preservar o ambiente onde a vida decorra com harmonia, e onde seja possível fazer repousar outros homens de países industrializados sujeitos a uma pressão insuportável pelo ritmo de trabalho, pelo ambiente e pela envolvência.

Portugal, em vez do mais fraco dos países industrializados, pode ser o mais forte dos países turísticos da Europa.

REFÚGIO E TERRA ABENÇOADA

Ao contrário da Europa da produção, das fábricas e dos detritos, Portugal pode ser a Europa das férias, do prazer e do repouso.

Felizmente, longe do clima de guerras, fomos até agora, neste continente, refúgio e terra abençoada de paz. E embora não seja possível viver sem poluir a verdade é que acidentalmente e por via do nosso ancestral atraso deparamos hoje para Portugal com a solução ecológica como único ponto de saída.

Neste país o tempo corre lentamente ignorando a fúria das horas e gozando o lazer dos séculos. Ofereçamos pois, a essa Europa apressada e já com sintomas de artérioesclerose, a pujança de um país novo que regressou de África com forças redobradas e que tem para oferecer a paz, a segurança, o bem-estar e o ar de puro que se respira do Minho Algarve e onde o paladar do Vinho ribatejano ou do azeite beirão são néctares próprios do deus homem que cada vez pagará mais para viver neste País à beira-mar plantado, mas cujo preço será, óbvia obviamente compensador.

Portugal, País de férias, é isso um bom motivo para entrar pela porta grande na CEE.

NÃO BASTA FAZER LEIS

Viver hoje em dia em sociedade é algo complexo, difícil.

A vida já nos disse que nos dias de hoje o analfabeto é um autêntico cego perdido num labirinto. Precisamos de conhecer concretamente os nossos direitos e os nossos deveres.

Precisamos de ter acesso fácil às nossas regalias.

Precisamos, em suma, de campanhas que nos alfabetizem socialmente.

Não basta fazer leis. É preciso divulgá-las constantemente, nunca nos cansando porque todos os dias há novos cidadãos que chegam à vida.

Democracia é precisamente isto: valorizar as pessoas, tornando-as mais integradas na sociedade em que vivem.

A par disto é preciso convencer os funcionários públicos que estão ao serviço do povo e que é o povo quem lhes paga.

Em todas as terras há nas repartições públicas funcionários extremamente amados e respeitados e outros profundamente odiados e desprezados.

É preciso, também aqui, preparar os que atendem o público para que isso possa ser feito com carinho, dedicação e eficiência.

UM PAÍS NÃO PODE SER GOVERNADO EM CIMA DO JOELHO

Entrando de rompante nesta Europa onde o progresso e a democracia pontificam há décadas, Portugal estremece em cada dia passa e enfia-se atabalhoadamente em jogos dos quais mal sabe as regras.

Na verdade, a nossa impreparação, faz com que os políticos e que a política por nós seguida se venha degradando rapidamente. Essa degradação é tão alarmante que poderá vir a custar-nos a nossa própria sobrevivência.

Com efeito, em Portugal, tem-se confundido o termo democratizar, com abandalhar e isso é tal modo grave que a descrença e o desinteresse vão-se instalando comodamente no interior da sociedade portuguesa o que lhe poderá trazer dentro de um ou dois anos gravíssimos amargos de boca. (Medite-se nos retornados de Angola e Moçambique e nos massacres praticados em Timor).

Se por um lado pretendemos imitar os países onde o bem-estar é evidente e as instituições democráticas funcionam, por outro lado esquecemos que um país não pode ser governado em cima do joelho e temos forçosamente, se quisermos sobreviver, de lhes imitar também os organismos públicos que estão solidamente entregues a técnicos profissionais e a políticos e eficientes que, em qualquer circunstância, asseguram a manutenção da máquina do Estado evitando, desta maneira, situações dramáticas e irreversíveis.

Portugal necessita de encontrar, urgentemente, uma equipa nova, dinâmica, digna e competente que trace as linhas mestras da recuperação nacional que nos consiga aguentar como país independente

Temos largar infantilismos e quezílias despropositadas. Temos de manter firmeza nas decisões justas e sensatas, e é preferível ouvir a gritaria dos opositores que ainda conseguem comer com regularidade, do que o choro surdo dos famintos que morrendo pelos casebres ou pelas esquinas nos hão-de acusar de pusilânimes, de inconscientes e de medrosos.

PORTUGAL NUNCA SE ORGANIZOU A NÍVEL DE TRABALHO

Em Portugal viu-se o fenómeno muito antigo e muito curioso. Emigra-se porque o país nunca se tendo organizado a nível do trabalho apresenta um número reduzido de postos de trabalho e esses, mal remunerados.

E estamos mesmo convencidos que os Descobrimentos resultaram de um caso de emigração.

Por outro lado poderemos dizer que nunca nos organizámos bem economicamente porque preferimos emigrar.

Como vai ser o futuro?

Para já entrámos na CEE e o primeiro embate parece-nos positivo, por outro lado a crise do petróleo passou, no entanto e por paradoxal que isto nos pareça estamos convencidos que se aproxima uma nova era de fortíssima emigração e isto por dois motivos: voltará a ser necessário a mão-de-obra nos países da CEE e, a médio prazo, os portugueses voltarão a ser solicitados para trabalhar em Angola e Moçambique resultando daqui uma sangria profunda da população portuguesa que poderá chegar ao fim do século com menos de oito milhões de habitantes.

Ou então, mais grave ainda, seremos emigrantes no nosso próprio país, pois individualmente ou em grupos, as empresas estrangeiras vão invadindo Portugal e de repente, sem bem sabermos como, está tudo a trabalhar para patrão estrangeiro em terra portuguesa.

Será mesmo este o nosso destino. Vender a alma a alegria e Portugal actuou como os míseros tostões ou será que os portugueses, conscientes do seu valor, utilizando a massa cinzenta a cem por cento se nem e acreditam, finalmente, que podem construir na terra onde nasceram o lugar de sonho que sempre imaginaram para si e para a felicidade seus filhos?

OS TRABALHADORES DA TERRA

Explorados desde tempos ancestrais os trabalhadores da Terra vão abandonando a mesma com amargura e desilusão devido não só à subida desenfreada dos adubos, do gasóleo, das sementes, mas também pelo desprezo com que são tratados.

Gil Vicente pôs na boca de um lavrador a célebre definição: “nós somos vida das gentes e morte das nossas vidas”.

Como há 500 anos a lavoura é ainda em Portugal a morte espiritual do homem condenado ao trabalho pesado, permanente e rude, ao analfabetismo, à vida isolada, à ausência de serviços de saúde.

A desordem da nossa agricultura obriga à desordem na vida do homem do campo.

Por isso e muito naturalmente esta agricultura obsoleta que se pratica no nosso País não interessa a ninguém, não serve ninguém, desertificando cada vez mais os campos e fazendo que eles contribuam cada vez menos para o nosso bem-estar e para uma alimentação que venha para os portugueses da terra portuguesa.

Terá que se encarar a vida agrícola como um trabalho igual ao de um banco, de um hospital, de uma secretaria ou de uma escola.

Isto mesmo se faz já há muito tempo em França e na Inglaterra. Nós se não o fizermos também nunca mais atingiremos o nível do mundo desenvolvido onde o bem-estar e a segurança social são a raiz da felicidade dos povos que aí habitam.

DEFENDEMO-NOS COM A EMIGRAÇÃO E O TURISMO

Portugal nunca foi bem governado. Só assim se compreende que tenhamos chegado ao final do século XX com uma agricultura medieval, uma indústria e um comércio incipientes, sem marinha, sem aviação e com um exército obsoleto e inoperacional.

Defendemo-nos com a emigração e com o turismo.

A história apontando os dois ou três reinado dos e dois ou três estadistas isolados que saíram do marasmo sem que a sua obra tivesse continuidade.

O problema mantém-se nos nossos dias em que grande falha política e social continua a ser a direcção das empresas e em última análise a direcção do País.

De facto nunca soubemos fazer nada com regularidade.

De tempos a tempos cai-nos nas mãos uma Índia ou um Brasil os quais acabamos por perder sem glória nem proveito e não vemos modo de modificar esta situação que se agrava a cada vez mais, tornando impossível a modernização de que tanto se fala.

Estamos de novo numa séria tentativa de acertar o passo pela Europa que acabou por nos receber na Comunidade económica.

É uma tentativa onde temos de colocar toda a nossa esperança, embora o atraso que nos separa dos países ricos da Europa, agora nossos parceiros, seja muito grande.

Não nos podemos esquecer que, oficialmente temos ainda 20% de analfabetos e 80% de semi-analfabetos que praticamente nada lêem e nada escrevem depois que saíram da quarta classe.

Isto não quer dizer que o português não seja hábil, disciplinado, cumpridor e honesto.

Perante o desafio que a Europa do progresso e do bem-estar nos propõe, vamos agarrar com ambas as mãos a nova situação e aplicar no nosso país os méritos que os outros nos reconhecem e que já demonstrámos, sobejamente, em terra alheia.

O PORTUGUÊS EMIGRA PORQUE SE SENTE PRISIONEIRO NA SUA TERRA

A emigração em Portugal é velha como a história e prende-se fundamentalmente com a nossa missão de viajar.

Entalados pela Espanha, neste recanto da Península, é natural que o português se sinta prisioneiro na sua própria terra. Interessados pelo mar e naturalmente pela navegação, cedo verificámos que viajar era uma aventura fabulosa e lucrativa.

Assim, começámos a emigrar. A viajar pelo mundo, a darmo-nos com gentes de todas as raças, a ser capazes de trabalhar em qualquer parte e a fazer quase tudo e quase sempre bem feito.

Quem primeiro emigra são os portugueses do Ribatejo e do sul de Portugal. O Norte é gente de lavoura, mais agarrados à terra.

Estes só se decidiram no século passado, impelidos pelo mal-estar económico e escolheram o Brasil.

São conhecidas as casas dos brasileiros do Minho, que partiam pobres e chegavam ricos para fazer grandes casamentos e levar vida faustosa.

Mas ao contrário do que muita gente diz, nós não emigrámos só por razões económicas.

Seja qual for a nossa situação havemos sempre de emigrar, de viajar, tendo uma curiosidade insaciável de ver outras terras e outras gentes.

Apesar de tudo e como bons portugueses que somos nunca esquecemos a santa terrinha, esperando sempre voltar a ela nem que seja só para aí acabar os dias.

Apaixonados pela nossa terra comprazemo-nos com o sofrimento de estar longe dela e de vir aqui, de tempos a tempos, matar saudades da nossa paisagem, da nossa comida, do nosso vinho e sobretudo de ouvir falar da nossa gente.

A verdade é que ninguém é totalmente emigrante. Pode dizer-se que muitos portugueses, numa altura da sua vida, fazem emigração.

Emigrar ou não emigrar é um fenómeno como viajar ou não vigiar e é bom que se saiba que somos todos portugueses e não nos dividimos nunca em emigrantes e não emigrantes.

Fomentar este género de disputa é desvantajoso e pouco sério.

Somos todos filhos de um mesmo país que amamos acima da própria vida, e, vivendo em Portugal ou a milhares de quilómetros de distância, todos sentimos orgulho em sermos portugueses.

AS CASAS DOS EMIGRANTES

Alguns órgãos de comunicação têm atacado com alguma ingenuidade e com laivos de tradicionalismo saloio, as casas que os emigrantes fazem em Portugal, responsabilizando-os por todas as mazelas urbanísticas de que este País vem sendo vítima nos últimos anos.

Embora não seja apologista da sistemática descaracterização urbanística penso que num país como o nosso, fortemente batido pelos ventos da história é pelo menos, insensato, travar a influência deste ou daquele país, nesta ou em qualquer outra época.

Se pensarmos um pouco vem-nos imediatamente ao espírito as casas dos “brasileiros” que eram os emigrantes de há cem anos e que hoje são monumentos nacionais.

Na verdade, é ridículo que se defenda que os portugueses tenham de fazer as casas sempre da mesma maneira.

É por casos destes que a nossa arquitectura é hoje uma aberração e o que há no nosso país é de autoria de arquitectos estrangeiros ou de amadores cultos.

Ninguém pode, por uma questão de bom-senso ignorar que os povos têm direito de inovar, de fazer como desejam e como gostam, mesmo que isso ofenda os Velhos do Restelo

Não exageremos o nosso proverbial bacoquismo e deixemos os emigrantes em paz.

Na verdade, não nos ofende o gosto e as influências longínquas das casas dos emigrantes, ofende-nos a sensibilidade de alguns que não fazem nem deixam fazer.

A SINA DE UM POVO

Têm-me chegado centenas de cartas para atacar a descolonização e defender o passado

Muitos continuam a insistir para que o faça.

Aquilo que está feito, mau ou bom, já passou

Sejamos realistas acabemos com rancores.

Penso que estão a durar tempo demais.

Nós temos de encontrar urgentemente a nossa identidade, esquecer os ódios antigos e arrancar da nossa inteligência a felicidade que a raiva e a inveja afastam irremediavelmente de nós.

Todos devemos compreender que Portugal ao integrar a Comunidade Económica Europeia não entrou na Europa, mas regressou à Europa depois de um passeio de meio milénio por esse mundo de Cristo em que fomos missionários, civilizadores, piratas, transportadores de cultura, aventureiros, como compete a um povo nobre e digno.

De candeias às avessas com o seu único vizinha de fronteira, os portugueses viraram-se decididamente para o mar, navegaram e viajaram.

Regressámos trazendo na bagagem um pouco de cada povo e de cada região

Muito antes de termos iniciado, no século XV, os grandes Descobrimentos, também nós fomos integrados, desde as mais remotas eras, por povos de diferentes paragens que vinham para a Península Ibérica e ficavam no território que é hoje Portugal, por ele ser o último antes do mar.

Dos indígenas a que chamaram Iberos pouco se sabe, mas é bem conhecida a história dos celtas, dos fenícios, dos gregos, dos Suevos, dos Alanos, dos vândalos, dos visigodos, dos muçulmanos e dos romanos que aqui vieram em passeios turístico militares, misturando-se com as populações locais e deram origem ao povo de caminheiros que nós somos.

Tal como eles voltámos lugar ao local de origem.

OS PROTESTANTES E A ARGENTINA

É evidente que seria grossa maldade da nossa parte juntar os honestíssimos deputados signatários do protesto contra a Argentina com os réus bombistas que rebentam petardos à porta da Embaixada daquele país

É evidente que não pode haver, nem fisicamente nem ideologicamente, comparações. É porém legítimo sublinhar que o efeito internacional é muito semelhante, talvez o mesmo.

Nós conhecemos as pessoas. Eles não. Nós sabemos quem são os senhores deputados Carlos Laje, José Leitão e Aarons de Carvalho. Sabemos que lutaram pela democracia, vemo-los pôr o seu nome e a sua responsabilidade em todos os actos, em todas as situações, frontalmente contrários à bomba anónima e assassina. Mas lá fora, no mundo para o qual se dirige o protesto e a bomba, a distinção é pormenor que não virá ao caso.

Os deputados, os protestos, as bombas, a arruaça é conjunto que não se pormenoriza para lá da fronteira, que não se pode individualizar em boas ou más intenções, independentemente da bomba e do protesto.

Perguntamos: que se pode adiantar a nível de Argentina e do mundo o nosso barulho, ali em S. Bento, perdendo definitivamente a oportunidade de tratarmos assuntos urgentes, por vezes dramáticos, dos portugueses que aqui ao nosso lado sofrem a dura vida imposta ao país.

Se a ordem dos Médicos trata da reforma agrária e a faculdade de ciências se reúne em plenário durante dois dias para equacionar o problema Lisnave ou da Setenave, entra em greve por motivos de ensino, nós protestamos e protestaremos violentamente por intromissão em áreas de competência alheia. E quando a Assembleia da República quer governar a Argentina e o Brasil. Rimo-nos ou limitamo-nos a votar contra?

A CRISE DO HUMANISMO

A generosidade que o humanismo trouxe ao mundo debate-se frontalmente com a filosofia oposta, de imprevisíveis consequências: O banditismo.

Crentes nos direitos do homem, de qualquer homem que escolha o caminho da justiça e da verdade, organização social moderna criam no seu seio o Exército do mal, da morte e do medo.

Contra Aldo Moro levantou-se a espada satânica dos perversos, abalando profundamente o sagrado princípio da autoridade, da disciplina, do respeito pela vida humana, pela própria condição humana.

A benevolência do humanismo gera o banditismo.

Mais rentável e mais fácil que assaltar bancos vem sendo o assalto ao poder para o que basta um pequeno grupo.

Ao terrorismo, e até ao momento presente, nunca a humanidade respondeu com o próprio terrorismo, mas parece-me que é tempo de repensar esta atitude.

Crimes de terrorismo político não só um problema de polícia mas um crime contra humanidade, contra todos nós e contra o futuro dos nossos filhos.

Apologista da paz, do amor, da fraternidade, sou também a favor da resposta violenta e cruel para crimes desta na natureza.

A GERAÇÃO DE 80

A geração de 70 do século XIX parece implicar que o grupo elitista da nossa centúria fique conhecido pela geração de 80, como indicam as Conferências democráticas do teatro Maria Matos que há falta do Casino Lisbonense pretendem futurizar a política deste país na década que se prepara para entrar.

Um semanário de Lisboa, dirigido e elaborado por jornalistas cujo top cultural equivalia a Espiolhar a geração de Antero e Eça de Queirós apresentam agora as conferências do Maria Matos que são um arremedo revolucionário, doméstico e publicitário, sem desprimor para as personalidades que falam e para aquilo que dizem.

Antero, Eça, Adolfo Coelho, Salomão Saraga, não equivalem, por maior que seja a boa vontade, a Freitas do Amaral, a Sousa Franco, a Mário Soares, a Álvaro Cunhal. Estes, a maior ou menor diferença são Governo do hoje, enquanto Eça, Antero, e companhia era politicamente pelo amanhã

Quer o “O Jornal” a glória política de meter o pé na argola? Ceda nesse caso a Tribuna do Maria Matos à Isabel do Carmo e ao famigerado Carlos, a Arnaldo de Matos e a Saldanha Sanches que não a Acácio por moderado e tratável, só assim o Visconde de Jaime Gama de Ávila, mandaria encerrar o Casino Lisbonense do Maria Matos e daria origem a burburinho intelectual e político na zona do Chiado.

As respostas históricas e o regresso às origens democráticas são sempre sintonia de decadência e alvorada de um mundo novo prestes a começar.

OUTRA VEZ ANOS 80

Resposta a um leitor.

O português é naturalmente desconfiado e atribui, normalmente, a quem escreve intenções que nunca estiveram no pensamento nem na imaginação.

Só isto explica uma página de verrina aguda que nos foi enviada por causa do “fundo” do último jornal, que, se bem se recordam tratava das conferências do Casino Lisbonense meses ou melhor, do Maria Matos que terminava assim: “As reposições históricas e o regresso às origens democráticas são sempre sintonia de decadência e alvorada de um mundo novo prestes a começar”.

Tanto bastou para que um Sr. nos enviasse, entre outros piropos a seguinte prosa:

“É natural que o clima de liberdade, que mesmo assim se vive neste País asfixie muita gente desejosa de regressar aos privilégios passado pelas costas bem guardadas e os bolsos recheados.

O desplante para quem aponta para a decadência, passados que são quatro escassos anos de democracia, não devia ficar impune numa sociedade que se quer defender dos seus inimigos”.

Passando em falso os privilégios, os bolsos recheados e outros lugares-comuns dicionarizados por um conhecido Partido português, julgo importante esclarecer duas questões que podem ter real interesse para quem tiver paciência de nos ler.

Efectivamente, penso que a democracia e o parlamentarismo português deste fim de século estão extremamente próximos do panorama português do final do século XIX pois pouco se progrediu em ideologia, em métodos e em organização social. Comparativamente poderemos dizer que nalguns se estagnou por completo ou até se retrocedeu. O que não há dúvidas é que continuamos politicamente românticos como há cem anos. Continuamos elitistas, historicistas como há cem anos, continuamos divorciados do País real como há cem anos. E como há cem anos continuamo-nos a servir do nome do Povo e a ignorar completamente esse povo de que tanto falamos.

Meu caro e virulento opositor e meus prezados leitores; a verdade é que pensar que há efectivamente decadência não é um crime e julgamos mesmo que não é um erro.

A segunda questão que gostaríamos lembrar ao estimado epistológrafo é que a decadência de uma época e de um regime não obriga a retrocessos nem a reposições históricas.

Acreditamos que o futuro do mundo nos trará novas e melhores soluções baseadas nas lições do passado e na arte de imaginar futuro.

A crise que o país atravessa é, quer queiram quer não uma crise de incultura e de ignorância, por isso será longa e dramática embora não seja eterna, nem fatal.

Depois disto no caro senhor e prezadíssimos portugueses, por que é para todos vós que eu falo, resta-nos a esperança na capacidade que sempre revelámos, resistindo aos piores momentos da história.

Vem sendo assim há mais de oito séculos e assim continuará a ser por secula seculorum.

O MUNDO EM QUE VIVEMOS

O mundo em que vivemos é no seu todo uma casa mal arrumada e mal administrada.

É na verdade inconcebível que o orçamento de um navio nuclear, russo ou americano, ultrapasse o Orçamento Geral do Estado de 50 países não alinhados. Por outro lado a distribuição da população é fundamentalmente anárquica encontrando-se países como a Índia em que as pessoas se amontoam para morrer de fome e outras como o Canadá, a Austrália ou grande regiões de África onde a vida não funciona por falta de mão-de-obra.

Competiria às Nações Unidas debruçar-se sobre este problema, procurando uma melhor distribuição das pessoas pelos territórios e uma maior participação dos ricos na vida dos pobres.

A terra podia ser efectivamente um autêntico paraíso onde todos vivessem o conforto, onde não houvesse crianças com fome e onde não fosse preciso roubar e matar para comer.

É necessário muita coragem para trabalhar com amor e devoção por esta terra que precisa urgentemente da inteligência e da força de todos, para continuar digna e lugar aprazível para os vindouros.

COMO ACABAR COM A MISÉRIA E O DESEMPREGO

O surto de desemprego dos países industrializados ou mesmo em vias de desenvolvimento contraste violentamente com as carências de toda a ordem dos países do terceiro mundo, principalmente em África e nalgumas regiões da Ásia.

Ora estes países vivem na mais profunda miséria por falta de técnicos competentes que organizem a nível da exploração do solo e do subsolo.

Como é evidente, todos os desempregados dos países industrializados seriam utilíssimos no lançamento da Indústria e da Agricultura dos países que normalmente possuem abundantemente matérias-primas, solos e clima propício.

Por outro lado os países ricos gastam biliões de dólares em subsídios de desemprego, resolvendo mal um problema que poderia ser extraordinariamente bem resolvido se os que sobram de um lado e fazem falta no outro fossem deslocados em perfeitas condições de operacionalidade.

Os que acham esta ideia louca e descabida fazem parte daquele grupo que acha que não vale a pena abrir o chapéu quando chove só para não o fechar quando a chuva passa.

Esta era a nova cruzada que acabaria com a fome à superfície da terra.

Em vez de darmos um peixe de esmola ensinávamos o pobre a pescar.

HOMENS E MULHERES DE CABO VERDE

Cabo Verde nasceu comigo e tem-me acompanhado pela vida fora como um sonho que não nos deixa por muito tempo e volta que não volta ele aí está.

Primeiro, as histórias do meu avô sobre Cabo Verde e por São Tomé, lugares onde tinha deixado a sua juventude, depois o Cabo Verde da escola primária com o professor José Manuel Landeiro a exigir que ninguém falhasse um único pormenor sobre aquelas ilhas que na minha imaginação de criança inquieta, à procura do mundo tomava como ilhas encantadas. O professor Landeiro era pouco dado aos sonhos dos alunos, tomava os erros a sério e quando eu misturava o Barlavento com o Sotavento lá vinham um par da reguadas para avivar a memória e trazer-me aos factos reais, concretos da vida.

Falava-se muito da banana, do café, do ananás de Cabo Verde e em Diogo Gomes e António de Nola. Ensinaram-me mil pormenores e também me disseram que às vezes estios eram muito prolongados. Só das gentes, dos homens e das mulheres nada disseram, talvez porque a gente não era pergunta de exame... e a mim, só a gente me interessou sempre em detrimento dos ananás, das bananas e do senhor almirante António de Noli. E foi essa gente que encontrei numa acampamento da Mocidade Portuguesa que me leva, alguns anos mais tarde, a dedicar-lhe duas ou três dezenas de páginas num livro publicado há 16 ou 17 anos.

É verdade que publiquei o romance sem nunca ter visitado Cabo Verde. E hoje depois lá ter estado, constato que a gente nunca me tinha enganado. Sempre os senti como na realidade são.

Na viagem do grupo parlamentar fui então ver a cor, a maneira, o feitio e a forma das ilhas de que tanto tinha ouvir falar e do povo que sempre me esconderam e que eu, por acaso, tinha encontrado.

Estive no Sal, em Santiago e em São Vicente. Foi em Santiago, na cidade da Praia, e na magnífica estância do Tarrafal onde marquei encontro com o povo de Cabo Verde.

O povo de Cabo Verde é harmonia, é ritmo, é beleza, é jovialidade, é alegria de viver. Dir-se-ia que Deus corrigiu, no Cabo-verdiano, as raças que se afastam e distinguem: a pele vem de África e da Europa. Os olhos doces lembram as gentes que navegam até lá, idas do Fundo do Mediterrâneo.

Um dia, a mulher de Cabo Verde marcará o mundo, como padrão ideal de beleza feminina.

O homem é inteligente, aberto e sempre à procura da melhor solução para resolver um problema que parece insolúvel: a seca.

Entre o tradicionalismo africano e modernidade europeia, Cabo Verde poderá vir a ser um magnífico exemplo de equilíbrio com vantagem para dois continentes que buscam há séculos o tipo de relações que melhor convém.

Só um último reparo: a vida em Cabo Verde parece estar no seu primeiro dia da de criação, em contraste com a decadência de outros homens e outros ambientes e tudo isto porque aqui encontramos homens e mulheres sublimes, que nasceram felizes e que irradiam felicidade numa terra áspera e dura que lhes nega cada dia o pão que lançam à terra.

TURISMO EM CABO VERDE

A lindíssima mulher de Cabo Verde, a lagosta das ilhas vazias e a areia sedosa dessas praias de maravilha acabarão por fazer, paradoxalmente, do tenebroso Tarrafal uma doce estância de férias.

Tal como a Madeira, os Açores e as Canárias, as ilhas Cabo Verde só poderão ser alternativa poética das férias, dos povos do Norte e do trabalho.

É inevitável Acapulcar Cabo Verde.

Se eu mandasse começava-se já amanhã. Tudo é bonito e é natural nestas ilhas do Atlântico. Tudo é harmonia beleza e calor. Tudo é simpatia desde os olhos profundos dos habitantes ao moreno saudável da pele, ás areias e praias iguais às areias e praias Portugal, mas muito, muito mais quentes.

É o fogo de África, a beleza de África, e poderá ser (e vai ser com certeza) a comodidade e a mentalidade Europa.

No Tarrafal, na praia do Tarrafal servem-se hoje surge, por tuta-e-meia, percebes que justificam uma viagem à ilha de São Tiago.

Eles e elas falam no tempo dos portugueses, olham para nós e riem-se como se tudo fosse tempo de portugueses e não valesse a pena ter sido de outro modo.

Talvez seja isto o espírito Bissau, que outra obrigação não tem o natural de receber bem, de proporcionar aos visitantes as delícias do seu habitat de eleição.

Um dia haverá passagem de ano na cidade da Praia, com aviões especiais e haverá hotéis que farão lembrar muita terra e muito povo.

Nós somos daqueles que já vêm de regresso, da expansão e do Império, para saber melhor que ninguém que temos de voltar a essas ilhas onde o pensamento e o coração se perdem no amor à terra e às gentes. E ninguém, ninguém foi por mais forte ao destino que Deus dá.

A CHUVA EM CABO VERDE

Quem alguma vez visitou as ilhas áridas das ilhas de Cabo Verde, permanece na angústia de chuva que o Criador parece ter negado, abusivamente, a esse extraordinário povo que jamais esquecerei.

Só quem conhece Cabo Verde pode sentir a simples notícia de jornal que informa o facto, aparentemente simples, de a natureza, finalmente compadecida e após longos anos de espera se ter decidido pela água, que é milagre em tão longínquas paragens.

Sei que há lágrimas nos olhos dos Cabo-Verdianos que olham a chuva benéfica que cai na Terra madrasta, que de outro modo lhe nega o sustento.

O cabo-verdiano na sua terra, agora independente, desde a primeira hora que se prepara para receber a chuva e segurar em terra firme o precioso líquido que das encostas se precipita no mar que os rodeia. Os diques que o povo constrói, de sol a sol, e amassa com o suor, são na verdade os alicerces de uma independência que se deseja próspera e feliz

Os cabo-verdianos, lutando assim contra a natureza pela sobrevivência ganham a admiração de todos os povos do Mundo, generosamente obrigados a ajudar quem tão dignamente sabe lutar contra a adversidade.

Que a solidariedade dos homens se junte à da natureza e que um dia seja possível o Cabo Verde, verdejante onde a felicidade e a abundância possam habitar na casa de cada um.

RECADO PARA AMÂNDIO CÉSAR

Não o conheço pessoalmente. Tenho lido, como toda a gente, coisas suas das mais diversas épocas e sobre os mais diversos assuntos. O senhor foi para mim um nome em tipo de Imprensa ao qual quase nunca ligamos uma pessoa de carne e osso com vida própria neste vale de lágrimas a que todos, mais ou menos penosamente atravessamos. Não sei onde está presentemente, nem sei que lhe aconteceu depois do que se passou neste País ultimamente.

Julgo, no entanto, que é meu dever deixar aqui este recado com a simplicidade com que me o deram.

A história conta-se em duas palavras: tendo-me deslocado a Cabo Verde travei conhecimento com um escritor da terra, de nome António Aurélio Gonçalves. Conversámos, falámos muito de Cabo Verde e dos que têm escrito sobre as ilhas misteriosas do Atlântico. Aurélio Gonçalves, um homem tisnado pelo singular clima de Cabo Verde perguntou-me por si, falando de um amigo querido que também não conhece.

Aurélio Gonçalves refere-se a Amândio César e às criticas que sobre ele escreveu como dos momentos mais altos da sua vida de homem e de escritor.

Terminou por me pedir para lhe transmitir a sua amizade e a sua solidariedade sobretudo se atravessa um mau momento ou passa por uma situação difícil

Aqui fica, Amândio César, a mensagem de um homem que não esquece os amigos.

É destes raríssimos exemplos de lealdade e dignidade que se fará a história das qualidades de grandeza e glória de que já nos orgulhámos e dos quais, Portugal e os portugueses, nunca terão de se envergonhar.

EXILADOS

O duro pão do exílio, alterna com a broa de milho portuguesa por dar cá aquela palha.

Intolerantes e ferrabráses, a metade que governa espantou sempre para longe a outra metade que fica normalmente em Paris, em Londres, em Argel ou em São Paulo à espera da viradeira.

Rebenta a “Bernarda” vêm os de lado lá, vão os de cá, tudo como dantes, com a diferença que o povo paga com língua de palmo e de fome as transferências das suas elites políticas por essa Europa fora. Um ou outro vai deixar longe a ossada. Foi assim com D. Miguel, com Afonso Costa, com Henrique Galvão, com Jorge de Sena.

Por muito respeito que nos mereça as andanças de Portugal por Franças e Araganças, fugido ao fado político não deixaremos de sublinhar com certo espanto que os indígenas evitaram sempre o exílio para terras longínquas do Leste, trocando a ideologia, o marxismo e o leninismo pelo conforto das Américas, pela doce França, pelas civilizadíssima Inglaterra.

O Marxismo nunca foi o forte dos nossos esquerdistas para viver, antes o foi para escrever e pensar.

A prática, o dia-a-dia, a civilização quiseram-na sempre menos à esquerda e mais ao conforto, menos ao sacrifício e ao bolchevismo e mais ao elitismo e cultura.

As sociedades capitalistas seduzem não só os detentores do capital mas todos os que vivem da sua estrutura, do conforto renovado na sua imaginação de cada dia.

Jorge de Sena não será o último Português a repartir-se com a estranha terra do exílio. Pelo mundo, morrem todos os dias, homens ignorados que aqui nasceram e que longe foram buscar com que viver.

A alma portuguesa, corpo e alma portuguesa, pelo mundo em pedaços repartida.

FEDERAÇÃO IBÉRICA

Os vende pátrias que vieram à Praça ultimamente com a ideia estafada da velha Federação Ibérica.

Fundamentalmente desejam tudo menos que lhes metam o cachaço na canga e os obriguem a trabalhar. Ligá-los a Espanha seria criar mais uns anos de confusão, obrigando assim a que os madraços se esquivassem legitimamente ao trabalho em nome das ideias.

Sem necessidade de recorrer a grandes filosofias basta pensar em países como o Luxemburgo, o Mónaco e a Suíça que, esquecendo as suas dimensões reduzidas, se deitaram arduamente ao trabalho, sacrificando-se diariamente para melhorarem, cumprindo exaustivamente programas pré-estabelecidos.

Nada de penínsulas de malandros.

É sempre preferível um país pequeno, governado por gente séria e trabalho digno.

O lugar da gente desonesta não é no palácio do Governo mas nas celas da penitenciária. Só a partir daqui é possível recomeçar Portugal.

Deixámos vender impunemente as províncias ultramarinas, não deixaremos vender a terra que é nosso berço há 800 anos.

REGIONALIZAR O QUÊ?

Na falta de outros assuntos mais urgentes os nossos políticos gastam energias delineando a regionalização que cada cabeça vai sentenciando.

Na verdade, Portugal é um país demasiado pequeno, do tamanho de uma província francesa e com tantos habitantes como a região de Paris. Por outro lado somos um país de semi-analfabetos, impreparado, com uma classe política muitas vezes hesitante e arriscamo-nos a provocar mais uma série de abortos políticos caríssimos e ineficazes.

Regionalizar desta maneira é em si mesmo negativo, superficial e autêntica obra de fachada.

Não é possível regionalizar se os serviços forem inexistentes, inoperantes ou desarticulados e parece-me paradoxal julgar um êxito a instalação Regional quando a instalação Nacional desses serviços falhou apesar de todas as condições para triunfar. E falhará sempre que enquanto o nível sócio-económico das populações que se pretendem regionalizar continue num atraso e numa impreparação indigna em comparação com os outros países da Europa.

No meu entender a regionalização feita sem uma profunda pedagogia e sem uma revolução escolar não tem vantagem política e perder tempo agora com o sexo dos anjos é demasiado perigoso para um país velho de quase dez séculos.

DESEMPREGO

Por todo lado se fala de desemprego e na impossibilidade de inverter esta tendência, contando-se milhões e milhões o número de desempregados na Europa.

Os economistas e os Governos servem-se já do desemprego como destabilizador dos preços e da inflação.

Um bom lote de desempregados é uma garantia para determinados sistemas.

Há tempos esteve em Lisboa um teórico destes assuntos que previa a hipótese de estabilizar o mercado de emprego expulsando os emigrantes, recorrendo ao subemprego ou proibindo a mulher trabalhar.

As soluções parecem-me tristes e indignas de um teórico sério destas questões fundamentais para o sossego da humanidade.

Será que a nossa civilização, dita cristã e ocidental, não será capaz de resolver esta questão dando a todos a possibilidade de ganhar decente e legitimamente o pão nosso de cada dia?

Parece que sim. Uma das medidas que poderiam alargar substancialmente a procura em relação à oferta no mundo do trabalho era deixar que os horários ficassem ao critério da entidade patronal a qual se limitaria a estabelecer uma escala de remunerações adequadas conforme o trabalho fosse diurno ou nocturno, mais fácil com mais difícil.

Para outro lado, não seria necessário a criação de taxas especiais para o maior volume das transacções verificadas, as quais já estariam cobertas pelo imposto existente sobre as vendas.

Parece-me que tal sistema traria todas as vantagens incluindo a de um melhor serviço público que teria outra capacidade de abordagem aos bens de consumo e aos serviços.

Para o caso de Portugal bastaria aumentar em um quinto a capacidade de emprego para que fossem absorvidos todos os desempregados e a procura passasse a ser superior à oferta.

Este processo traria ainda o benefício de evitar novos recrutamentos para a Função Pública, empregando ao mesmo tempo os excedentes, que nela vegetam, de modo eficiente e a bem da Nação.

O EXAGERO DAS TAXAS DE JURO

As dificuldades que se levantam a toda a hora ao empresário português no dia a dia da sua empresa, levam-no a comparar uma vida activa com a tranquilidade de poder colocar no banco o dinheiro que tiver disponível deixando de ser empresário para se tornar capitalista.

Até agora, o capitalista, entregava ao Banco o seu capital que o empresário ia buscar para o transformar em trabalho e produção.

Ou exagero das taxas de juro, que se pagam e que se recebem, acabam por fazer terminar na banca o círculo de dinheiro todo ele convertido em depósitos impossíveis de transferir para o investimento, para o trabalho e para a produção.

Embora se diga que não, este processo leva à estatização de todos os sectores e à sociedade colectivista comunista.

Reanimar as empresas portuguesas privadas, assegurando-lhes o financiamento em boas condições, proporcionando-lhe que defendam o dinheiro emprestado é, a par do recurso à imaginação e ao dinamismo do empresário português, a solução que propomos, profundamente de desenvolvimentista, longe da política actualmente seguida de parar para pagar.

É necessário e urgente lutar a sério pela modernização da Cultura, pela exploração do subsolo, pelo fomento das Pescas os quais são os verdadeiros processos de criar prosperidade no País, de pagar as dívidas e melhorar o nível de vida.

Apertar o cinto é o conselho de quem não sabe dar conselhos e utilizar a imaginação e o trabalho para criar riqueza.

AS PEQUENAS E MÉDIAS EMPRESAS SUSTENTAM ESTE PAÍS

Tenho-me dado conta que uma inusitada azáfama faz correr os cobradores de impostos em direcção às pequenas e médias empresas e aos pequenos e médios comerciantes.

Que vem a ser visto? Os senhores fiscais das Finanças deixaram de acreditar na honestidade dos pequenos industriais e comerciantes ou pretendem sugar todo o sangue a quem trabalha de manhã à noite para endireitar a vida e não se envergonhar de ser português em Portugal?

Mal vai o Governo se à custa de quem trabalha continua a subsidiar a preguiça, a incompetência e um subemprego em lugares estatais onde muito se fala e pouco ou nada se produz.

Não é amedrontando, empatando e vasculhando escritas e mais escritas que o Governo arranjará os milhões de que necessita para manter algumas instituições nacionais, que por desnecessárias, são um crime de lesa-pátria.

Quando nos lembramos que o nosso Exército gasta um mínimo de 41 milhões de contos, que continuamos todos os anos a alistar, sem qualquer justificação plausível para o facto, milhares de mancebos que contrariados vão gastar uma boa parte destes 41 milhões de contos, perguntamo-nos espantados se não seria melhor fazer intensivas campanhas de esclarecimento sobre pagamentos de impostos, livros fiscais etc. etc.. Do que enviar batalhões de fiscalizadores à procura de arrancar o forro do casaco ao pequeno e médio comerciante, ao pequeno e médio industrial para pagar uma tropa que devia ser urgentemente reduzida, racionalizada e criando um corpo de elite com 4 ou 5 mil homens num máximo e não 50.000 que nos custam os olhos da cara e que obrigam os cobradores de impostos a correr de um lado para outro à procura de lançamentos mal feitos ou de erros que a lei não permite.

Exigir o corpo e a alma às pequenas e médias empresas é o mesmo que dizer que este país já não existe ou então que tudo isto está seguro por arames e que ao menor vendaval tudo ruirá como um baralho de cartas.

A FRAGILIDADE DO SER HUMANO

O instinto animalesco que enferma o homem faz dele um ser perigoso e de actos imprevisíveis.

Hoje um santo, amanhã um assassino caso sinta que está ser perseguido injustamente e o seu grau de saturação tenha atingido os limites a que ele se impôs como padrão de dignidade e de personalidade. E a este santo, a este louco ou a este assassino ninguém escapa pois que ele fica indiferente às consequências e às vozes dos que o cercam.

Veja-se o que aconteceu na América:

Ronald Reagen, Presidente dos Estados Unidos e o Homem mais poderoso do Mundo, o mais bem guardado e o mais bem vigiado não morre por um acaso, por um golpe de sorte, o que vem inequivocamente demonstrar que se isto aconteceu com este homem que manda no mundo, que dá ordens ao mundo e que basta carregar num botão para fazer desaparecer este mundo, quantas vezes, infinitas vezes mais, não seremos nós vulneráveis perante os escolhos e os perigos que nos rodeiam todos os dias?

Que meditem na fragilidade do ser humano todos aqueles que passam a vida a arranjar questiúnculas, e intrigas e a fazer perder o tempo e a paciência a quem trabalha.

Até os santos se tornam assassinos. E quem acreditar que é assim não é, muito pouco conhece do género humano.

VALERÁ A PENA PERMANECER NESTE MUNDO?

Por incrível que pareça gastam-se no mundo cem mil contos por minuto a fabricar armas e munições cuja única utilidade é matar.

O ser humano conhecem criteriosamente e concretamente o caminho do bem, sabe como deve proceder em relação ao seu semelhante, sabe perfeita- mente que lhe é vedado atentar contra a vida do próximo e no entanto, por um gigantesco acto de loucura gasta diariamente uma fabulosa fortuna para poder matar os seus vizinhos. Isto é, os outros seres humanos seus companheiros na Terra, seus amigos, seus iguais.

Como se justifica que o homem se tenha transformado num única animal capaz de matar por prazer?

E afinal porquê e para quê centralizamos a nossa vida no desejo incontido de matar? Apenas por razões económicas, apenas pela ânsia de possuir mais do que os outros.

Atravessámos já uma fase em que o homem matava por razões religiosas, a seguir o homem matou por razões ideológicas e políticas, agora mata por uns palmos de terra, pelo domínio dos mares ou pelo domínio do ouro, da prata, dos cereais, dos frutos, das árvores que Deus pôs na terra para todos, com bondade e amor.

Vão longe as palavras de Cristo do “Amai-vos uns aos outros”.

Já ninguém sabe o que é a fraternidade.

A juntar às armas que se fabricam todos os dias veio a droga, o álcool, a loucura, o crime, a insegurança nas ruas, o terrorismo, o rapto.

Valerá a pena permanecer neste mundo?

Na verdade não vale. Depois apetece fazer o gesto banal de quem abandona o eléctrico e dizer calmamente:

É favor pararem o mundo que eu quero sair!

A LOUCURA EM QUE VIVEMOS

Ocupamos por inteiro o nosso tempo produzindo para ganhar dinheiro, para comprar e gastar o produzimos.

O homem deixou de pensar no homem porque pensa exclusivamente na produção rápida de objectos que vão desde as bombas atómicas aos detergentes e aos produtos de beleza.

De repente chegamos à conclusão que muita da nossa produção é um autêntico crime social e ecológico.

Ser meditássemos pouco nem precisaríamos de renunciar totalmente à técnica e ao progresso, nem precisaríamos de continuar a desesperada agressão à Natureza que se verifica nos nossos dias.

O aviso é sério e urgente. Ou a arrepiamos caminho ou a humanidade tem à vista um fim catastrófico e inglório.

A recente guerra no Golfo foi um acto de loucura colectiva em que vale pena meditar.

É culpa nem foi de Bush, nem de Saddam.

A culpa é da humanidade que se perde numa crise de loucura que nada tem de útil nem de belo, e levará, inevitavelmente, à destruição total da vida sobre a terra.

VIVEMOS NUM MUNDO PROFUNDAMENTE DESIGUAL

Em todos os países do mundo passa hoje uma onda desumanizante que obriga as pessoas a fecharem-se em si mesmas e a cair num isolamento voluntário.

É a solidão das multidões.

É o isolamento.

O caminho para a tristeza, para a angústia, para a agressividade.

Em tais condições e por muito que se deseje não é possível viver feliz.

Não é possível transmitir aos outros essa felicidade, nem na vida particular nem no exercício da profissão.

Paralelamente à acção escolar que, melhor ou pior, todos os Governos desenvolvem torna-se urgente que todos os povos do mundo se empenhem numa campanha de humanização dando à vida outra dimensão e privilegiando o entendimento social, combatendo a agressividade e possibilitando a boa disposição.

Esta ideia que em princípio parece destituída de viabilidade prática é bem um ponto fulcral para construirmos uma vida melhor, para podermos ter uma actividade profissional mais atraente e simpática o que equivale a dizer para trabalharmos de melhor vontade e produzirmos mais.

O mundo vai transformar-se radicalmente nos próximos dez anos. Todos temos que nos especializar numa actividade.

Os salários crescerão e desaparecerá da Terra o fantasma da miséria.

É claro que falamos assim para a Europa, parte das Américas, parte da Oceânia e provavelmente para uma pequena parte da Ásia.

Infelizmente, zonas sul americanas e africanas profundamente deprimidas continuarão ainda durante séculos no atraso vergonhoso em que se morre de fome ou se sucumbe a doenças que o ao mundo civilizado debelou por completo há dezenas de anos.

É preciso não esquecer que nas 14 mil ilhas da Indonésia há ainda tribos em plena Idade da Pedra.

O mundo profundamente desigual levará séculos a atingir uma normalidade relativa e abrangente de toda a humanidade.

Provavelmente nunca o conseguirá.

Apesar de tudo o que fica dito e sobretudo do péssimo que se demonstra em relação à Portugal é bom lembrar que o nosso país está em vigésimo quarto lugar na lista dos países mais desenvolvidos, podendo, graças à CEE, até ao fim do século baixar da vigésima posição.

No se pode dizer que tenhamos um futuro cor-de-rosa, mas também é exagero pintá-lo de negro.

Queira Deus que o esforço necessário no campo da Educação seja atempado e em qualidade de modo que responda às nossas necessidades e imperativos.

Tudo depende do saber e do espírito empreendedor dos que forem escolhidos para por diante esta importante e o urgente missão.

O APARTHEID EXISTE

Se quisermos pensar sem fanatismo e de espírito lúcido sobre o que é o apartheid compreenderemos imediatamente que ele existe em todas as sociedades.

Proponho pois, aos prezados leitores, que pensem durante alguns minutos, na imensa diferença que existe em Portugal entre ricos, remediados e pobres cujo convívio não se faz a nenhum nível.

Senão vejamos:

Enquanto os ricos têm os seus transportes particulares, os pobres têm os colectivos ou andam a pé.

Enquanto os ricos têm as suas clínicas particulares, os pobres morrem à espera da consulta na Caixa.

Enquanto os ricos frequentam colégios de luxo, os pobres consolam-se com o a, é, e, i, o, u da Escola camarária.

É claro que, apesar de tudo isto, nós vivemos em perfeita e fraternal democracia enquanto o apartheid sul-africano, que não é mais do que uma técnica de convívio, torna possível organizar e fazer progredir, devidamente, as diversas etnias.

Deste modo e apesar das críticas atiradas contra o regime sul-africano ninguém, até hoje, conseguiu em África, nada que se pareça em prol das comunidades negras.

Tenhamos a coragem de pensar que só um nivelamento sócio-cultural poderá trazer um dia à África do sul a plena integração racial feita com coerência e defendendo os interesses de todos porque todos terão um dia iguais possibilidades e capacidades.

O ATAQUE DOS CREDORES

O gravíssimo erro que as super potências estão a cometer em relação ao Brasil leva-nos alertar todos os gananciosos dos perigos da sua cupidez.

Há que saber esperar e tudo será pago.

Os Estados Unidos e todos os capitalistas que, impensadamente, puxam a corda do desesperado devedor ou estão cegos ou estão loucos. Eles estão a cavar a sua própria destruição por terem querido fazer negócios fáceis com quem tinha de aceitar todas as condições impostas.

A dívida dos países da América Latina rondará os 300 biliões de dólares. A fatia do Brasil é muito grande, mas todos sabemos que o Brasil é o país do futuro onde com o tempo e algum trabalho o ser humano viverá cada vez mais feliz a ajuizar pela conjugação harmoniosa de credos e raças que aí pontifica, onde o amor é mais forte do que dinheiro.

A grande diferença entre o Brasil e as outras nações está aqui: no amor, na alegrias de viver, no prazer de estar no mundo e na certeza de que só se vive uma vez.

Tenho a certeza que no juízo final os únicos que terão direita Prémio serão os de expressão portuguesa e, dentre esses, os brasileiros ocuparão o primeiro lugar.

Hoje as guerras não são tanto químicas ou atómicas, mas sim, ideológicas e houve países que já o entenderam. Será que os Estados Unidos compreenderam o aviso ou insistem em tocar a finados quando o Brasil der o último suspiro e arrastar consigo todos aqueles cuja avareza e inconsciência foi muito superior do que a sua sensatez?

NOBRE DA COSTA VERSUS AMARO DA DITA

Em 7 de Setembro de 1978 na Assembleia da República portuguesa começou um desafio insólito e histórico. A última geração de políticos recuava perante a primeira invasão dos tecnocratas organizados em Governo.

As bancadas assistem perplexas à invasão do poder pela alma técnica e toda poderosa.

O exército invasor, chefiado por um arquitécnico traz na bagagem o sheltox que apagará de vez o zumbido da oratória política que herdámos do século XIX.

Seja quem for o vencido, importa sobretudo salientar que está lançada uma nova sorte no último Parlamento tradicional da Europa.

Amaro da Costa é politicamente um mundo que foi, Nova da Costa, é um mundo que será.

As duas centenas e meia de políticos improvisados que deixaram por alguns meses as oficinas de trabalho vergam de espanto com o golpe destes gestores de profissão que governam pelo computador.

O país, ou melhor, os países que despiram há muito a nevrose religiosa largam agora a psicose política para se organizarem numa empresa gigantesca inexoravelmente organizada na prática do possível e do desejável.

Amaro da Costa, Jaime Gama, Menéres Pimentel e outros foram ao ataque, atirando contra um inimigo em cuja vulnerabilidade não acreditam.

O humanismo teórico, o populismo, é grandiloquência lamechas abatem-se nas teclas da máquina dos outros que respondem por números, calculam matematicamente as adições, as multiplicações e as divisões.

O novo capítulo da filosofia política chama-se matemática, chama-se, se quiserem, matemática política. É possível, por agora, que Nobre da Costa não fique no Governo. Mas temos a certeza, é fatal que os arquitécnicos voltarão a impor-se e a comandar este processo.

Pode mesmo dar-se o caso, de perante a resistência e a teimosia da arqueopolítica de bancada, o Poder passe subtilmente cá para fora, para as salas ministrialonas dos imensos conselhos de administração. Depois é só assistir à desvalorização gradual e ao desinteresse sistemático das grandes crises políticas.

Já se vive sem o Governo meses a fio. Poderá vir a viver-se sem Governo anos a fio...

A CRISE

Ao contrário do que muita gente pensa, a crise que afecta Portugal ultrapassa uma mera crise económica e é bem mais grave.

De uma crise económica consegue-se sair mais dia menos dia, bastando para tanto ensaiar uma nova forma de produção, reactivar o trabalho, fortalecer a moeda, reanimar a agricultura, isto é, aplicar ao mal uma dessas curas que se usam universalmente.

Infelizmente o caso de Portugal é bem mais grave, a crise, mais do que económica é um caso aflitivo de moralidade e consciência.

É a geração que nos governa está em crise profunda.

Ninguém acredita em ninguém.

Ninguém é capaz de colocar os interesses de todos nos lugares dos seus próprios interesses.

O que se passou com a Aliança Democrática é na verdade um autêntico caso incompreensível, política e socialmente.

Como é que uma a Aliança composta por partidos ideologicamente próximos, por homens que se conheciam e se respeitavam, dominando todos os mecanismos da governação e da economia, como é possível que se auto desagregue acabando por desavenças no grupo dirigente, os quais mostram um desprezo total pelo interesse do país e pelo futuro de Portugal.

Nas mãos de gente desta qualidade o país está morto e pior do que no tempo dos Filipes.

No mundo dos nossos dias pode-se encarar perfeitamente a dissolução de uma Pátria por incompetência de governantes.

A história está cheia de impérios de que hoje só existe a memória e que, por uma razão ou por outra foram varridos do mapa.

Será esta é vontade dos portugueses no final do século XX?

PORTUGAL PERDEU O POLÍTICO QUE MAIS LONGE APONTAVA O FUTURO

Com Adelino Amaro da Costa morre a última esperança de traduzir democracia em Portugal por felicidade, por boa disposição, por grandeza de alma e por amor ao próximo.

Mais que um grande político era um homem com a altíssima noção do que é estar no mundo e servir os outros.

Não foi só o CDS, nem a AD a perder com a sua morte. Portugal perdeu o político que mais longe apontava no futuro.

Pessoalmente e para lá de todo o seu talento foi um grande amigo que perdemos, daqueles que marcam uma época da nossa vida e do qual nos lembraremos todos os dias como se estivesse vivo e continuasse ao nosso lado.

O HOMEM MAIS INTELIGENTE E O MAIS GENEROSO QUE ATÉ HOJE CONHECI

Fazia 39 anos no dia 18 de Abril o meu amigo Adelino Amaro da Costa, provavelmente o homem mais inteligente e o mais generoso que até hoje conheci.

Amaro da Costa era, em toda a sua humildade, um Homem superior ao serviço do seu semelhante.

Amaro da Costa disse um dia que a missão do seu partido era educar a direita de Portugal. E ele era um privilegiado para exercer essa delicadíssima missão, não só da direita, mas do povo português.

Inteligente, honestíssimo nos seus processos, infinitamente paciente, como se o tempo para ele nada representasse, Amaro da Costa, deixou a recordação de uma obra fabulosa que o destino quis adiar.

Há dias, um jornalista chamava-lhe a fada da Sá Carneiro pela sua capacidade de dialogar e de o conduzir para o melhor.

Amaro da Costa seria verdadeiramente a fada deste País se a sorte não o tem desacompanhado tão tragicamente.

Naturalmente, homens desta natureza são pouc acessíveis, distantes, maus de humor, difíceis de trato.

Adelino Amaro da Costa era, neste aspecto, um esbanjador de simpatia.

Actor talentoso, homem de mil ofícios, impressionante no seu poder de comunicação e na sua afabilidade, conseguia tudo isto convictamente, distinguindo cada amigo, cada situação e cada caso.

Recordá-lo com saudade é saber que o exemplo deste homem nos acompanhará para sempre num saudável saudosismo de continuar a usufruír da mensagem inesgotável que foi a sua vida.

Adelino já não é um homem do poder, já não é um homem poderoso, consola-nos porém, infinitamente mais falar dele e para ele agora, quando tudo o que passou continua a ser, não uma recordação simples, mas a esperança de melhores dias pelos quais lutava entusiasticamente quando a morte lhe armou uma cilada.

O e espírito de Adelino Amaro da Costa continua vivo e presente na recordação da sua amizade e na esperança da sua esperança porque há homens que não morrem, já que os vivos se encarregam, por necessidade e devoção, de os deixar a seu lado eternamente.

SÁ CARNEIRO

Snu Abecasis morreu por amor ao lado de Sá Carneiro que não a sacrificou nem ao poder, nem à popularidade, nem ao dever, nem à família, nem à Igreja.

De mãos dadas, enfrentando tempestades, Sá Carneiro e Snu Abecasis ficaram cada vez mais serenos no Centro deste pequeno mundo como se soubessem que lhes valia a pena viverem assim e que seriam, só deles, as últimas e poucas horas que lhes restavam.

Foi só a luz dos olhos de Snu Abecasis e de Sá Carneiro que confundiram as leis, as convenções, as tradições ou teria sido a força do carismático estadista que fez ajoelhar a vetustíssima dura e intransigente Igreja Católica Romana?

Não há Concílios que possam destruir o amor entre um Homem e uma Mulher.

Louvamos Snu que amou Francisco e com ele morreu, decretando, de novo, a lei da ternura para que ela possa vigorar entre os homens até consumação dos séculos.

Que repousem em paz, juntos, frente-a-frente para que no fim do mundo continuem o idílio agora interrompido.

QUANTO VALE UMA MULHER

Devido ao afluxo inesperado de centenas de cartas sobre questões femininas, a nossa colaboradora Inês Castro pediu-me uma opinião sobre a condição da mulher.

Para analisar das capacidades da mulher e da sua maior ou mesmo menor capacidade em relação ao homem, teremos de lhe dar as mesmas condições de vida quer no campo profissional, quer nos aspectos sexuais, familiares e culturais. Isto, acompanhado naturalmente por escolas mistas e iguais oportunidades em todos os domínios da vida.

Criadas e aplicadas estas condições, a mulher estará livre dos efeitos ancestrais que a têm reduzido a simples objecto, desde que o Mundo é Mundo. A partir destas premissas poderemos então observar a maior ou menor semelhança entre os sexos. Embora partamos de uma certeza, como o demonstrarei no meu livro “a Libertação da Mulher”.

A mulher é mais capaz, mais forte e mais intuitiva do que o homem. Porque não aproveita estas qualidades, isso é muito difícil de entender.

Mas voltemos à análise que fazíamos.

Nas condições de igualdade total, estou convencido que na vida humana deixará de existir o crime e a paixão, transformando-se os homens e as mulheres numa sociedade perfeita onde cada um terá o suficiente e as grandes emoções deixarão de existir.

Embora pense que é de toda a justiça reconhecer o valor da mulher e que é urgente restituir a dignidade que sempre lhe foi negada, mesmo assim não posso deixar de confessar que para mim e estou convencido que para 99 por cento dos homens foi sempre mais cómodo esta subserviência feminina. Por mim adorei ter vivido esta minha época onde os grandes dramas alternam com as grandes comédias, onde é possível passar da desgraça à fartura e onde a vida é comandada por essa incógnita maravilhosa que se chama esperança.

Isto não é mais possível. A mulher vale o que vale o homem. O comando do Mundo pertence-lhe por alternância e é provavelmente a vida que nos espera a partir do século XXI. Pena é que eu já não possa saborear esse prazer e confirmar que finalmente o ser humano se humanizou.

OS PORTUGUESES CONTINUAM AGARRADOS ÀS CALÇAS DO PRIMEIRO-MINISTRO

Neste país subsidiado e à beira mar plantado, havia um ditado que dizia “quem não arrisca não petisca.” Agora não, ninguém quer arriscar e todos querem petiscar.

Ainda há tempos ouvi na rádio um artista da nossa praça dizer que não cantava porque o Estado não lhe dava condições. Esta é forte! Não lhe dava condições? Então quem é que lhe punha a mão na boca?

Na CEE para onde entrámos complexados e cabisbaixos ninguém vai ter pena de nós e ou nos tornamos gente ou... estamos mal.

Lá fora as pessoas andam para a frente, arriscam, assumem-se. Aqui pedem-se subsídios.

Os portugueses têm de se convencer de uma vez por todas, e tem de ser quanto mais depressa melhor, que o Estado patrão acabou. Antigamente é que o Ti António resolvia tudo, e àqueles que não resolvia deixava-os emigrar.

Enfim, perdemos um tempo inestimável e deixámos sair o sangue mais jovem que aqui possuíamos.

A Europa desenvolveu-se e vive bem porque o Estado deu voz às pessoas.

Portugal continua desesperadamente agarrado às calças do Primeiro-Ministro enquanto este tenta emancipar um povo que ama e a quem tem dado o melhor da sua inteligência.

Já passaram quinze anos depois do 25 de Abril. Para muitos foi um trauma muito grande. Compreende-se e aceita-se, mas não podemos andar eternamente a chorar e lamentar o que é irreversível.

É necessário mostrar de novo ao mundo que a inteligência portuguesa continua a servir de fermento para os povos do todo mundo tal como foi nos séculos XIV, XV, XVI.

No perdemos qualidade, estivemos só a retemperar forças.

CAVACO, CADILHE E BELEZA OS BOMBOS DA FESTA

Insatisfação constante, um masoquismo exacerbado e um choradinho a tresandar a ranço fazem dos portugueses o povo mais rezingão de toda a Europa.

Latinos, aventureiros, improvisadores e profissionais nunca ninguém conseguiu obrigar esta gente a ser governada com cabeça, com regularidade, com técnicas de gesto tal como pretende Cavaco Silva acolitado por Leonor Beleza e pelo bombardeadíssimo Cadilhe, que tem sido enxovalhado com o que de mais abjecto tem saído da cabecinha de muitos plumitivos que desta maneira que vêem assegurado o ordenado ao fim do mês.

Na verdade, a vida que espartano Cavaco e o imperturbável Cadilhe têm tentado impor para a salvação do País sofre as mais variadas contestações e vem dos quadrantes mais diversos.

O português não aceita esta vida de apertos porque, acha ele, nunca precisou de guia de marcha para ir à Índia, nem planeou Aljubarrota para chutar os espanhóis por todas as fronteiras.

Napoleão foi também vítima do nosso improviso e tudo isto sem abdicar do fado, do vinho tinto e de meio Bairro Alto que é todo este país.

Quando as coisas correm mal à direita, fazemos uma revolução e as coisas começam a correr mal à esquerda. Se as coisas correm mal à esquerda faz-se uma revolução de sinal contrário o que permite pelo menos quatro anos de festas, de manifestações, de greves, de discursos, de intentonas e de inventonas... Trabalhar é que não. Governar é que não.

Cavaco Silva, que não é para graças, acha que esta bagunça já chega, que Portugal já está mais adulto e resolveu governar seguindo os parâmetros europeus.

Bem podem os portugueses dar por paus e por pedras. Cavaco não está com meias-medidas: para os contestatários mais avarentos pôs-lhes o Ministro Cadilho à perna e para aqueles que se armam em carapaus de corrida deu-lhes a Ministra Leonor Beleza para lhes tratar da saúde.

Até que enfim, aparece alguém que conhece os portugueses.

Continuar a improvisar num mundo onde os profissionais são cada vez mais profissionais é preparar o suicídio colectiva e isso Cavaco nunca o permitirá, doa a quem doer.

O GOVERNANTE NÃO PODE TER MEDO DE ERRAR

Governar um país pequeno e maneirinho como Portugal só não é viável a homens receosos da crítica, do diz-se e das graçolas de mau gosto.

O governante no pode ter receio de errar. As suas atitudes e as suas decisões são sempre susceptíveis de rectificação. Aquilo que ele não pode fazer é hesitar, protelar e nada fazer.

Portugal é um país tão governável como a Suíça, a Holanda ou a Suécia, é necessário simplesmente o querer e a determinação dos seres que nele habitam para o desenvolver e criar o bem-estar porque todos os portugueses anseiam.

Para realizar a transformação rápida, eficiente e correcta deste País é urgente que o seu colectivo se transforme na verdadeira extensão do homem pensante e inteligente, é necessário também que o homem se sirva da colectividade na medida em que vai servir-se de mais cabeças e mais braços.

O colectivo é um crescer de forças, por tal motivo é premente que os homens e mulheres que compõem a sociedade portuguesa colaborem não só com o Governo central, mas com as Autarquias locais onde vivam.

Pertençam as Autarquias locais ao Partido que pertencerem é dever de todo o cidadão prestar-lhes a ajuda na realização dos objectivos que os autarcas: Presidentes de Câmara, Presidentes de Juntas de Freguesia e vereadores se propuseram.

É urgente que o homem acaba de uma vez para sempre com ou egoísmo feroz, com a sua auto-suficiência improdutiva para se realizar no colectivo de uma aldeia, de uma vila, de uma cidade, em suma: de Portugal.

POLÍTICA O QUE É?

Costuma dizer-se que os portugueses estão desencantados da política e que não participam, não se interessam, não se dignam sequer criticar ou elogiar o que está mal ou está bem.

Por isso mesmo há quem pense, e com toda a razão, que isto pode passar pelo salvador nacional que traz a tiracolo a saca dos remédios miraculosos.

Contudo, o que nos parece importante é inaugurar uma nova metodologia que possa abrir uma porta como deve ser à metodologia política e à resolução dos problemas que interessam a todos.

Os candidatos que nós hoje elegemos morrem no fim da campanha eleitoral...

O povo deita um voto e sofre até à próxima campanha.

Na verdade, a evolução social das últimas décadas é de tal modo a anémica que se nota a incompetência dos políticos.

Nós não sabemos o que faz falta, nós não sabemos quem faz falta.

A política deixou de ser uma administração próxima de coisas muito concretas e passou a ser uma ciência acessível só a alguns.

Hoje, a cada passo, ouve-se dizer “eu não percebo nada de política”, como quem diz eu não percebo nada de matemática ou de química, esquecendo que a política a o preço da água e da luz, do litro do leite, da carne, do peixe, do pão.

Não perceber nada de política é não perceber nada da vida e disso, enquanto andarmos neste mundo, não nos resta outro remédio se não perceber o mais possível.

O PAÍS REAL E O PAÍS POLÍTICO

Incapazes de gerir um país, acabamos por arranjar dois: o País real e o País político.

Convém saber para que cada um se situe e actue, o que vem ser o País real, com quem conta, o que faz.

O que é o país político, com alinha, para que lado joga.

Primeiro, o real:

Sem receio de desmentido parece não oferecer dúvidas que este é o País que emigra, que trabalha, que sofre. É o país dos pagadores de salários, é o País dos criadores de riqueza. É o país dos lavradores e de todos os que fazem dia-a-dia o dinheiro com que se pagam e com que pagam os outros.

O País real é o que inventa de comer todos os dias, é o País que não sente domingos nem feriados, é ou País de sempre, é o País da dignidade e do trabalho, é o país da história.

Ou Portugal político, é a ignorância política, é a malfeitoria política que são neste País sinónimos preclaros.

Ou Portugal político chupa o suor do rosto do seu semelhante, bebe-lhe o sangue, mas tira-lhe a carne.

O Portugal político importa lá de fora todos os mercantilismos possíveis e o whisky possível transformando a esquerda portuguesa numa resultante de aguardente da Escócia.

O País político é o filho que não trabalha, que dissipa a fortuna, que exige automóvel, que bate no pai, que comunga a droga e cai, todos os dias, num novo ou farrapo social. O país político é o delinquente mongolóide, infantilmente agressivo e perigoso.

De um dia para outro o País político volta à Cruz Vermelha de Caxias e ao sanatório de Peniche. É que a liberdade não dispensa mastigação. E... fidalguia sem comedoria é gaita que não assobia.

UMA ASSEMBLEIA À SÉCULO XIX

A Assembleia da República onde se misturam e se chocam quatro paladares de socialismo continua a ser um órgão anémico e sem poder de resposta a um país que necessita urgentemente de vitalidade, de inteligência e de leis reguladores de trabalho de maneira que os vadios e os desempregados à força possam e devam contribuir para o bem estar nacional.

Na verdade, a Assembleia da República não tem sido mais do que o espelho do País onde tudo continua desorganizado, destruído, vilipendiado e escarnecido. É uma assembleia com todos os defeitos do século passado e que teima injustificadamente a mantê-los.

Ainda há poucos dias a Assembleia da República perdeu uma tarde inteira, o que representa centenas de contos gastos, para discutir se um programa da TV, e escritor por um pseudo historiador e produzido por um realizador com tantos escrúpulos como o primeiro, devia ou não devia ter sido exibido.

Em qualquer país civilizado os inquéritos, as culpas e os castigos se os houvesse estariam cometidos à administração da televisão. Isto seria motivo para encerrar o incidente e continuar o trabalho, que esse sim é preciso desenvolver e melhorar todos os dias.

E assim quando tudo pensava que se começasse a dar aos actos a importância que eles têm, resolvem os deputados arengar durante cinco horas sobre as aventuras e desventuras do “historiador” César para saber se valia a pena queimar o homem.

Houve mesmo quem levantando a mão tremente se pusesse em guarda contra a guerra santa.

E o país continua sem uma regulamentação de Saúde, sem uma regulamentação de ensino, sem circuitos alimentares, sem leis que intensifiquem a pesca, sem alcatrão que dignifique as estradas.

É urgente que a Assembleia da República se transforme num centro respeitável de decisões rápidas, modernas e úteis. O País que a elegeu e a paga não pode esperar outra coisa.

QUANDO PORTUGAL ERA UM IMPÉRIO

Quando Portugal era um império tínhamos sete ministros, Três secretários de Estado e cerca de 100 deputados.

Era praticamente esta a classe política que tínhamos que pagar porque a nível de Câmaras Municipais trabalhava-se por carolice e amor à terra.

O povo pagava, é certo, o clã político que não vivia mal, simplesmente eram poucos. Hoje que estamos reduzidos ao Portugal da Europa, Açores e Madeira, a classe política aumentou de um para 1000 e esse aumento correspondeu a uma gula indisfarçável referente ao orçamento do Estado que sai do bolso todos nós.

Um enxame inumerável de políticos, devora o cadáver de um País apertado de sanguessugas por todo lado.

Mas somos, pelo menos, mais bem governados?

A resposta ficará à escolha do leitor porque receamos que se formos nós próprios dá-la se pense tratar de um caso de sectarismo político.

Mas meditemos nestes números: os deputados passaram de 100 para 250 e as despesas com a Assembleia da República aumentaram 500 vezes.

A vantagem disso vale a diferença?

As Câmaras Municipais que, neste País, se contam por mais de três centenas, todas, para além de presidente, vereadores a tempo inteiro, bem pagos, bem comidos, bem bebidos e deslocando-se nos Mercedes lhes deixou o “fascismo” ou compram Mercedes novos à medida que termina a herança motorizada.

Apesar de tudo isto vemos que a governação é deficiente.

Resumindo e dizendo verdades desagradáveis:

É preciso acabar de uma vez para sempre com esta classe de marginais privilegiados a que vulgarmente chamados políticos.

AS ARMAS SÃO AS ESCOLAS, AS FÁBRICAS E AS MINAS

De 1910 a esta parte, Portugal vem sendo governado, a nível de presidência da República por militares.

Tirando o consulado de Salazar em que os militares Presidentes foram meras figuras decorativas, assistimos hoje à manutenção de um equívoco que coloca as Forças Armadas no topo da hierarquia político-social com garantia de paz interna e de independência nacional.

Se tais pressupostos tiveram outrora algum valimento estão hoje completamente ultrapassados, e um militar na presidência da República é um acto perfeitamente gratuito por variadíssimas razões.

Em primeiro lugar os militares actuais estão claramente impreparados para esse tipo de cargos.

Por outro lado, à Nação não interessa a via militar cuja utilidade e sentido são altamente discutíveis.

Podemos dizer, sem receio de desmentido, que um exército em países como Portugal não passa de um símbolo totalmente vazio de utilidade.

A época em que vivemos é demasiadamente sensível para se perder tempo com uma candidatura que não seja a de um homem inteligente e honesto que tenha dado provas como administrador e como financeiro.

Em Portugal haverá meia dúzia de nomes dos chamados generais da Indústria cujo perfil se coaduna perfeitamente com a presidência da nossa República e com as tarefas urgentes que se impõem ao povo português.

A independência de Portugal travar-se-á, nos próximos anos no campo do trabalho e da produção.

O Exército mudou de mãos e mudou táctica. As armas são as escolas, as fábricas, as estradas, e as minas.

Precisamos de um homem para governar que crie já um Portugal mais rico, mais próspero, mais justo

Precisamos de um homem para governar que transforma este País numa empresa bem organizada, bem gerida, bem rentável.

No vale a pena distribuir miséria.

Nem as G3, nem as paradas militares, resolvem seja o for.

AO SABOR DO ACASO

Segundo estatísticas recentemente publicadas, Portugal foi o país que no ano passado recebeu maior número de turistas.

Para aqueles que distraídos com o próprio umbigo não querem ver o que se passa à sua volta iremos dar alguma razões pelas quais os estrangeiros nos procuram e saboreiam sofregamente este Portugal que nós teimamos em não usufruir em proveito, dando jus ao ditado, “Dá Deus as nozes tem quem não tem dentes.”

Se pensarmos um pouco, o que para o português é um sacrifício tremendo, o português não gosta de pensar, a maior parte das vezes faz as coisas à toa, ao acaso, acreditando mais na intuição do que na razão e raramente se importando com as consequências. “Há-de ser o que Deus quiser” e com este grito de esperança e ao mesmo tempo de inconsciência aí temos Portugal feito à medida da nossa inconstância e a história recheada de grandezas e de misérias porque temos vivido, neste País de eleição, quase sempre ao sabor do acaso.

Mas deixemos as considerações anteriores e vamos ver porque razão os turistas, os industriais e os habitantes dos outros países nos procuram tão avidamente e se vão deixando ficar por aqui.

Vejamos as razões:

Portugal é o país da Europa com mais elevada temperatura média anual.

O preço da nossa moeda em comparação com a moeda dos outros países torna possível a aquisição de terrenos e de indústrias por montantes perfeita- mente ridículos.

Qualquer Casal de reformados da Europa Central e do Norte vive, em Portugal, dez vezes melhor do que no seu país.

O índice de criminalidade em Portugal é o mais baixo da Europa.

A legislação actual beneficia extraordinariamente o proprietário estrangeiro.

O povo português privilegia extraordinariamente a sua relação com a pessoa estrangeira.

Portugal é ao país menos industrializado e menos poluído da Europa.

Esta razões, que acabámos de mencionar, provam à evidência que este país que habitamos é um pequeno paraíso onde todos poderemos viver felizes se assim o desejarmos.

Os estrangeiros já nos descobriram. É tempo de nos descobrir a nós próprios.

É PROIBIDO FAZER INOVAÇÕES

As confederações dos comerciantes portugueses vêm muitas vezes à televisão pedir as mais diversas regalias e lamentar a crise profunda em que se encontram os pequenos e médios comerciantes.

Pelo que se passa no nosso país só nos admira que a crise não seja ainda maior em virtude dos usos e costumes obsoletos os que regem as nossas casas comerciais.

Por esse mundo fora os horários comerciais são totalmente livres o que leva os responsáveis pelo negócio que a adaptar-se aos melhores horários de acordo com o interesse dos clientes.

No mundo onde quase todos os adultos estão ocupados de segunda a sexta, das nove às seis da tarde, parece-me essencial que os horários funcionem a partir desta hora e aproveitando integralmente o Sábado e o Domingo.

Mas nada disto se observa em Portugal.

Os comerciantes vêem-se obrigados governamentalmente, a proceder como simples funcionários públicos que trabalham quando os trabalham e os obriga muitas vezes, a não cumprir cabalmente as suas obrigações para se abastecerem do essencial.

Mas nem só as lojas do comércio deviam ter em conta esta descentralização de horário. O mesmo devia acontecer com repartições de Finanças, Câmaras Municipais, serviços de Ministérios, serviços Médico-Sociais, dando assim a quem trabalha a possibilidade de beneficiar mais à-vontade dos serviços que, ao fim e ao cabo, vivem da sua bolsa.

Nunca é demais dizer isto é embora saibamos perfeitamente que neste País é proibido fazer inovações e melhoramentos.

Habituámo-nos a viver miseravelmente e mesmo que seja fácil parece que não nos interessa sair do atoleiro.

OS POVOS DE TODO O MUNDO APROVEITAM OS SEUS GÉNIOS

Enquanto por toda a parte o acesso às universidades depende de provas de aptidão e de mais nada, em Portugal é preciso determinado curriculum e determinada idade para aí se entrar.

Os povos de todo o mundo aproveitam os seus génios seja qual for a sua idade ou as circunstâncias em que os reconhecem.

Temos exemplo de crianças com dez anos que passaram todos os exames da Universidade ultrapassando assim todos os obstáculos e vendo-se cedo com a possibilidade de aproveitamento total das suas qualidades excepcionais.

Não foi Jesus ao templo embaraçar os doutores aos sete anos idade?

Se o filho de Deus tivesse tido o azar de nascer em Portugal não o tinham deixado entrar no Templo por falta de idade e se o miúdo teimasse tinha levado uma valentia sido sova.

Este é o país de anões em que vivemos onde as ideias de progresso e de renovação chegam com séculos de atraso devido à tacanhez, ao medo e à cegueira de um povo que vive mais da má-língua, da crítica e da inveja do que do trabalho útil e do reconhecimento do valor do ser humano tenha ele dez ou cem anos.

PORTUGAL ESTÁ DE FÉRIAS

Depois da guerra e para reconstruir o Japão e a Alemanha todo o cidadão, sem olhar a idades nem posições, aceitou trabalhar 14 horas por dia e dispensar-se de férias.

Esta política conseguiu reconstruir a Alemanha e o Japão em tempo recorde e transformá-los em potências mundiais, superiormente administradas, que ultrapassaram os países vencedores da guerra, eles que tinham sido os grandes vencidos.

Os portugueses amputados do Império Ultramarino sofreram um traumatismo mais violento do que a própria Alemanha e o Japão depois da guerra. Convinha-nos pois, organizar a restauração de Portugal, corajosamente, como se fosse uma acção pessoal de todos e de modo a que viéssemos a sofrer por pouco tempo e o menos possível.

Não é assim que acontece, infelizmente.

Fazemos greves, temos baixas constantes, trabalhamos pouco. Por este motivo o Governo vai-nos tirando sorrateiramente a carne, o peixe, o leite e o pão.

Muitos ministérios deste Governo não sabem como fazer produzir este país, não sabem como resolver a crise nem como criar motivação e capacidade trabalho num povo que só está à espera que os governantes os animem, os encoragem e lhes facultem os meios para fazer de Portugal o País próspero por que todos anseiam.

SITUAÇÃO DESESPERADA

Num

CRÓNICAS

CRÓNICAS DA PROVÍNCIA E INTERVENÇÕES PARLAMENTARES

NOTA PRÉVIA

Em virtude dos constantes pedidos do livro supracitado, e não o pensando reeditar, aproveito a Internet para o colocar à disposição do público.

A RAZÃO

Os portugueses são por natureza desinteressados das suas coisas, o que equivale a dizer que desprezam a sua verdadeira cultura para se regalarem com aquilo que importam do estrangeiro e é muitas vezes de péssima qualidade.

Depois, temos da vida um sentido restrito que acaba por abafar o espírito criativo, a inspiração e o gosto.

Quantos portugueses agiram sempre por iniciativa própria, sem conselhos nem ajudas de ninguém, guiados só pela sua sensibilidade, sentido estético e amor à terra onde se nasceu e se ama extremosamente?

Foi pensando em você, que me lê e mal me conhece que eu escrevi e aceitei um dia ser Deputado. Das centenas de crónicas escritas, respiguei algumas, e das intervenções parlamentares os momentos mais significativos.

Na consciência não me pesa a luta em favor daqueles que menos sabem se defender. Pesa-me sim os erros que cometi e que tentarei até ao fim da vida redimir.

Enquanto não o consigo, vou escrevendo sempre tudo quanto a vida me tem ensinado.

Espero que a minha experiência lhe seja de alguma utilidade.

O ESCRITOR É UM IMITADOR DE DEUS

Uma forma feliz de utilizar a existência é sem dúvida a escrita. O mundo das Letras, o sacerdócio da palavra colocada sempre mais ao serviço dos outros do que ao serviço do autor.

O escritor é normalmente um sacrificado que trabalha para os homens da sua geração e, muitas vezes, para os das gerações futuras ficando-lhe a fama de que pessoalmente nada aproveita.

Reparem em Camões, hoje um poeta património da humanidade e que celebramos no dia 10 de Junho como um símbolo desta pátria querida que tanto amamos. Camões morreu à fome.

Apesar de tudo exortamos a juventude a olhar a prática literária como uma das mais interessantes manifestações da actividade humana e uma daquelas que dá ao homem uma maior realização.

Salvo raras excepções nunca a profissão das Letras foi próspera, mas a verdade é que dos homens fabulosamente ricos do tempo de Camões, de Camilo ou de Fernando Pessoa ninguém se lembra. O escritor, esse, viverá eternamente na sua obra e nos seus leitores.

O escritor cria um mundo que lhe agrada. Forja as pessoas que gostaria que existissem. Faz vidas. É, de alguma maneira, um imitador de Deus.

AI DOS VENCIDOS

No jornal “O DIA” de 18 de Março, na primeira página que vem um escrito de José Sampaio contra Marcelo critério.

Um combate desigual, nove assaltos contra um ausente, a esgrima do passado, o não entender o presente, o não esperar pelo futuro.

Depois 50 anos de vida política, de presença pesadíssima no Governo de uma Nação, o professor Marcelo Caetano é acusado e atacado como se tivesse sido ministro em fim-de-semana, como se tivesse o poder absoluto e o jogasse às urtigas, como se tivesse encarnado o próprio Deus sem conseguir o milagre de transformar as pedras em pão e o País em paraíso.

De poucos lados esperávamos uma tão apressada análise a um homem e a uma época, como esta de José Sampaio e do jornal “O DIA”.

A história necessita de facto da frieza do tempo, da calma, do ânimo, da ponderação dos que vierem depois. Intervindo politicamente, isto é fazer política, parece ser a vocação do homem perante a sua própria época deixando a quem vier a tarefa do julgamento e das conclusões.

O Sr. Sampaio é pequeno e parco para saber se os homens que rodearam Marcello Caetano eram muito bons ou muito maus. Se Sr. Sampaio se quer mostrar aos olhos da Revolução um revolucionário terá que agradecer a Marcello Caetano a própria revolução sem o qual, segundo diz, o regime continuaria.

Impressiona a lágrima nos olhos do leão moribundo incapaz de se valer das garras, outrora potentes, para afastar os rafeiros que lhe ladram de perto.

Marcello Caetano, com todos os pecados do ser humano, foi neste País da estatura que os Sampaios nunca terão.

Sampaio, Sampaio, quem és tu?

NOTA: este artigo motivou correspondência vária, com o Professor Marcello Caetano, que no livro saiu com o fac-símile das duas cartas do Professor, mas que aqui irão só em letra de imprensa.

Rio 30.III.78

Sr. Dr. Cunha Simões

Creio que é primeira vez, desde o 25 de Abril, que um jornal tem coragem de tomar a minha defesa contra injúrias bolsadas sobre o meu nome ou a minha obra por um foliculário qualquer.

Por esse motivo, quero dizer-lhe quanto estou grato e ao jornal “A Província”, admirando a coragem, a independência e isenção de que dão provas. Oxalá o público reconheça que o existe de valioso nesse atributos e corresponda com o seu apoio.

Com toda a consideração me subscrevo.

M.Att.de

Marcelo Caetano

Rio II.XI.78

Sr. Dr. Cunha Simões

Recebi sua carta de 24 de Outubro que não me surpreendeu porque há bastante tempo, pela Imprensa e através da nossa comum amiga Maria José Folque, venha apreciando a lucidez da sua inteligência e a sua excepcional coragem moral. É uma página admirável com um testemunho precioso que muito agradeço. Nem sempre de acordo com os juízos nela formulados (embora largamente aberto ao pensamento do meu tempo, poderei ser considerado um “estrangeirado”?), os que me dizem respeito, porém, não me compete discuti-los, pois ninguém é bom juiz em causa própria.

Só uma resposta quero dar à pergunta que, alturas tantas, faz. Por que motivo aceitei em Setembro de 1968 o encargo do Governo, depois de dizer aos amigos e ao próprio chefe do Estado que “não tinha comigo solução para nenhum dos prementes problemas nacionais”? A verdade é que a partir da doença do Dr. Salazar as pressões de amigos e até de desconhecidos que se apresentavam como patriotas inquietos foram muito grandes: “se for convidado não diga que não...” E o próprio Presidente República ao formular-me o convite me informou: ouvi mais 40 pessoas, civis e militares, e 99% puseram à cabeça o seu nome... Tive a sensação de que recusar naquela altura, ao fim de tantos anos de vida pública, seria uma cobardia, a recusa a prestar um serviço que a Pátria me exigia em momento crítico...E disse que sim, com a morte na alma. Devendo dizer que não contava com o acolhimento popular que tive. Também aos íntimos confidenciei a minha convicção de que ia percorrer uma via-sacra, que passara o tempo das grandes manifestações de apoio ao Governo e dos aplausos carinhosos a quem exercia... e nos primeiros tempos os próprios colaboradores mais próximos só traziam informações pessimistas e rumores desagradáveis da opinião pública. Foi quando resolvido pô-los a todos de parte e lançar mão da TV, inaugurando as “conversas em família” e criando através delas um vínculo directo e pessoal com o povo. Nas minhas deslocações à província, logo a seguir, sentiu o impacto dessa comunicação: a gente vinha à estrada para ver de perto aquele de que conhecia a imagem (como se eu fosse um actor, e exclamava. “Olha, é como na televisão!”) Foi isso que me permitiu aguentar cinco anos e meio o regime e fazer um esforço para salvar o que fosse possível, no meio da cegueira dos políticos, da recusa de colaboração dos adversários ou dos reticentes, do egoísmo dos capitalistas, da estupidez da alta burguesia, das ilusões dos intelectuais irresponsáveis, da manobra da Igreja preocupada em não perder algum comboio vindouro e a braços com o problema ultramarino que no o país a direita se recusava a compreender da única forma possível e que a ONU não deixava resolver pela única maneira que seria admissível para Portugal.

Escrever mais livros? Não me sinto com paciência para fazer. Bem basta o que ainda me forçam a dizer em minha defesa...

Sei que a sua mulher é filha do meu condiscípulo Fernando Corte Real: peço-lhe que lhe transmita os meus respeitos.

Creia-me, muito grato e att.

Marcello Caetano

INGRATIDÃO

Se alguém quisesse destacar uma classe importante na sociedade Portuguesa poderia com vantagem lançar mão da figura do ingrato.

Bajulador, servil, pronto para tudo bem enquanto precisa, reconhece na figura do que o protege o senhor supremo.

Com quem adivinha o futuro próximo exagera a sua actuação dando bem a entender que os seus sentimentos não podem durar muito.

Passada que é a necessidade, e satisfeito desejo, o ingrato rejeita o seu protector como algo incómodo e desnecessário.

Tudo se agrava se aquele que fez o favor passa por dificuldades ou precisa de uma mão amiga.

O ingrato como sub produto da humanidade, mostra-se incapaz de ajudar aquele que o ajudou demonstrando assim que não compreende este mundo de Cristo nem o pode aceitar como coisa sua. Infelizmente, esta atitude é agora e de sempre.

Sem falar em Judas, que O traiu, invoquemos a figura de Pedro que negou três vezes o seu mestre por cobardia.

São assim as relações entre os homens.

Pouco mais há a esperar de um mundo em que as relações humanas empobrecem de dia para dia.

A HUMILDADE DE SERVIR O PRÓXIMO

Neste país à beira mar plantado, um jornal deveria reflectir as forças e as fraquezas do Povo que serve e da região que defende, ora perante a centralização política e a exploração desenfreada de toda a província portuguesa por parte de Lisboa. É necessário que os jornais de província se fortaleçam cada vez mais.

Na verdade temos de nos lembrar que Lisboa consome 90 por cento dos impostos recolhidos na província e em nome de um grupo político a que se convencionou chamar Governo de Portugal, mas que nos mantém no mais profunda atraso das regiões da Europa.

Só o jornais conseguiram motivar e consciencializar todos os portugueses para a tarefa que todos temos de fazer em comum sem que para isso se tenham de privilegiar umas regiões em desfavor de outras, mas para que isso aconteça é necessário que os jornalistas saibam traduzir no seu jornal a realidade em que os cerca.

Fazer jornais em cima do joelho é contraproducente, por este motivo é necessário que os jornais de província providenciem para que nestes órgãos de informação se vão preparando pessoas que possam trabalhar a tempo inteiro de modo a emprestar-lhes toda a força e coordenação.

Temos de colocar no pensamento que dirigir um jornal é uma arte que necessita de alguém que alie à qualidade literária e cultural uma visão sociológica do seu tempo, dedicando-se por inteiro, aos interesses fundamentais dos seus conterrâneos e à humildade de servir o próximo.

A MÁ-LÍNGUA EM PORTUGAL

A má-língua em Portugal é a única instituição que funciona.

Nunca ninguém tentou fazer neste país fosse o que fosse que não levantasse de imediato uma onda lamacenta de maledicência.

Por esse mundo Cristo, deixa-se governar quem governa e trabalhar quem trabalha. Em Portugal ainda não se conseguiu esse objectivo. Na verdade, quando é preciso, mas só quando é preciso utiliza-se a crítica inteligente, séria e frontal.

Em Portugal, seja qual for o serviço a prestar ou prestado, injuria-se, sabuja--se, difama-se. É a resposta da incompetência num país em que muitos não querem trabalhar e muitos outros não sabem trabalhar.

O Governo terá dois caminhos: o caminho do passado; via Salazar obrigando a safanão, a meter a viola no saco aos imbecis.

A outra solução é cerrar os ouvidos a quem não merece atenção e ordem nenhuma.

Seja qual for estratégia da maledicência há que continuar o caminho das decisões, da reconstrução, do ressurgimento nacional indispensável ao tal país aonde todos desejamos que dê gosto viver. Faz falta deixar que os outros se sintam livres, senhores da sua iniciativa, da sua imaginação, da sua actividade de trabalho, não inutilizando com os pequenos desgostos os homens que podem e devem transformar Portugal.

Isto mesmo não quer dizer que não haja crítica ou que ela tenha que ser benévola ou inoperante.

Isto mesmo não quer dizer que se afrouxe a guerra sem quartel aos traidores da Pátria e aos que vendem o país todos os dias.

Isto mesmo não quer dizer que não se possa utilizar a máxima severidade para os pseudo democratas e para os trapaceiros políticos que utilizam a liberdade e ingénua das democracias para as aniquilar sem dó nem piedade e para todo o sempre.

NO PAÍS DO IMPROVISO

O improviso é para os portugueses fatal como destino.

O improviso português tem séculos e marca os grandes e os mais terríveis momentos que nos foi dado viver como Nação.

Tanto na paz como na guerra nunca nos preparámos, preferimos sempre actuar rapidamente e em força. E o defeito nem é sequer desta ou daquela facção de portugueses, veio dos confins da monarquia, entrou pela República, aguentou-se no longo período Salazarista, está de pedra e cal na democracia.

Cada ministro das Finanças improvisa um sistema, cada ministro do trabalho tem uma estratégia, cada secretário de Estado dos Desportos tem uma finalidade muito própria e muito pessoal.

Nada foi pensado com tempo, consequentemente.

Acontece, por vezes que se ganha na secretaria o campeonato que se perdeu no campo e todo estamos recordados que antes de principiar o campeonato do Mundo de Futebol os dirigentes federativos abençoavam a crise das Malvinas que eles pensavam afastar a Inglaterra do campeonato do Mundo para nos dar lugar a nós, exemplarmente eliminados nos campos do desporto e o mais curioso, nisto tudo, é que nem nos admiraria muito que se lá fôssemos acabássemos por vencer o campeonato do Mundo devido a essa fúria incontrolada que tem talhado, nesta terra os santos os heróis.

“Mísera sorte, estranha condição” como diria o poeta na expressão que melhor caracteriza este povo a quem alguém chamou por alguma razão especial “vândalos da Europa” que curiosamente vivem na terra do melhor vinho do Mundo, têm 80% do sol do planeta e são na sua inconsciência e no seu improviso, felizes como crianças

Embora pareça mentira é neste país, que uns chamam de subdesenvolvido e outros de país do improviso, que vêm passar férias os tecnocratas de todo o mundo para aprenderem a viver como homens e a desfrutar em prazer e amizade o convívio de um povo que ainda sabe saborear a vida.

SOMOS POBRES PORQUE QUEREMOS

Um país com o clima que temos, situado na Europa, é pobre somente porque quer.

Bastaria organizar-se única e exclusivamente como país de Turismo e todos viveríamos bem e a contento, sendo ainda extraordinariamente úteis para os povos de todo mundo ao proporcionar-lhes o repouso a que todos têm direito.

Preferimos porém minar as potencialidades deste país com milhares de trabalhadores que não trabalham ou trabalham mal e centenas de empresas públicas que mais não fazem do que pagar salários retirados das contribuições de todos nós, mesmo dos mais pobres.

Na verdade, somos pobres só por não ser capazes de reflectir minimamente para tirar deste país tudo quanto Deus nos quis dar de mão beijada e nós temamos em não querer aproveitar.

Contra isto... não há que culpar só o Governo. Todos, mas todos temos igual culpa.

O CONTACTO PRIVILEGIADO COM A NATUREZA

O nosso País, pode representar para o Europeu o oásis, o paraíso terreno, o contacto privilegiado com a natureza.

Na Verdade, talvez não seja a sociedade tecnológica, o grupo ideal para se viver, talvez não seja a sociedade das grandes fábricas a melhor escolha para passarmos os poucos anos que andamos pelo mundo. Por isto mesmo, é provável que Europa evoluída possa beneficiar do “atraso” de Portugal, até agora defendido do assalto tecnológico e do desgaste industrial.

Por um milagre inexplicável conseguimos preservar a gastronomia, o artesanato, o folclore e sobretudo salvaguardar a pureza deste povo acolhedor, hospitaleiro e amigo.

É este o contributo que vamos dar a Europa.

Não concorremos com óperas, nem teatros, nem cinemas, mas aposto que vai fazer sucesso o grupo dos Pauliteiros de Miranda, o Fandango do Ribatejo, a Tourada à portuguesa, a caça à raposa, o cavalo lusitano, o nosso vinho, a nossa aguardente, as alheiras de Mirandela e sobretudo o queijo da serra que é, nem mais, nem menos o melhor queijo do mundo.

Esta pequena lista é realmente a grande moeda troca que mostrará à CEE que fez o melhor negócio da sua vida ao acolher Portugal.

Temos a certeza que a Europa do progresso, da prosperidade e do trabalho duro e organizado nunca se arrependerá de ter recebido este país maravilhoso onde o tempo corre suavemente e tem o verdadeiro paladar da vida.

O paraíso está às portas da Europa e tem o nome mais querido: Portugal.

ORGANIZAR O PRAZER DOS OUTROS

Vêm aí os estados unidos da Europa e com maior ou menor vontade começa a ser pouco possível conservar independências absolutas, isto é: ter a porta fechada e a chave no bolso.

Sendo assim, provavelmente os países distribuirão entre si tarefas a cumprir aconselhando prioridades neste ou naquele sector e distribuindo regalias conforme a execução destas tarefas.

Deste modo, quem tiver características para a Agricultura fará esta ou aquela espécie de Agricultura. Quem tiver características para a indústria e sobretudo quem tiver características industriais e tecnologia avançada intensificará esse ramo em proveito de todos.

E nós?

Nós... agricolamante pobres, industrialmente reduzidos quase a zero, será possível ficarmos reservados para os tempos livres vendendo aos outros o tesouro do nosso sol, da nossa temperatura e a simpatia da nossa gente?

Será possível que o industrial do Turismo do nosso país passe esta segunda actividade nacional para primeira e daí a actividade exclusiva ou quase exclusiva?

E por que não?

Organizar trabalho, isto é, neste caso, organizar o repouso, é contribuir para que a nossa actividade seja mais rentável e mais lucrativa.

Numa Europa de trabalho, não é vergonha, para ninguém, transformar Portugal num autêntico paraíso, onde as estadias serão verdadeiras curas de corpo e de alma.

Não quer isto dizer, que não se trabalhe e não se trabalhe a sério. O que nós temos é de organizar bem o prazer dos outros, preparando Portugal como um verdadeiro país de Turismo onde o ar puro, as águas cristalinas das nossas fontes e riachos, a limpeza das nossas praias e ruas seja um facto suficientemente forte para atrair milhões de outros europeus em cujos países já é difícil respirar o ar despoluído que ainda lhes é oferecido e que teremos de conservar se desejarmos continuar independentes, ricos, prósperos e... saudáveis.

O DOTE COM QUE ENTRÁMOS NA CEE

Quando se fala de Portugal na CEE vem sempre à baila a questão económica como se Europa unida não fosse mais que um casamento de convivência para ganhar mais dinheiro.

Se uma das vantagens da união dos países da Europa é a vantagem económica, em nosso ver não será a principal e muito menos a única.

Fundamentalmente os jovens destas doze nações têm agora um espaço muito maior. A Europa não sendo uma pátria é um amplo campo de amizade, cultura e vivência. E talvez resida aqui a grande conquista desta comunidade fraterna que nos torna cada vez mais cidadãos do mundo.

É lógico pois que a jovem Comunidade sinta dificuldades enormes na sua organização e no seu dia-a-dia porque ela é uma novidade total em relação ao futuro e luta com forças do passado, velhas de muitos séculos e de difícil remodelação.

Espero bem que a Comunidade Europeia não perca a coragem e seja um acto irreversível em relação aos Estados Unidos Europeus, indispensáveis ao equilíbrio das forças que actualmente dominam o mundo.

Mas se para Portugal a grande vantagem da adesão estará na sua evolução económica também Europa poderá tirar vantagem da experiência, da qualidade natural e do engenho do novo mundo que integra.

Em que consiste então o dote com que entrámos na CEE?

Fundamentalmente, consiste numa cultura quase milenária, profundamente original e desconhecida dos europeus.

Como é evidente sofremos ao longo de todos estes séculos alguma influência da Europa e, curiosamente, é esse aspecto que as nossas entidades oficiais desejam mostrar sempre que somos visitados por estrangeiros.

Normalmente escondem, como acto menor de cultura, um espantoso artesanato, uma gastronomia riquíssima e variada, um folclore variado e vistoso que assinala a presença de gentes de todo mundo.

A juntar a isto um clima, uma paisagem e uma gente deslumbrante.

A Europa recebeu um parceiro não poluído, experiente nas andanças do mundo e receptivo a inovações. As trocas serão de igual para igual embora ingenuamente, muitos pensem que os portugueses ficaram beneficiados.

Há quem pense o contrário e é por isso que o mundo soma e segue.

PORTUGAL PODE SER O PAÍS MAIS FORTE E APETECÍVEL

Em relação aos países europeus mais desenvolvidos estamos bastante atrasados, o que não quer dizer que a nossa situação não seja, por via disso mais cómoda e mais capaz de projectar um futuro, provavelmente de melhor qualidade do que aquele que terão os nossos parceiros da CEE.

Estes países sacrificaram ao progresso, aspectos muito importantes os quais passam pelo ambiente, pelo stress, por agressões à natureza e ainda por graves atentados contra a condição humana, o que já fez desencadear um processo acelerado de suicídio, de consumo de drogas, de corrida aos psiquiatras.

Os nossos parceiros da CEE vivem melhor, mas cada vez com menos interesse e alegria.

É certo que não podemos viver a aventura dos países ricos, mas se por um lado ficamos mais pobres em divisas, ficamos por outro mais ricos de oportunidades ao poder preservar o ambiente onde a vida decorra com harmonia, e onde seja possível fazer repousar outros homens de países industrializados sujeitos a uma pressão insuportável pelo ritmo de trabalho, pelo ambiente e pela envolvência.

Portugal, em vez do mais fraco dos países industrializados, pode ser o mais forte dos países turísticos da Europa.

REFÚGIO E TERRA ABENÇOADA

Ao contrário da Europa da produção, das fábricas e dos detritos, Portugal pode ser a Europa das férias, do prazer e do repouso.

Felizmente, longe do clima de guerras, fomos até agora, neste continente, refúgio e terra abençoada de paz. E embora não seja possível viver sem poluir a verdade é que acidentalmente e por via do nosso ancestral atraso deparamos hoje para Portugal com a solução ecológica como único ponto de saída.

Neste país o tempo corre lentamente ignorando a fúria das horas e gozando o lazer dos séculos. Ofereçamos pois, a essa Europa apressada e já com sintomas de artérioesclerose, a pujança de um país novo que regressou de África com forças redobradas e que tem para oferecer a paz, a segurança, o bem-estar e o ar de puro que se respira do Minho Algarve e onde o paladar do Vinho ribatejano ou do azeite beirão são néctares próprios do deus homem que cada vez pagará mais para viver neste País à beira-mar plantado, mas cujo preço será, óbvia obviamente compensador.

Portugal, País de férias, é isso um bom motivo para entrar pela porta grande na CEE.

NÃO BASTA FAZER LEIS

Viver hoje em dia em sociedade é algo complexo, difícil.

A vida já nos disse que nos dias de hoje o analfabeto é um autêntico cego perdido num labirinto. Precisamos de conhecer concretamente os nossos direitos e os nossos deveres.

Precisamos de ter acesso fácil às nossas regalias.

Precisamos, em suma, de campanhas que nos alfabetizem socialmente.

Não basta fazer leis. É preciso divulgá-las constantemente, nunca nos cansando porque todos os dias há novos cidadãos que chegam à vida.

Democracia é precisamente isto: valorizar as pessoas, tornando-as mais integradas na sociedade em que vivem.

A par disto é preciso convencer os funcionários públicos que estão ao serviço do povo e que é o povo quem lhes paga.

Em todas as terras há nas repartições públicas funcionários extremamente amados e respeitados e outros profundamente odiados e desprezados.

É preciso, também aqui, preparar os que atendem o público para que isso possa ser feito com carinho, dedicação e eficiência.

UM PAÍS NÃO PODE SER GOVERNADO EM CIMA DO JOELHO

Entrando de rompante nesta Europa onde o progresso e a democracia pontificam há décadas, Portugal estremece em cada dia passa e enfia-se atabalhoadamente em jogos dos quais mal sabe as regras.

Na verdade, a nossa impreparação, faz com que os políticos e que a política por nós seguida se venha degradando rapidamente. Essa degradação é tão alarmante que poderá vir a custar-nos a nossa própria sobrevivência.

Com efeito, em Portugal, tem-se confundido o termo democratizar, com abandalhar e isso é tal modo grave que a descrença e o desinteresse vão-se instalando comodamente no interior da sociedade portuguesa o que lhe poderá trazer dentro de um ou dois anos gravíssimos amargos de boca. (Medite-se nos retornados de Angola e Moçambique e nos massacres praticados em Timor).

Se por um lado pretendemos imitar os países onde o bem-estar é evidente e as instituições democráticas funcionam, por outro lado esquecemos que um país não pode ser governado em cima do joelho e temos forçosamente, se quisermos sobreviver, de lhes imitar também os organismos públicos que estão solidamente entregues a técnicos profissionais e a políticos e eficientes que, em qualquer circunstância, asseguram a manutenção da máquina do Estado evitando, desta maneira, situações dramáticas e irreversíveis.

Portugal necessita de encontrar, urgentemente, uma equipa nova, dinâmica, digna e competente que trace as linhas mestras da recuperação nacional que nos consiga aguentar como país independente

Temos largar infantilismos e quezílias despropositadas. Temos de manter firmeza nas decisões justas e sensatas, e é preferível ouvir a gritaria dos opositores que ainda conseguem comer com regularidade, do que o choro surdo dos famintos que morrendo pelos casebres ou pelas esquinas nos hão-de acusar de pusilânimes, de inconscientes e de medrosos.

PORTUGAL NUNCA SE ORGANIZOU A NÍVEL DE TRABALHO

Em Portugal viu-se o fenómeno muito antigo e muito curioso. Emigra-se porque o país nunca se tendo organizado a nível do trabalho apresenta um número reduzido de postos de trabalho e esses, mal remunerados.

E estamos mesmo convencidos que os Descobrimentos resultaram de um caso de emigração.

Por outro lado poderemos dizer que nunca nos organizámos bem economicamente porque preferimos emigrar.

Como vai ser o futuro?

Para já entrámos na CEE e o primeiro embate parece-nos positivo, por outro lado a crise do petróleo passou, no entanto e por paradoxal que isto nos pareça estamos convencidos que se aproxima uma nova era de fortíssima emigração e isto por dois motivos: voltará a ser necessário a mão-de-obra nos países da CEE e, a médio prazo, os portugueses voltarão a ser solicitados para trabalhar em Angola e Moçambique resultando daqui uma sangria profunda da população portuguesa que poderá chegar ao fim do século com menos de oito milhões de habitantes.

Ou então, mais grave ainda, seremos emigrantes no nosso próprio país, pois individualmente ou em grupos, as empresas estrangeiras vão invadindo Portugal e de repente, sem bem sabermos como, está tudo a trabalhar para patrão estrangeiro em terra portuguesa.

Será mesmo este o nosso destino. Vender a alma a alegria e Portugal actuou como os míseros tostões ou será que os portugueses, conscientes do seu valor, utilizando a massa cinzenta a cem por cento se nem e acreditam, finalmente, que podem construir na terra onde nasceram o lugar de sonho que sempre imaginaram para si e para a felicidade seus filhos?

OS TRABALHADORES DA TERRA

Explorados desde tempos ancestrais os trabalhadores da Terra vão abandonando a mesma com amargura e desilusão devido não só à subida desenfreada dos adubos, do gasóleo, das sementes, mas também pelo desprezo com que são tratados.

Gil Vicente pôs na boca de um lavrador a célebre definição: “nós somos vida das gentes e morte das nossas vidas”.

Como há 500 anos a lavoura é ainda em Portugal a morte espiritual do homem condenado ao trabalho pesado, permanente e rude, ao analfabetismo, à vida isolada, à ausência de serviços de saúde.

A desordem da nossa agricultura obriga à desordem na vida do homem do campo.

Por isso e muito naturalmente esta agricultura obsoleta que se pratica no nosso País não interessa a ninguém, não serve ninguém, desertificando cada vez mais os campos e fazendo que eles contribuam cada vez menos para o nosso bem-estar e para uma alimentação que venha para os portugueses da terra portuguesa.

Terá que se encarar a vida agrícola como um trabalho igual ao de um banco, de um hospital, de uma secretaria ou de uma escola.

Isto mesmo se faz já há muito tempo em França e na Inglaterra. Nós se não o fizermos também nunca mais atingiremos o nível do mundo desenvolvido onde o bem-estar e a segurança social são a raiz da felicidade dos povos que aí habitam.

DEFENDEMO-NOS COM A EMIGRAÇÃO E O TURISMO

Portugal nunca foi bem governado. Só assim se compreende que tenhamos chegado ao final do século XX com uma agricultura medieval, uma indústria e um comércio incipientes, sem marinha, sem aviação e com um exército obsoleto e inoperacional.

Defendemo-nos com a emigração e com o turismo.

A história apontando os dois ou três reinado dos e dois ou três estadistas isolados que saíram do marasmo sem que a sua obra tivesse continuidade.

O problema mantém-se nos nossos dias em que grande falha política e social continua a ser a direcção das empresas e em última análise a direcção do País.

De facto nunca soubemos fazer nada com regularidade.

De tempos a tempos cai-nos nas mãos uma Índia ou um Brasil os quais acabamos por perder sem glória nem proveito e não vemos modo de modificar esta situação que se agrava a cada vez mais, tornando impossível a modernização de que tanto se fala.

Estamos de novo numa séria tentativa de acertar o passo pela Europa que acabou por nos receber na Comunidade económica.

É uma tentativa onde temos de colocar toda a nossa esperança, embora o atraso que nos separa dos países ricos da Europa, agora nossos parceiros, seja muito grande.

Não nos podemos esquecer que, oficialmente temos ainda 20% de analfabetos e 80% de semi-analfabetos que praticamente nada lêem e nada escrevem depois que saíram da quarta classe.

Isto não quer dizer que o português não seja hábil, disciplinado, cumpridor e honesto.

Perante o desafio que a Europa do progresso e do bem-estar nos propõe, vamos agarrar com ambas as mãos a nova situação e aplicar no nosso país os méritos que os outros nos reconhecem e que já demonstrámos, sobejamente, em terra alheia.

O PORTUGUÊS EMIGRA PORQUE SE SENTE PRISIONEIRO NA SUA TERRA

A emigração em Portugal é velha como a história e prende-se fundamentalmente com a nossa missão de viajar.

Entalados pela Espanha, neste recanto da Península, é natural que o português se sinta prisioneiro na sua própria terra. Interessados pelo mar e naturalmente pela navegação, cedo verificámos que viajar era uma aventura fabulosa e lucrativa.

Assim, começámos a emigrar. A viajar pelo mundo, a darmo-nos com gentes de todas as raças, a ser capazes de trabalhar em qualquer parte e a fazer quase tudo e quase sempre bem feito.

Quem primeiro emigra são os portugueses do Ribatejo e do sul de Portugal. O Norte é gente de lavoura, mais agarrados à terra.

Estes só se decidiram no século passado, impelidos pelo mal-estar económico e escolheram o Brasil.

São conhecidas as casas dos brasileiros do Minho, que partiam pobres e chegavam ricos para fazer grandes casamentos e levar vida faustosa.

Mas ao contrário do que muita gente diz, nós não emigrámos só por razões económicas.

Seja qual for a nossa situação havemos sempre de emigrar, de viajar, tendo uma curiosidade insaciável de ver outras terras e outras gentes.

Apesar de tudo e como bons portugueses que somos nunca esquecemos a santa terrinha, esperando sempre voltar a ela nem que seja só para aí acabar os dias.

Apaixonados pela nossa terra comprazemo-nos com o sofrimento de estar longe dela e de vir aqui, de tempos a tempos, matar saudades da nossa paisagem, da nossa comida, do nosso vinho e sobretudo de ouvir falar da nossa gente.

A verdade é que ninguém é totalmente emigrante. Pode dizer-se que muitos portugueses, numa altura da sua vida, fazem emigração.

Emigrar ou não emigrar é um fenómeno como viajar ou não vigiar e é bom que se saiba que somos todos portugueses e não nos dividimos nunca em emigrantes e não emigrantes.

Fomentar este género de disputa é desvantajoso e pouco sério.

Somos todos filhos de um mesmo país que amamos acima da própria vida, e, vivendo em Portugal ou a milhares de quilómetros de distância, todos sentimos orgulho em sermos portugueses.

AS CASAS DOS EMIGRANTES

Alguns órgãos de comunicação têm atacado com alguma ingenuidade e com laivos de tradicionalismo saloio, as casas que os emigrantes fazem em Portugal, responsabilizando-os por todas as mazelas urbanísticas de que este País vem sendo vítima nos últimos anos.

Embora não seja apologista da sistemática descaracterização urbanística penso que num país como o nosso, fortemente batido pelos ventos da história é pelo menos, insensato, travar a influência deste ou daquele país, nesta ou em qualquer outra época.

Se pensarmos um pouco vem-nos imediatamente ao espírito as casas dos “brasileiros” que eram os emigrantes de há cem anos e que hoje são monumentos nacionais.

Na verdade, é ridículo que se defenda que os portugueses tenham de fazer as casas sempre da mesma maneira.

É por casos destes que a nossa arquitectura é hoje uma aberração e o que há no nosso país é de autoria de arquitectos estrangeiros ou de amadores cultos.

Ninguém pode, por uma questão de bom-senso ignorar que os povos têm direito de inovar, de fazer como desejam e como gostam, mesmo que isso ofenda os Velhos do Restelo

Não exageremos o nosso proverbial bacoquismo e deixemos os emigrantes em paz.

Na verdade, não nos ofende o gosto e as influências longínquas das casas dos emigrantes, ofende-nos a sensibilidade de alguns que não fazem nem deixam fazer.

A SINA DE UM POVO

Têm-me chegado centenas de cartas para atacar a descolonização e defender o passado

Muitos continuam a insistir para que o faça.

Aquilo que está feito, mau ou bom, já passou

Sejamos realistas acabemos com rancores.

Penso que estão a durar tempo demais.

Nós temos de encontrar urgentemente a nossa identidade, esquecer os ódios antigos e arrancar da nossa inteligência a felicidade que a raiva e a inveja afastam irremediavelmente de nós.

Todos devemos compreender que Portugal ao integrar a Comunidade Económica Europeia não entrou na Europa, mas regressou à Europa depois de um passeio de meio milénio por esse mundo de Cristo em que fomos missionários, civilizadores, piratas, transportadores de cultura, aventureiros, como compete a um povo nobre e digno.

De candeias às avessas com o seu único vizinha de fronteira, os portugueses viraram-se decididamente para o mar, navegaram e viajaram.

Regressámos trazendo na bagagem um pouco de cada povo e de cada região

Muito antes de termos iniciado, no século XV, os grandes Descobrimentos, também nós fomos integrados, desde as mais remotas eras, por povos de diferentes paragens que vinham para a Península Ibérica e ficavam no território que é hoje Portugal, por ele ser o último antes do mar.

Dos indígenas a que chamaram Iberos pouco se sabe, mas é bem conhecida a história dos celtas, dos fenícios, dos gregos, dos Suevos, dos Alanos, dos vândalos, dos visigodos, dos muçulmanos e dos romanos que aqui vieram em passeios turístico militares, misturando-se com as populações locais e deram origem ao povo de caminheiros que nós somos.

Tal como eles voltámos lugar ao local de origem.

OS PROTESTANTES E A ARGENTINA

É evidente que seria grossa maldade da nossa parte juntar os honestíssimos deputados signatários do protesto contra a Argentina com os réus bombistas que rebentam petardos à porta da Embaixada daquele país

É evidente que não pode haver, nem fisicamente nem ideologicamente, comparações. É porém legítimo sublinhar que o efeito internacional é muito semelhante, talvez o mesmo.

Nós conhecemos as pessoas. Eles não. Nós sabemos quem são os senhores deputados Carlos Laje, José Leitão e Aarons de Carvalho. Sabemos que lutaram pela democracia, vemo-los pôr o seu nome e a sua responsabilidade em todos os actos, em todas as situações, frontalmente contrários à bomba anónima e assassina. Mas lá fora, no mundo para o qual se dirige o protesto e a bomba, a distinção é pormenor que não virá ao caso.

Os deputados, os protestos, as bombas, a arruaça é conjunto que não se pormenoriza para lá da fronteira, que não se pode individualizar em boas ou más intenções, independentemente da bomba e do protesto.

Perguntamos: que se pode adiantar a nível de Argentina e do mundo o nosso barulho, ali em S. Bento, perdendo definitivamente a oportunidade de tratarmos assuntos urgentes, por vezes dramáticos, dos portugueses que aqui ao nosso lado sofrem a dura vida imposta ao país.

Se a ordem dos Médicos trata da reforma agrária e a faculdade de ciências se reúne em plenário durante dois dias para equacionar o problema Lisnave ou da Setenave, entra em greve por motivos de ensino, nós protestamos e protestaremos violentamente por intromissão em áreas de competência alheia. E quando a Assembleia da República quer governar a Argentina e o Brasil. Rimo-nos ou limitamo-nos a votar contra?

A CRISE DO HUMANISMO

A generosidade que o humanismo trouxe ao mundo debate-se frontalmente com a filosofia oposta, de imprevisíveis consequências: O banditismo.

Crentes nos direitos do homem, de qualquer homem que escolha o caminho da justiça e da verdade, organização social moderna criam no seu seio o Exército do mal, da morte e do medo.

Contra Aldo Moro levantou-se a espada satânica dos perversos, abalando profundamente o sagrado princípio da autoridade, da disciplina, do respeito pela vida humana, pela própria condição humana.

A benevolência do humanismo gera o banditismo.

Mais rentável e mais fácil que assaltar bancos vem sendo o assalto ao poder para o que basta um pequeno grupo.

Ao terrorismo, e até ao momento presente, nunca a humanidade respondeu com o próprio terrorismo, mas parece-me que é tempo de repensar esta atitude.

Crimes de terrorismo político não só um problema de polícia mas um crime contra humanidade, contra todos nós e contra o futuro dos nossos filhos.

Apologista da paz, do amor, da fraternidade, sou também a favor da resposta violenta e cruel para crimes desta na natureza.

A GERAÇÃO DE 80

A geração de 70 do século XIX parece implicar que o grupo elitista da nossa centúria fique conhecido pela geração de 80, como indicam as Conferências democráticas do teatro Maria Matos que há falta do Casino Lisbonense pretendem futurizar a política deste país na década que se prepara para entrar.

Um semanário de Lisboa, dirigido e elaborado por jornalistas cujo top cultural equivalia a Espiolhar a geração de Antero e Eça de Queirós apresentam agora as conferências do Maria Matos que são um arremedo revolucionário, doméstico e publicitário, sem desprimor para as personalidades que falam e para aquilo que dizem.

Antero, Eça, Adolfo Coelho, Salomão Saraga, não equivalem, por maior que seja a boa vontade, a Freitas do Amaral, a Sousa Franco, a Mário Soares, a Álvaro Cunhal. Estes, a maior ou menor diferença são Governo do hoje, enquanto Eça, Antero, e companhia era politicamente pelo amanhã

Quer o “O Jornal” a glória política de meter o pé na argola? Ceda nesse caso a Tribuna do Maria Matos à Isabel do Carmo e ao famigerado Carlos, a Arnaldo de Matos e a Saldanha Sanches que não a Acácio por moderado e tratável, só assim o Visconde de Jaime Gama de Ávila, mandaria encerrar o Casino Lisbonense do Maria Matos e daria origem a burburinho intelectual e político na zona do Chiado.

As respostas históricas e o regresso às origens democráticas são sempre sintonia de decadência e alvorada de um mundo novo prestes a começar.

OUTRA VEZ ANOS 80

Resposta a um leitor.

O português é naturalmente desconfiado e atribui, normalmente, a quem escreve intenções que nunca estiveram no pensamento nem na imaginação.

Só isto explica uma página de verrina aguda que nos foi enviada por causa do “fundo” do último jornal, que, se bem se recordam tratava das conferências do Casino Lisbonense meses ou melhor, do Maria Matos que terminava assim: “As reposições históricas e o regresso às origens democráticas são sempre sintonia de decadência e alvorada de um mundo novo prestes a começar”.

Tanto bastou para que um Sr. nos enviasse, entre outros piropos a seguinte prosa:

“É natural que o clima de liberdade, que mesmo assim se vive neste País asfixie muita gente desejosa de regressar aos privilégios passado pelas costas bem guardadas e os bolsos recheados.

O desplante para quem aponta para a decadência, passados que são quatro escassos anos de democracia, não devia ficar impune numa sociedade que se quer defender dos seus inimigos”.

Passando em falso os privilégios, os bolsos recheados e outros lugares-comuns dicionarizados por um conhecido Partido português, julgo importante esclarecer duas questões que podem ter real interesse para quem tiver paciência de nos ler.

Efectivamente, penso que a democracia e o parlamentarismo português deste fim de século estão extremamente próximos do panorama português do final do século XIX pois pouco se progrediu em ideologia, em métodos e em organização social. Comparativamente poderemos dizer que nalguns se estagnou por completo ou até se retrocedeu. O que não há dúvidas é que continuamos politicamente românticos como há cem anos. Continuamos elitistas, historicistas como há cem anos, continuamos divorciados do País real como há cem anos. E como há cem anos continuamo-nos a servir do nome do Povo e a ignorar completamente esse povo de que tanto falamos.

Meu caro e virulento opositor e meus prezados leitores; a verdade é que pensar que há efectivamente decadência não é um crime e julgamos mesmo que não é um erro.

A segunda questão que gostaríamos lembrar ao estimado epistológrafo é que a decadência de uma época e de um regime não obriga a retrocessos nem a reposições históricas.

Acreditamos que o futuro do mundo nos trará novas e melhores soluções baseadas nas lições do passado e na arte de imaginar futuro.

A crise que o país atravessa é, quer queiram quer não uma crise de incultura e de ignorância, por isso será longa e dramática embora não seja eterna, nem fatal.

Depois disto no caro senhor e prezadíssimos portugueses, por que é para todos vós que eu falo, resta-nos a esperança na capacidade que sempre revelámos, resistindo aos piores momentos da história.

Vem sendo assim há mais de oito séculos e assim continuará a ser por secula seculorum.

O MUNDO EM QUE VIVEMOS

O mundo em que vivemos é no seu todo uma casa mal arrumada e mal administrada.

É na verdade inconcebível que o orçamento de um navio nuclear, russo ou americano, ultrapasse o Orçamento Geral do Estado de 50 países não alinhados. Por outro lado a distribuição da população é fundamentalmente anárquica encontrando-se países como a Índia em que as pessoas se amontoam para morrer de fome e outras como o Canadá, a Austrália ou grande regiões de África onde a vida não funciona por falta de mão-de-obra.

Competiria às Nações Unidas debruçar-se sobre este problema, procurando uma melhor distribuição das pessoas pelos territórios e uma maior participação dos ricos na vida dos pobres.

A terra podia ser efectivamente um autêntico paraíso onde todos vivessem o conforto, onde não houvesse crianças com fome e onde não fosse preciso roubar e matar para comer.

É necessário muita coragem para trabalhar com amor e devoção por esta terra que precisa urgentemente da inteligência e da força de todos, para continuar digna e lugar aprazível para os vindouros.

COMO ACABAR COM A MISÉRIA E O DESEMPREGO

O surto de desemprego dos países industrializados ou mesmo em vias de desenvolvimento contraste violentamente com as carências de toda a ordem dos países do terceiro mundo, principalmente em África e nalgumas regiões da Ásia.

Ora estes países vivem na mais profunda miséria por falta de técnicos competentes que organizem a nível da exploração do solo e do subsolo.

Como é evidente, todos os desempregados dos países industrializados seriam utilíssimos no lançamento da Indústria e da Agricultura dos países que normalmente possuem abundantemente matérias-primas, solos e clima propício.

Por outro lado os países ricos gastam biliões de dólares em subsídios de desemprego, resolvendo mal um problema que poderia ser extraordinariamente bem resolvido se os que sobram de um lado e fazem falta no outro fossem deslocados em perfeitas condições de operacionalidade.

Os que acham esta ideia louca e descabida fazem parte daquele grupo que acha que não vale a pena abrir o chapéu quando chove só para não o fechar quando a chuva passa.

Esta era a nova cruzada que acabaria com a fome à superfície da terra.

Em vez de darmos um peixe de esmola ensinávamos o pobre a pescar.

HOMENS E MULHERES DE CABO VERDE

Cabo Verde nasceu comigo e tem-me acompanhado pela vida fora como um sonho que não nos deixa por muito tempo e volta que não volta ele aí está.

Primeiro, as histórias do meu avô sobre Cabo Verde e por São Tomé, lugares onde tinha deixado a sua juventude, depois o Cabo Verde da escola primária com o professor José Manuel Landeiro a exigir que ninguém falhasse um único pormenor sobre aquelas ilhas que na minha imaginação de criança inquieta, à procura do mundo tomava como ilhas encantadas. O professor Landeiro era pouco dado aos sonhos dos alunos, tomava os erros a sério e quando eu misturava o Barlavento com o Sotavento lá vinham um par da reguadas para avivar a memória e trazer-me aos factos reais, concretos da vida.

Falava-se muito da banana, do café, do ananás de Cabo Verde e em Diogo Gomes e António de Nola. Ensinaram-me mil pormenores e também me disseram que às vezes estios eram muito prolongados. Só das gentes, dos homens e das mulheres nada disseram, talvez porque a gente não era pergunta de exame... e a mim, só a gente me interessou sempre em detrimento dos ananás, das bananas e do senhor almirante António de Noli. E foi essa gente que encontrei numa acampamento da Mocidade Portuguesa que me leva, alguns anos mais tarde, a dedicar-lhe duas ou três dezenas de páginas num livro publicado há 16 ou 17 anos.

É verdade que publiquei o romance sem nunca ter visitado Cabo Verde. E hoje depois lá ter estado, constato que a gente nunca me tinha enganado. Sempre os senti como na realidade são.

Na viagem do grupo parlamentar fui então ver a cor, a maneira, o feitio e a forma das ilhas de que tanto tinha ouvir falar e do povo que sempre me esconderam e que eu, por acaso, tinha encontrado.

Estive no Sal, em Santiago e em São Vicente. Foi em Santiago, na cidade da Praia, e na magnífica estância do Tarrafal onde marquei encontro com o povo de Cabo Verde.

O povo de Cabo Verde é harmonia, é ritmo, é beleza, é jovialidade, é alegria de viver. Dir-se-ia que Deus corrigiu, no Cabo-verdiano, as raças que se afastam e distinguem: a pele vem de África e da Europa. Os olhos doces lembram as gentes que navegam até lá, idas do Fundo do Mediterrâneo.

Um dia, a mulher de Cabo Verde marcará o mundo, como padrão ideal de beleza feminina.

O homem é inteligente, aberto e sempre à procura da melhor solução para resolver um problema que parece insolúvel: a seca.

Entre o tradicionalismo africano e modernidade europeia, Cabo Verde poderá vir a ser um magnífico exemplo de equilíbrio com vantagem para dois continentes que buscam há séculos o tipo de relações que melhor convém.

Só um último reparo: a vida em Cabo Verde parece estar no seu primeiro dia da de criação, em contraste com a decadência de outros homens e outros ambientes e tudo isto porque aqui encontramos homens e mulheres sublimes, que nasceram felizes e que irradiam felicidade numa terra áspera e dura que lhes nega cada dia o pão que lançam à terra.

TURISMO EM CABO VERDE

A lindíssima mulher de Cabo Verde, a lagosta das ilhas vazias e a areia sedosa dessas praias de maravilha acabarão por fazer, paradoxalmente, do tenebroso Tarrafal uma doce estância de férias.

Tal como a Madeira, os Açores e as Canárias, as ilhas Cabo Verde só poderão ser alternativa poética das férias, dos povos do Norte e do trabalho.

É inevitável Acapulcar Cabo Verde.

Se eu mandasse começava-se já amanhã. Tudo é bonito e é natural nestas ilhas do Atlântico. Tudo é harmonia beleza e calor. Tudo é simpatia desde os olhos profundos dos habitantes ao moreno saudável da pele, ás areias e praias iguais às areias e praias Portugal, mas muito, muito mais quentes.

É o fogo de África, a beleza de África, e poderá ser (e vai ser com certeza) a comodidade e a mentalidade Europa.

No Tarrafal, na praia do Tarrafal servem-se hoje surge, por tuta-e-meia, percebes que justificam uma viagem à ilha de São Tiago.

Eles e elas falam no tempo dos portugueses, olham para nós e riem-se como se tudo fosse tempo de portugueses e não valesse a pena ter sido de outro modo.

Talvez seja isto o espírito Bissau, que outra obrigação não tem o natural de receber bem, de proporcionar aos visitantes as delícias do seu habitat de eleição.

Um dia haverá passagem de ano na cidade da Praia, com aviões especiais e haverá hotéis que farão lembrar muita terra e muito povo.

Nós somos daqueles que já vêm de regresso, da expansão e do Império, para saber melhor que ninguém que temos de voltar a essas ilhas onde o pensamento e o coração se perdem no amor à terra e às gentes. E ninguém, ninguém foi por mais forte ao destino que Deus dá.

A CHUVA EM CABO VERDE

Quem alguma vez visitou as ilhas áridas das ilhas de Cabo Verde, permanece na angústia de chuva que o Criador parece ter negado, abusivamente, a esse extraordinário povo que jamais esquecerei.

Só quem conhece Cabo Verde pode sentir a simples notícia de jornal que informa o facto, aparentemente simples, de a natureza, finalmente compadecida e após longos anos de espera se ter decidido pela água, que é milagre em tão longínquas paragens.

Sei que há lágrimas nos olhos dos Cabo-Verdianos que olham a chuva benéfica que cai na Terra madrasta, que de outro modo lhe nega o sustento.

O cabo-verdiano na sua terra, agora independente, desde a primeira hora que se prepara para receber a chuva e segurar em terra firme o precioso líquido que das encostas se precipita no mar que os rodeia. Os diques que o povo constrói, de sol a sol, e amassa com o suor, são na verdade os alicerces de uma independência que se deseja próspera e feliz

Os cabo-verdianos, lutando assim contra a natureza pela sobrevivência ganham a admiração de todos os povos do Mundo, generosamente obrigados a ajudar quem tão dignamente sabe lutar contra a adversidade.

Que a solidariedade dos homens se junte à da natureza e que um dia seja possível o Cabo Verde, verdejante onde a felicidade e a abundância possam habitar na casa de cada um.

RECADO PARA AMÂNDIO CÉSAR

Não o conheço pessoalmente. Tenho lido, como toda a gente, coisas suas das mais diversas épocas e sobre os mais diversos assuntos. O senhor foi para mim um nome em tipo de Imprensa ao qual quase nunca ligamos uma pessoa de carne e osso com vida própria neste vale de lágrimas a que todos, mais ou menos penosamente atravessamos. Não sei onde está presentemente, nem sei que lhe aconteceu depois do que se passou neste País ultimamente.

Julgo, no entanto, que é meu dever deixar aqui este recado com a simplicidade com que me o deram.

A história conta-se em duas palavras: tendo-me deslocado a Cabo Verde travei conhecimento com um escritor da terra, de nome António Aurélio Gonçalves. Conversámos, falámos muito de Cabo Verde e dos que têm escrito sobre as ilhas misteriosas do Atlântico. Aurélio Gonçalves, um homem tisnado pelo singular clima de Cabo Verde perguntou-me por si, falando de um amigo querido que também não conhece.

Aurélio Gonçalves refere-se a Amândio César e às criticas que sobre ele escreveu como dos momentos mais altos da sua vida de homem e de escritor.

Terminou por me pedir para lhe transmitir a sua amizade e a sua solidariedade sobretudo se atravessa um mau momento ou passa por uma situação difícil

Aqui fica, Amândio César, a mensagem de um homem que não esquece os amigos.

É destes raríssimos exemplos de lealdade e dignidade que se fará a história das qualidades de grandeza e glória de que já nos orgulhámos e dos quais, Portugal e os portugueses, nunca terão de se envergonhar.

EXILADOS

O duro pão do exílio, alterna com a broa de milho portuguesa por dar cá aquela palha.

Intolerantes e ferrabráses, a metade que governa espantou sempre para longe a outra metade que fica normalmente em Paris, em Londres, em Argel ou em São Paulo à espera da viradeira.

Rebenta a “Bernarda” vêm os de lado lá, vão os de cá, tudo como dantes, com a diferença que o povo paga com língua de palmo e de fome as transferências das suas elites políticas por essa Europa fora. Um ou outro vai deixar longe a ossada. Foi assim com D. Miguel, com Afonso Costa, com Henrique Galvão, com Jorge de Sena.

Por muito respeito que nos mereça as andanças de Portugal por Franças e Araganças, fugido ao fado político não deixaremos de sublinhar com certo espanto que os indígenas evitaram sempre o exílio para terras longínquas do Leste, trocando a ideologia, o marxismo e o leninismo pelo conforto das Américas, pela doce França, pelas civilizadíssima Inglaterra.

O Marxismo nunca foi o forte dos nossos esquerdistas para viver, antes o foi para escrever e pensar.

A prática, o dia-a-dia, a civilização quiseram-na sempre menos à esquerda e mais ao conforto, menos ao sacrifício e ao bolchevismo e mais ao elitismo e cultura.

As sociedades capitalistas seduzem não só os detentores do capital mas todos os que vivem da sua estrutura, do conforto renovado na sua imaginação de cada dia.

Jorge de Sena não será o último Português a repartir-se com a estranha terra do exílio. Pelo mundo, morrem todos os dias, homens ignorados que aqui nasceram e que longe foram buscar com que viver.

A alma portuguesa, corpo e alma portuguesa, pelo mundo em pedaços repartida.

FEDERAÇÃO IBÉRICA

Os vende pátrias que vieram à Praça ultimamente com a ideia estafada da velha Federação Ibérica.

Fundamentalmente desejam tudo menos que lhes metam o cachaço na canga e os obriguem a trabalhar. Ligá-los a Espanha seria criar mais uns anos de confusão, obrigando assim a que os madraços se esquivassem legitimamente ao trabalho em nome das ideias.

Sem necessidade de recorrer a grandes filosofias basta pensar em países como o Luxemburgo, o Mónaco e a Suíça que, esquecendo as suas dimensões reduzidas, se deitaram arduamente ao trabalho, sacrificando-se diariamente para melhorarem, cumprindo exaustivamente programas pré-estabelecidos.

Nada de penínsulas de malandros.

É sempre preferível um país pequeno, governado por gente séria e trabalho digno.

O lugar da gente desonesta não é no palácio do Governo mas nas celas da penitenciária. Só a partir daqui é possível recomeçar Portugal.

Deixámos vender impunemente as províncias ultramarinas, não deixaremos vender a terra que é nosso berço há 800 anos.

REGIONALIZAR O QUÊ?

Na falta de outros assuntos mais urgentes os nossos políticos gastam energias delineando a regionalização que cada cabeça vai sentenciando.

Na verdade, Portugal é um país demasiado pequeno, do tamanho de uma província francesa e com tantos habitantes como a região de Paris. Por outro lado somos um país de semi-analfabetos, impreparado, com uma classe política muitas vezes hesitante e arriscamo-nos a provocar mais uma série de abortos políticos caríssimos e ineficazes.

Regionalizar desta maneira é em si mesmo negativo, superficial e autêntica obra de fachada.

Não é possível regionalizar se os serviços forem inexistentes, inoperantes ou desarticulados e parece-me paradoxal julgar um êxito a instalação Regional quando a instalação Nacional desses serviços falhou apesar de todas as condições para triunfar. E falhará sempre que enquanto o nível sócio-económico das populações que se pretendem regionalizar continue num atraso e numa impreparação indigna em comparação com os outros países da Europa.

No meu entender a regionalização feita sem uma profunda pedagogia e sem uma revolução escolar não tem vantagem política e perder tempo agora com o sexo dos anjos é demasiado perigoso para um país velho de quase dez séculos.

DESEMPREGO

Por todo lado se fala de desemprego e na impossibilidade de inverter esta tendência, contando-se milhões e milhões o número de desempregados na Europa.

Os economistas e os Governos servem-se já do desemprego como destabilizador dos preços e da inflação.

Um bom lote de desempregados é uma garantia para determinados sistemas.

Há tempos esteve em Lisboa um teórico destes assuntos que previa a hipótese de estabilizar o mercado de emprego expulsando os emigrantes, recorrendo ao subemprego ou proibindo a mulher trabalhar.

As soluções parecem-me tristes e indignas de um teórico sério destas questões fundamentais para o sossego da humanidade.

Será que a nossa civilização, dita cristã e ocidental, não será capaz de resolver esta questão dando a todos a possibilidade de ganhar decente e legitimamente o pão nosso de cada dia?

Parece que sim. Uma das medidas que poderiam alargar substancialmente a procura em relação à oferta no mundo do trabalho era deixar que os horários ficassem ao critério da entidade patronal a qual se limitaria a estabelecer uma escala de remunerações adequadas conforme o trabalho fosse diurno ou nocturno, mais fácil com mais difícil.

Para outro lado, não seria necessário a criação de taxas especiais para o maior volume das transacções verificadas, as quais já estariam cobertas pelo imposto existente sobre as vendas.

Parece-me que tal sistema traria todas as vantagens incluindo a de um melhor serviço público que teria outra capacidade de abordagem aos bens de consumo e aos serviços.

Para o caso de Portugal bastaria aumentar em um quinto a capacidade de emprego para que fossem absorvidos todos os desempregados e a procura passasse a ser superior à oferta.

Este processo traria ainda o benefício de evitar novos recrutamentos para a Função Pública, empregando ao mesmo tempo os excedentes, que nela vegetam, de modo eficiente e a bem da Nação.

O EXAGERO DAS TAXAS DE JURO

As dificuldades que se levantam a toda a hora ao empresário português no dia a dia da sua empresa, levam-no a comparar uma vida activa com a tranquilidade de poder colocar no banco o dinheiro que tiver disponível deixando de ser empresário para se tornar capitalista.

Até agora, o capitalista, entregava ao Banco o seu capital que o empresário ia buscar para o transformar em trabalho e produção.

Ou exagero das taxas de juro, que se pagam e que se recebem, acabam por fazer terminar na banca o círculo de dinheiro todo ele convertido em depósitos impossíveis de transferir para o investimento, para o trabalho e para a produção.

Embora se diga que não, este processo leva à estatização de todos os sectores e à sociedade colectivista comunista.

Reanimar as empresas portuguesas privadas, assegurando-lhes o financiamento em boas condições, proporcionando-lhe que defendam o dinheiro emprestado é, a par do recurso à imaginação e ao dinamismo do empresário português, a solução que propomos, profundamente de desenvolvimentista, longe da política actualmente seguida de parar para pagar.

É necessário e urgente lutar a sério pela modernização da Cultura, pela exploração do subsolo, pelo fomento das Pescas os quais são os verdadeiros processos de criar prosperidade no País, de pagar as dívidas e melhorar o nível de vida.

Apertar o cinto é o conselho de quem não sabe dar conselhos e utilizar a imaginação e o trabalho para criar riqueza.

AS PEQUENAS E MÉDIAS EMPRESAS SUSTENTAM ESTE PAÍS

Tenho-me dado conta que uma inusitada azáfama faz correr os cobradores de impostos em direcção às pequenas e médias empresas e aos pequenos e médios comerciantes.

Que vem a ser visto? Os senhores fiscais das Finanças deixaram de acreditar na honestidade dos pequenos industriais e comerciantes ou pretendem sugar todo o sangue a quem trabalha de manhã à noite para endireitar a vida e não se envergonhar de ser português em Portugal?

Mal vai o Governo se à custa de quem trabalha continua a subsidiar a preguiça, a incompetência e um subemprego em lugares estatais onde muito se fala e pouco ou nada se produz.

Não é amedrontando, empatando e vasculhando escritas e mais escritas que o Governo arranjará os milhões de que necessita para manter algumas instituições nacionais, que por desnecessárias, são um crime de lesa-pátria.

Quando nos lembramos que o nosso Exército gasta um mínimo de 41 milhões de contos, que continuamos todos os anos a alistar, sem qualquer justificação plausível para o facto, milhares de mancebos que contrariados vão gastar uma boa parte destes 41 milhões de contos, perguntamo-nos espantados se não seria melhor fazer intensivas campanhas de esclarecimento sobre pagamentos de impostos, livros fiscais etc. etc.. Do que enviar batalhões de fiscalizadores à procura de arrancar o forro do casaco ao pequeno e médio comerciante, ao pequeno e médio industrial para pagar uma tropa que devia ser urgentemente reduzida, racionalizada e criando um corpo de elite com 4 ou 5 mil homens num máximo e não 50.000 que nos custam os olhos da cara e que obrigam os cobradores de impostos a correr de um lado para outro à procura de lançamentos mal feitos ou de erros que a lei não permite.

Exigir o corpo e a alma às pequenas e médias empresas é o mesmo que dizer que este país já não existe ou então que tudo isto está seguro por arames e que ao menor vendaval tudo ruirá como um baralho de cartas.

A FRAGILIDADE DO SER HUMANO

O instinto animalesco que enferma o homem faz dele um ser perigoso e de actos imprevisíveis.

Hoje um santo, amanhã um assassino caso sinta que está ser perseguido injustamente e o seu grau de saturação tenha atingido os limites a que ele se impôs como padrão de dignidade e de personalidade. E a este santo, a este louco ou a este assassino ninguém escapa pois que ele fica indiferente às consequências e às vozes dos que o cercam.

Veja-se o que aconteceu na América:

Ronald Reagen, Presidente dos Estados Unidos e o Homem mais poderoso do Mundo, o mais bem guardado e o mais bem vigiado não morre por um acaso, por um golpe de sorte, o que vem inequivocamente demonstrar que se isto aconteceu com este homem que manda no mundo, que dá ordens ao mundo e que basta carregar num botão para fazer desaparecer este mundo, quantas vezes, infinitas vezes mais, não seremos nós vulneráveis perante os escolhos e os perigos que nos rodeiam todos os dias?

Que meditem na fragilidade do ser humano todos aqueles que passam a vida a arranjar questiúnculas, e intrigas e a fazer perder o tempo e a paciência a quem trabalha.

Até os santos se tornam assassinos. E quem acreditar que é assim não é, muito pouco conhece do género humano.

VALERÁ A PENA PERMANECER NESTE MUNDO?

Por incrível que pareça gastam-se no mundo cem mil contos por minuto a fabricar armas e munições cuja única utilidade é matar.

O ser humano conhecem criteriosamente e concretamente o caminho do bem, sabe como deve proceder em relação ao seu semelhante, sabe perfeita- mente que lhe é vedado atentar contra a vida do próximo e no entanto, por um gigantesco acto de loucura gasta diariamente uma fabulosa fortuna para poder matar os seus vizinhos. Isto é, os outros seres humanos seus companheiros na Terra, seus amigos, seus iguais.

Como se justifica que o homem se tenha transformado num única animal capaz de matar por prazer?

E afinal porquê e para quê centralizamos a nossa vida no desejo incontido de matar? Apenas por razões económicas, apenas pela ânsia de possuir mais do que os outros.

Atravessámos já uma fase em que o homem matava por razões religiosas, a seguir o homem matou por razões ideológicas e políticas, agora mata por uns palmos de terra, pelo domínio dos mares ou pelo domínio do ouro, da prata, dos cereais, dos frutos, das árvores que Deus pôs na terra para todos, com bondade e amor.

Vão longe as palavras de Cristo do “Amai-vos uns aos outros”.

Já ninguém sabe o que é a fraternidade.

A juntar às armas que se fabricam todos os dias veio a droga, o álcool, a loucura, o crime, a insegurança nas ruas, o terrorismo, o rapto.

Valerá a pena permanecer neste mundo?

Na verdade não vale. Depois apetece fazer o gesto banal de quem abandona o eléctrico e dizer calmamente:

É favor pararem o mundo que eu quero sair!

A LOUCURA EM QUE VIVEMOS

Ocupamos por inteiro o nosso tempo produzindo para ganhar dinheiro, para comprar e gastar o produzimos.

O homem deixou de pensar no homem porque pensa exclusivamente na produção rápida de objectos que vão desde as bombas atómicas aos detergentes e aos produtos de beleza.

De repente chegamos à conclusão que muita da nossa produção é um autêntico crime social e ecológico.

Ser meditássemos pouco nem precisaríamos de renunciar totalmente à técnica e ao progresso, nem precisaríamos de continuar a desesperada agressão à Natureza que se verifica nos nossos dias.

O aviso é sério e urgente. Ou a arrepiamos caminho ou a humanidade tem à vista um fim catastrófico e inglório.

A recente guerra no Golfo foi um acto de loucura colectiva em que vale pena meditar.

É culpa nem foi de Bush, nem de Saddam.

A culpa é da humanidade que se perde numa crise de loucura que nada tem de útil nem de belo, e levará, inevitavelmente, à destruição total da vida sobre a terra.

VIVEMOS NUM MUNDO PROFUNDAMENTE DESIGUAL

Em todos os países do mundo passa hoje uma onda desumanizante que obriga as pessoas a fecharem-se em si mesmas e a cair num isolamento voluntário.

É a solidão das multidões.

É o isolamento.

O caminho para a tristeza, para a angústia, para a agressividade.

Em tais condições e por muito que se deseje não é possível viver feliz.

Não é possível transmitir aos outros essa felicidade, nem na vida particular nem no exercício da profissão.

Paralelamente à acção escolar que, melhor ou pior, todos os Governos desenvolvem torna-se urgente que todos os povos do mundo se empenhem numa campanha de humanização dando à vida outra dimensão e privilegiando o entendimento social, combatendo a agressividade e possibilitando a boa disposição.

Esta ideia que em princípio parece destituída de viabilidade prática é bem um ponto fulcral para construirmos uma vida melhor, para podermos ter uma actividade profissional mais atraente e simpática o que equivale a dizer para trabalharmos de melhor vontade e produzirmos mais.

O mundo vai transformar-se radicalmente nos próximos dez anos. Todos temos que nos especializar numa actividade.

Os salários crescerão e desaparecerá da Terra o fantasma da miséria.

É claro que falamos assim para a Europa, parte das Américas, parte da Oceânia e provavelmente para uma pequena parte da Ásia.

Infelizmente, zonas sul americanas e africanas profundamente deprimidas continuarão ainda durante séculos no atraso vergonhoso em que se morre de fome ou se sucumbe a doenças que o ao mundo civilizado debelou por completo há dezenas de anos.

É preciso não esquecer que nas 14 mil ilhas da Indonésia há ainda tribos em plena Idade da Pedra.

O mundo profundamente desigual levará séculos a atingir uma normalidade relativa e abrangente de toda a humanidade.

Provavelmente nunca o conseguirá.

Apesar de tudo o que fica dito e sobretudo do péssimo que se demonstra em relação à Portugal é bom lembrar que o nosso país está em vigésimo quarto lugar na lista dos países mais desenvolvidos, podendo, graças à CEE, até ao fim do século baixar da vigésima posição.

No se pode dizer que tenhamos um futuro cor-de-rosa, mas também é exagero pintá-lo de negro.

Queira Deus que o esforço necessário no campo da Educação seja atempado e em qualidade de modo que responda às nossas necessidades e imperativos.

Tudo depende do saber e do espírito empreendedor dos que forem escolhidos para por diante esta importante e o urgente missão.

O APARTHEID EXISTE

Se quisermos pensar sem fanatismo e de espírito lúcido sobre o que é o apartheid compreenderemos imediatamente que ele existe em todas as sociedades.

Proponho pois, aos prezados leitores, que pensem durante alguns minutos, na imensa diferença que existe em Portugal entre ricos, remediados e pobres cujo convívio não se faz a nenhum nível.

Senão vejamos:

Enquanto os ricos têm os seus transportes particulares, os pobres têm os colectivos ou andam a pé.

Enquanto os ricos têm as suas clínicas particulares, os pobres morrem à espera da consulta na Caixa.

Enquanto os ricos frequentam colégios de luxo, os pobres consolam-se com o a, é, e, i, o, u da Escola camarária.

É claro que, apesar de tudo isto, nós vivemos em perfeita e fraternal democracia enquanto o apartheid sul-africano, que não é mais do que uma técnica de convívio, torna possível organizar e fazer progredir, devidamente, as diversas etnias.

Deste modo e apesar das críticas atiradas contra o regime sul-africano ninguém, até hoje, conseguiu em África, nada que se pareça em prol das comunidades negras.

Tenhamos a coragem de pensar que só um nivelamento sócio-cultural poderá trazer um dia à África do sul a plena integração racial feita com coerência e defendendo os interesses de todos porque todos terão um dia iguais possibilidades e capacidades.

O ATAQUE DOS CREDORES

O gravíssimo erro que as super potências estão a cometer em relação ao Brasil leva-nos alertar todos os gananciosos dos perigos da sua cupidez.

Há que saber esperar e tudo será pago.

Os Estados Unidos e todos os capitalistas que, impensadamente, puxam a corda do desesperado devedor ou estão cegos ou estão loucos. Eles estão a cavar a sua própria destruição por terem querido fazer negócios fáceis com quem tinha de aceitar todas as condições impostas.

A dívida dos países da América Latina rondará os 300 biliões de dólares. A fatia do Brasil é muito grande, mas todos sabemos que o Brasil é o país do futuro onde com o tempo e algum trabalho o ser humano viverá cada vez mais feliz a ajuizar pela conjugação harmoniosa de credos e raças que aí pontifica, onde o amor é mais forte do que dinheiro.

A grande diferença entre o Brasil e as outras nações está aqui: no amor, na alegrias de viver, no prazer de estar no mundo e na certeza de que só se vive uma vez.

Tenho a certeza que no juízo final os únicos que terão direita Prémio serão os de expressão portuguesa e, dentre esses, os brasileiros ocuparão o primeiro lugar.

Hoje as guerras não são tanto químicas ou atómicas, mas sim, ideológicas e houve países que já o entenderam. Será que os Estados Unidos compreenderam o aviso ou insistem em tocar a finados quando o Brasil der o último suspiro e arrastar consigo todos aqueles cuja avareza e inconsciência foi muito superior do que a sua sensatez?

NOBRE DA COSTA VERSUS AMARO DA DITA

Em 7 de Setembro de 1978 na Assembleia da República portuguesa começou um desafio insólito e histórico. A última geração de políticos recuava perante a primeira invasão dos tecnocratas organizados em Governo.

As bancadas assistem perplexas à invasão do poder pela alma técnica e toda poderosa.

O exército invasor, chefiado por um arquitécnico traz na bagagem o sheltox que apagará de vez o zumbido da oratória política que herdámos do século XIX.

Seja quem for o vencido, importa sobretudo salientar que está lançada uma nova sorte no último Parlamento tradicional da Europa.

Amaro da Costa é politicamente um mundo que foi, Nova da Costa, é um mundo que será.

As duas centenas e meia de políticos improvisados que deixaram por alguns meses as oficinas de trabalho vergam de espanto com o golpe destes gestores de profissão que governam pelo computador.

O país, ou melhor, os países que despiram há muito a nevrose religiosa largam agora a psicose política para se organizarem numa empresa gigantesca inexoravelmente organizada na prática do possível e do desejável.

Amaro da Costa, Jaime Gama, Menéres Pimentel e outros foram ao ataque, atirando contra um inimigo em cuja vulnerabilidade não acreditam.

O humanismo teórico, o populismo, é grandiloquência lamechas abatem-se nas teclas da máquina dos outros que respondem por números, calculam matematicamente as adições, as multiplicações e as divisões.

O novo capítulo da filosofia política chama-se matemática, chama-se, se quiserem, matemática política. É possível, por agora, que Nobre da Costa não fique no Governo. Mas temos a certeza, é fatal que os arquitécnicos voltarão a impor-se e a comandar este processo.

Pode mesmo dar-se o caso, de perante a resistência e a teimosia da arqueopolítica de bancada, o Poder passe subtilmente cá para fora, para as salas ministrialonas dos imensos conselhos de administração. Depois é só assistir à desvalorização gradual e ao desinteresse sistemático das grandes crises políticas.

Já se vive sem o Governo meses a fio. Poderá vir a viver-se sem Governo anos a fio...

A CRISE

Ao contrário do que muita gente pensa, a crise que afecta Portugal ultrapassa uma mera crise económica e é bem mais grave.

De uma crise económica consegue-se sair mais dia menos dia, bastando para tanto ensaiar uma nova forma de produção, reactivar o trabalho, fortalecer a moeda, reanimar a agricultura, isto é, aplicar ao mal uma dessas curas que se usam universalmente.

Infelizmente o caso de Portugal é bem mais grave, a crise, mais do que económica é um caso aflitivo de moralidade e consciência.

É a geração que nos governa está em crise profunda.

Ninguém acredita em ninguém.

Ninguém é capaz de colocar os interesses de todos nos lugares dos seus próprios interesses.

O que se passou com a Aliança Democrática é na verdade um autêntico caso incompreensível, política e socialmente.

Como é que uma a Aliança composta por partidos ideologicamente próximos, por homens que se conheciam e se respeitavam, dominando todos os mecanismos da governação e da economia, como é possível que se auto desagregue acabando por desavenças no grupo dirigente, os quais mostram um desprezo total pelo interesse do país e pelo futuro de Portugal.

Nas mãos de gente desta qualidade o país está morto e pior do que no tempo dos Filipes.

No mundo dos nossos dias pode-se encarar perfeitamente a dissolução de uma Pátria por incompetência de governantes.

A história está cheia de impérios de que hoje só existe a memória e que, por uma razão ou por outra foram varridos do mapa.

Será esta é vontade dos portugueses no final do século XX?

PORTUGAL PERDEU O POLÍTICO QUE MAIS LONGE APONTAVA O FUTURO

Com Adelino Amaro da Costa morre a última esperança de traduzir democracia em Portugal por felicidade, por boa disposição, por grandeza de alma e por amor ao próximo.

Mais que um grande político era um homem com a altíssima noção do que é estar no mundo e servir os outros.

Não foi só o CDS, nem a AD a perder com a sua morte. Portugal perdeu o político que mais longe apontava no futuro.

Pessoalmente e para lá de todo o seu talento foi um grande amigo que perdemos, daqueles que marcam uma época da nossa vida e do qual nos lembraremos todos os dias como se estivesse vivo e continuasse ao nosso lado.

O HOMEM MAIS INTELIGENTE E O MAIS GENEROSO QUE ATÉ HOJE CONHECI

Fazia 39 anos no dia 18 de Abril o meu amigo Adelino Amaro da Costa, provavelmente o homem mais inteligente e o mais generoso que até hoje conheci.

Amaro da Costa era, em toda a sua humildade, um Homem superior ao serviço do seu semelhante.

Amaro da Costa disse um dia que a missão do seu partido era educar a direita de Portugal. E ele era um privilegiado para exercer essa delicadíssima missão, não só da direita, mas do povo português.

Inteligente, honestíssimo nos seus processos, infinitamente paciente, como se o tempo para ele nada representasse, Amaro da Costa, deixou a recordação de uma obra fabulosa que o destino quis adiar.

Há dias, um jornalista chamava-lhe a fada da Sá Carneiro pela sua capacidade de dialogar e de o conduzir para o melhor.

Amaro da Costa seria verdadeiramente a fada deste País se a sorte não o tem desacompanhado tão tragicamente.

Naturalmente, homens desta natureza são pouc acessíveis, distantes, maus de humor, difíceis de trato.

Adelino Amaro da Costa era, neste aspecto, um esbanjador de simpatia.

Actor talentoso, homem de mil ofícios, impressionante no seu poder de comunicação e na sua afabilidade, conseguia tudo isto convictamente, distinguindo cada amigo, cada situação e cada caso.

Recordá-lo com saudade é saber que o exemplo deste homem nos acompanhará para sempre num saudável saudosismo de continuar a usufruír da mensagem inesgotável que foi a sua vida.

Adelino já não é um homem do poder, já não é um homem poderoso, consola-nos porém, infinitamente mais falar dele e para ele agora, quando tudo o que passou continua a ser, não uma recordação simples, mas a esperança de melhores dias pelos quais lutava entusiasticamente quando a morte lhe armou uma cilada.

O e espírito de Adelino Amaro da Costa continua vivo e presente na recordação da sua amizade e na esperança da sua esperança porque há homens que não morrem, já que os vivos se encarregam, por necessidade e devoção, de os deixar a seu lado eternamente.

SÁ CARNEIRO

Snu Abecasis morreu por amor ao lado de Sá Carneiro que não a sacrificou nem ao poder, nem à popularidade, nem ao dever, nem à família, nem à Igreja.

De mãos dadas, enfrentando tempestades, Sá Carneiro e Snu Abecasis ficaram cada vez mais serenos no Centro deste pequeno mundo como se soubessem que lhes valia a pena viverem assim e que seriam, só deles, as últimas e poucas horas que lhes restavam.

Foi só a luz dos olhos de Snu Abecasis e de Sá Carneiro que confundiram as leis, as convenções, as tradições ou teria sido a força do carismático estadista que fez ajoelhar a vetustíssima dura e intransigente Igreja Católica Romana?

Não há Concílios que possam destruir o amor entre um Homem e uma Mulher.

Louvamos Snu que amou Francisco e com ele morreu, decretando, de novo, a lei da ternura para que ela possa vigorar entre os homens até consumação dos séculos.

Que repousem em paz, juntos, frente-a-frente para que no fim do mundo continuem o idílio agora interrompido.

QUANTO VALE UMA MULHER

Devido ao afluxo inesperado de centenas de cartas sobre questões femininas, a nossa colaboradora Inês Castro pediu-me uma opinião sobre a condição da mulher.

Para analisar das capacidades da mulher e da sua maior ou mesmo menor capacidade em relação ao homem, teremos de lhe dar as mesmas condições de vida quer no campo profissional, quer nos aspectos sexuais, familiares e culturais. Isto, acompanhado naturalmente por escolas mistas e iguais oportunidades em todos os domínios da vida.

Criadas e aplicadas estas condições, a mulher estará livre dos efeitos ancestrais que a têm reduzido a simples objecto, desde que o Mundo é Mundo. A partir destas premissas poderemos então observar a maior ou menor semelhança entre os sexos. Embora partamos de uma certeza, como o demonstrarei no meu livro “a Libertação da Mulher”.

A mulher é mais capaz, mais forte e mais intuitiva do que o homem. Porque não aproveita estas qualidades, isso é muito difícil de entender.

Mas voltemos à análise que fazíamos.

Nas condições de igualdade total, estou convencido que na vida humana deixará de existir o crime e a paixão, transformando-se os homens e as mulheres numa sociedade perfeita onde cada um terá o suficiente e as grandes emoções deixarão de existir.

Embora pense que é de toda a justiça reconhecer o valor da mulher e que é urgente restituir a dignidade que sempre lhe foi negada, mesmo assim não posso deixar de confessar que para mim e estou convencido que para 99 por cento dos homens foi sempre mais cómodo esta subserviência feminina. Por mim adorei ter vivido esta minha época onde os grandes dramas alternam com as grandes comédias, onde é possível passar da desgraça à fartura e onde a vida é comandada por essa incógnita maravilhosa que se chama esperança.

Isto não é mais possível. A mulher vale o que vale o homem. O comando do Mundo pertence-lhe por alternância e é provavelmente a vida que nos espera a partir do século XXI. Pena é que eu já não possa saborear esse prazer e confirmar que finalmente o ser humano se humanizou.

OS PORTUGUESES CONTINUAM AGARRADOS ÀS CALÇAS DO PRIMEIRO-MINISTRO

Neste país subsidiado e à beira mar plantado, havia um ditado que dizia “quem não arrisca não petisca.” Agora não, ninguém quer arriscar e todos querem petiscar.

Ainda há tempos ouvi na rádio um artista da nossa praça dizer que não cantava porque o Estado não lhe dava condições. Esta é forte! Não lhe dava condições? Então quem é que lhe punha a mão na boca?

Na CEE para onde entrámos complexados e cabisbaixos ninguém vai ter pena de nós e ou nos tornamos gente ou... estamos mal.

Lá fora as pessoas andam para a frente, arriscam, assumem-se. Aqui pedem-se subsídios.

Os portugueses têm de se convencer de uma vez por todas, e tem de ser quanto mais depressa melhor, que o Estado patrão acabou. Antigamente é que o Ti António resolvia tudo, e àqueles que não resolvia deixava-os emigrar.

Enfim, perdemos um tempo inestimável e deixámos sair o sangue mais jovem que aqui possuíamos.

A Europa desenvolveu-se e vive bem porque o Estado deu voz às pessoas.

Portugal continua desesperadamente agarrado às calças do Primeiro-Ministro enquanto este tenta emancipar um povo que ama e a quem tem dado o melhor da sua inteligência.

Já passaram quinze anos depois do 25 de Abril. Para muitos foi um trauma muito grande. Compreende-se e aceita-se, mas não podemos andar eternamente a chorar e lamentar o que é irreversível.

É necessário mostrar de novo ao mundo que a inteligência portuguesa continua a servir de fermento para os povos do todo mundo tal como foi nos séculos XIV, XV, XVI.

No perdemos qualidade, estivemos só a retemperar forças.

CAVACO, CADILHE E BELEZA OS BOMBOS DA FESTA

Insatisfação constante, um masoquismo exacerbado e um choradinho a tresandar a ranço fazem dos portugueses o povo mais rezingão de toda a Europa.

Latinos, aventureiros, improvisadores e profissionais nunca ninguém conseguiu obrigar esta gente a ser governada com cabeça, com regularidade, com técnicas de gesto tal como pretende Cavaco Silva acolitado por Leonor Beleza e pelo bombardeadíssimo Cadilhe, que tem sido enxovalhado com o que de mais abjecto tem saído da cabecinha de muitos plumitivos que desta maneira que vêem assegurado o ordenado ao fim do mês.

Na verdade, a vida que espartano Cavaco e o imperturbável Cadilhe têm tentado impor para a salvação do País sofre as mais variadas contestações e vem dos quadrantes mais diversos.

O português não aceita esta vida de apertos porque, acha ele, nunca precisou de guia de marcha para ir à Índia, nem planeou Aljubarrota para chutar os espanhóis por todas as fronteiras.

Napoleão foi também vítima do nosso improviso e tudo isto sem abdicar do fado, do vinho tinto e de meio Bairro Alto que é todo este país.

Quando as coisas correm mal à direita, fazemos uma revolução e as coisas começam a correr mal à esquerda. Se as coisas correm mal à esquerda faz-se uma revolução de sinal contrário o que permite pelo menos quatro anos de festas, de manifestações, de greves, de discursos, de intentonas e de inventonas... Trabalhar é que não. Governar é que não.

Cavaco Silva, que não é para graças, acha que esta bagunça já chega, que Portugal já está mais adulto e resolveu governar seguindo os parâmetros europeus.

Bem podem os portugueses dar por paus e por pedras. Cavaco não está com meias-medidas: para os contestatários mais avarentos pôs-lhes o Ministro Cadilho à perna e para aqueles que se armam em carapaus de corrida deu-lhes a Ministra Leonor Beleza para lhes tratar da saúde.

Até que enfim, aparece alguém que conhece os portugueses.

Continuar a improvisar num mundo onde os profissionais são cada vez mais profissionais é preparar o suicídio colectiva e isso Cavaco nunca o permitirá, doa a quem doer.

O GOVERNANTE NÃO PODE TER MEDO DE ERRAR

Governar um país pequeno e maneirinho como Portugal só não é viável a homens receosos da crítica, do diz-se e das graçolas de mau gosto.

O governante no pode ter receio de errar. As suas atitudes e as suas decisões são sempre susceptíveis de rectificação. Aquilo que ele não pode fazer é hesitar, protelar e nada fazer.

Portugal é um país tão governável como a Suíça, a Holanda ou a Suécia, é necessário simplesmente o querer e a determinação dos seres que nele habitam para o desenvolver e criar o bem-estar porque todos os portugueses anseiam.

Para realizar a transformação rápida, eficiente e correcta deste País é urgente que o seu colectivo se transforme na verdadeira extensão do homem pensante e inteligente, é necessário também que o homem se sirva da colectividade na medida em que vai servir-se de mais cabeças e mais braços.

O colectivo é um crescer de forças, por tal motivo é premente que os homens e mulheres que compõem a sociedade portuguesa colaborem não só com o Governo central, mas com as Autarquias locais onde vivam.

Pertençam as Autarquias locais ao Partido que pertencerem é dever de todo o cidadão prestar-lhes a ajuda na realização dos objectivos que os autarcas: Presidentes de Câmara, Presidentes de Juntas de Freguesia e vereadores se propuseram.

É urgente que o homem acaba de uma vez para sempre com ou egoísmo feroz, com a sua auto-suficiência improdutiva para se realizar no colectivo de uma aldeia, de uma vila, de uma cidade, em suma: de Portugal.

POLÍTICA O QUE É?

Costuma dizer-se que os portugueses estão desencantados da política e que não participam, não se interessam, não se dignam sequer criticar ou elogiar o que está mal ou está bem.

Por isso mesmo há quem pense, e com toda a razão, que isto pode passar pelo salvador nacional que traz a tiracolo a saca dos remédios miraculosos.

Contudo, o que nos parece importante é inaugurar uma nova metodologia que possa abrir uma porta como deve ser à metodologia política e à resolução dos problemas que interessam a todos.

Os candidatos que nós hoje elegemos morrem no fim da campanha eleitoral...

O povo deita um voto e sofre até à próxima campanha.

Na verdade, a evolução social das últimas décadas é de tal modo a anémica que se nota a incompetência dos políticos.

Nós não sabemos o que faz falta, nós não sabemos quem faz falta.

A política deixou de ser uma administração próxima de coisas muito concretas e passou a ser uma ciência acessível só a alguns.

Hoje, a cada passo, ouve-se dizer “eu não percebo nada de política”, como quem diz eu não percebo nada de matemática ou de química, esquecendo que a política a o preço da água e da luz, do litro do leite, da carne, do peixe, do pão.

Não perceber nada de política é não perceber nada da vida e disso, enquanto andarmos neste mundo, não nos resta outro remédio se não perceber o mais possível.

O PAÍS REAL E O PAÍS POLÍTICO

Incapazes de gerir um país, acabamos por arranjar dois: o País real e o País político.

Convém saber para que cada um se situe e actue, o que vem ser o País real, com quem conta, o que faz.

O que é o país político, com alinha, para que lado joga.

Primeiro, o real:

Sem receio de desmentido parece não oferecer dúvidas que este é o País que emigra, que trabalha, que sofre. É o país dos pagadores de salários, é o País dos criadores de riqueza. É o país dos lavradores e de todos os que fazem dia-a-dia o dinheiro com que se pagam e com que pagam os outros.

O País real é o que inventa de comer todos os dias, é o País que não sente domingos nem feriados, é ou País de sempre, é o País da dignidade e do trabalho, é o país da história.

Ou Portugal político, é a ignorância política, é a malfeitoria política que são neste País sinónimos preclaros.

Ou Portugal político chupa o suor do rosto do seu semelhante, bebe-lhe o sangue, mas tira-lhe a carne.

O Portugal político importa lá de fora todos os mercantilismos possíveis e o whisky possível transformando a esquerda portuguesa numa resultante de aguardente da Escócia.

O País político é o filho que não trabalha, que dissipa a fortuna, que exige automóvel, que bate no pai, que comunga a droga e cai, todos os dias, num novo ou farrapo social. O país político é o delinquente mongolóide, infantilmente agressivo e perigoso.

De um dia para outro o País político volta à Cruz Vermelha de Caxias e ao sanatório de Peniche. É que a liberdade não dispensa mastigação. E... fidalguia sem comedoria é gaita que não assobia.

UMA ASSEMBLEIA À SÉCULO XIX

A Assembleia da República onde se misturam e se chocam quatro paladares de socialismo continua a ser um órgão anémico e sem poder de resposta a um país que necessita urgentemente de vitalidade, de inteligência e de leis reguladores de trabalho de maneira que os vadios e os desempregados à força possam e devam contribuir para o bem estar nacional.

Na verdade, a Assembleia da República não tem sido mais do que o espelho do País onde tudo continua desorganizado, destruído, vilipendiado e escarnecido. É uma assembleia com todos os defeitos do século passado e que teima injustificadamente a mantê-los.

Ainda há poucos dias a Assembleia da República perdeu uma tarde inteira, o que representa centenas de contos gastos, para discutir se um programa da TV, e escritor por um pseudo historiador e produzido por um realizador com tantos escrúpulos como o primeiro, devia ou não devia ter sido exibido.

Em qualquer país civilizado os inquéritos, as culpas e os castigos se os houvesse estariam cometidos à administração da televisão. Isto seria motivo para encerrar o incidente e continuar o trabalho, que esse sim é preciso desenvolver e melhorar todos os dias.

E assim quando tudo pensava que se começasse a dar aos actos a importância que eles têm, resolvem os deputados arengar durante cinco horas sobre as aventuras e desventuras do “historiador” César para saber se valia a pena queimar o homem.

Houve mesmo quem levantando a mão tremente se pusesse em guarda contra a guerra santa.

E o país continua sem uma regulamentação de Saúde, sem uma regulamentação de ensino, sem circuitos alimentares, sem leis que intensifiquem a pesca, sem alcatrão que dignifique as estradas.

É urgente que a Assembleia da República se transforme num centro respeitável de decisões rápidas, modernas e úteis. O País que a elegeu e a paga não pode esperar outra coisa.

QUANDO PORTUGAL ERA UM IMPÉRIO

Quando Portugal era um império tínhamos sete ministros, Três secretários de Estado e cerca de 100 deputados.

Era praticamente esta a classe política que tínhamos que pagar porque a nível de Câmaras Municipais trabalhava-se por carolice e amor à terra.

O povo pagava, é certo, o clã político que não vivia mal, simplesmente eram poucos. Hoje que estamos reduzidos ao Portugal da Europa, Açores e Madeira, a classe política aumentou de um para 1000 e esse aumento correspondeu a uma gula indisfarçável referente ao orçamento do Estado que sai do bolso todos nós.

Um enxame inumerável de políticos, devora o cadáver de um País apertado de sanguessugas por todo lado.

Mas somos, pelo menos, mais bem governados?

A resposta ficará à escolha do leitor porque receamos que se formos nós próprios dá-la se pense tratar de um caso de sectarismo político.

Mas meditemos nestes números: os deputados passaram de 100 para 250 e as despesas com a Assembleia da República aumentaram 500 vezes.

A vantagem disso vale a diferença?

As Câmaras Municipais que, neste País, se contam por mais de três centenas, todas, para além de presidente, vereadores a tempo inteiro, bem pagos, bem comidos, bem bebidos e deslocando-se nos Mercedes lhes deixou o “fascismo” ou compram Mercedes novos à medida que termina a herança motorizada.

Apesar de tudo isto vemos que a governação é deficiente.

Resumindo e dizendo verdades desagradáveis:

É preciso acabar de uma vez para sempre com esta classe de marginais privilegiados a que vulgarmente chamados políticos.

AS ARMAS SÃO AS ESCOLAS, AS FÁBRICAS E AS MINAS

De 1910 a esta parte, Portugal vem sendo governado, a nível de presidência da República por militares.

Tirando o consulado de Salazar em que os militares Presidentes foram meras figuras decorativas, assistimos hoje à manutenção de um equívoco que coloca as Forças Armadas no topo da hierarquia político-social com garantia de paz interna e de independência nacional.

Se tais pressupostos tiveram outrora algum valimento estão hoje completamente ultrapassados, e um militar na presidência da República é um acto perfeitamente gratuito por variadíssimas razões.

Em primeiro lugar os militares actuais estão claramente impreparados para esse tipo de cargos.

Por outro lado, à Nação não interessa a via militar cuja utilidade e sentido são altamente discutíveis.

Podemos dizer, sem receio de desmentido, que um exército em países como Portugal não passa de um símbolo totalmente vazio de utilidade.

A época em que vivemos é demasiadamente sensível para se perder tempo com uma candidatura que não seja a de um homem inteligente e honesto que tenha dado provas como administrador e como financeiro.

Em Portugal haverá meia dúzia de nomes dos chamados generais da Indústria cujo perfil se coaduna perfeitamente com a presidência da nossa República e com as tarefas urgentes que se impõem ao povo português.

A independência de Portugal travar-se-á, nos próximos anos no campo do trabalho e da produção.

O Exército mudou de mãos e mudou táctica. As armas são as escolas, as fábricas, as estradas, e as minas.

Precisamos de um homem para governar que crie já um Portugal mais rico, mais próspero, mais justo

Precisamos de um homem para governar que transforma este País numa empresa bem organizada, bem gerida, bem rentável.

No vale a pena distribuir miséria.

Nem as G3, nem as paradas militares, resolvem seja o for.

AO SABOR DO ACASO

Segundo estatísticas recentemente publicadas, Portugal foi o país que no ano passado recebeu maior número de turistas.

Para aqueles que distraídos com o próprio umbigo não querem ver o que se passa à sua volta iremos dar alguma razões pelas quais os estrangeiros nos procuram e saboreiam sofregamente este Portugal que nós teimamos em não usufruir em proveito, dando jus ao ditado, “Dá Deus as nozes tem quem não tem dentes.”

Se pensarmos um pouco, o que para o português é um sacrifício tremendo, o português não gosta de pensar, a maior parte das vezes faz as coisas à toa, ao acaso, acreditando mais na intuição do que na razão e raramente se importando com as consequências. “Há-de ser o que Deus quiser” e com este grito de esperança e ao mesmo tempo de inconsciência aí temos Portugal feito à medida da nossa inconstância e a história recheada de grandezas e de misérias porque temos vivido, neste País de eleição, quase sempre ao sabor do acaso.

Mas deixemos as considerações anteriores e vamos ver porque razão os turistas, os industriais e os habitantes dos outros países nos procuram tão avidamente e se vão deixando ficar por aqui.

Vejamos as razões:

Portugal é o país da Europa com mais elevada temperatura média anual.

O preço da nossa moeda em comparação com a moeda dos outros países torna possível a aquisição de terrenos e de indústrias por montantes perfeita- mente ridículos.

Qualquer Casal de reformados da Europa Central e do Norte vive, em Portugal, dez vezes melhor do que no seu país.

O índice de criminalidade em Portugal é o mais baixo da Europa.

A legislação actual beneficia extraordinariamente o proprietário estrangeiro.

O povo português privilegia extraordinariamente a sua relação com a pessoa estrangeira.

Portugal é ao país menos industrializado e menos poluído da Europa.

Esta razões, que acabámos de mencionar, provam à evidência que este país que habitamos é um pequeno paraíso onde todos poderemos viver felizes se assim o desejarmos.

Os estrangeiros já nos descobriram. É tempo de nos descobrir a nós próprios.

É PROIBIDO FAZER INOVAÇÕES

As confederações dos comerciantes portugueses vêm muitas vezes à televisão pedir as mais diversas regalias e lamentar a crise profunda em que se encontram os pequenos e médios comerciantes.

Pelo que se passa no nosso país só nos admira que a crise não seja ainda maior em virtude dos usos e costumes obsoletos os que regem as nossas casas comerciais.

Por esse mundo fora os horários comerciais são totalmente livres o que leva os responsáveis pelo negócio que a adaptar-se aos melhores horários de acordo com o interesse dos clientes.

No mundo onde quase todos os adultos estão ocupados de segunda a sexta, das nove às seis da tarde, parece-me essencial que os horários funcionem a partir desta hora e aproveitando integralmente o Sábado e o Domingo.

Mas nada disto se observa em Portugal.

Os comerciantes vêem-se obrigados governamentalmente, a proceder como simples funcionários públicos que trabalham quando os trabalham e os obriga muitas vezes, a não cumprir cabalmente as suas obrigações para se abastecerem do essencial.

Mas nem só as lojas do comércio deviam ter em conta esta descentralização de horário. O mesmo devia acontecer com repartições de Finanças, Câmaras Municipais, serviços de Ministérios, serviços Médico-Sociais, dando assim a quem trabalha a possibilidade de beneficiar mais à-vontade dos serviços que, ao fim e ao cabo, vivem da sua bolsa.

Nunca é demais dizer isto é embora saibamos perfeitamente que neste País é proibido fazer inovações e melhoramentos.

Habituámo-nos a viver miseravelmente e mesmo que seja fácil parece que não nos interessa sair do atoleiro.

OS POVOS DE TODO O MUNDO APROVEITAM OS SEUS GÉNIOS

Enquanto por toda a parte o acesso às universidades depende de provas de aptidão e de mais nada, em Portugal é preciso determinado curriculum e determinada idade para aí se entrar.

Os povos de todo o mundo aproveitam os seus génios seja qual for a sua idade ou as circunstâncias em que os reconhecem.

Temos exemplo de crianças com dez anos que passaram todos os exames da Universidade ultrapassando assim todos os obstáculos e vendo-se cedo com a possibilidade de aproveitamento total das suas qualidades excepcionais.

Não foi Jesus ao templo embaraçar os doutores aos sete anos idade?

Se o filho de Deus tivesse tido o azar de nascer em Portugal não o tinham deixado entrar no Templo por falta de idade e se o miúdo teimasse tinha levado uma valentia sido sova.

Este é o país de anões em que vivemos onde as ideias de progresso e de renovação chegam com séculos de atraso devido à tacanhez, ao medo e à cegueira de um povo que vive mais da má-língua, da crítica e da inveja do que do trabalho útil e do reconhecimento do valor do ser humano tenha ele dez ou cem anos.

PORTUGAL ESTÁ DE FÉRIAS

Depois da guerra e para reconstruir o Japão e a Alemanha todo o cidadão, sem olhar a idades nem posições, aceitou trabalhar 14 horas por dia e dispensar-se de férias.

Esta política conseguiu reconstruir a Alemanha e o Japão em tempo recorde e transformá-los em potências mundiais, superiormente administradas, que ultrapassaram os países vencedores da guerra, eles que tinham sido os grandes vencidos.

Os portugueses amputados do Império Ultramarino sofreram um traumatismo mais violento do que a própria Alemanha e o Japão depois da guerra. Convinha-nos pois, organizar a restauração de Portugal, corajosamente, como se fosse uma acção pessoal de todos e de modo a que viéssemos a sofrer por pouco tempo e o menos possível.

Não é assim que acontece, infelizmente.

Fazemos greves, temos baixas constantes, trabalhamos pouco. Por este motivo o Governo vai-nos tirando sorrateiramente a carne, o peixe, o leite e o pão.

Muitos ministérios deste Governo não sabem como fazer produzir este país, não sabem como resolver a crise nem como criar motivação e capacidade trabalho num povo que só está à espera que os governantes os animem, os encoragem e lhes facultem os meios para fazer de Portugal o País próspero por que todos anseiam.

SITUAÇÃO DESESPERADA

Num

marcar artigo