Uma Nova Tarantella por Rui Lopes Graça
Por LUCINDA CANELAS
Sábado, 26 de Julho de 2003 Em palco, cada bailarino existe por si, isoladamente. Mesmo quando um par se encontra, os intérpretes parecem alheados um do outro. Uma mulher que foge de algo que não vê mas que pressente entra em diálogo com um dueto lânguido tomado pela angústia e o desespero. Quando começou a trabalhar em "Veneno", a peça que a Companhia Portuguesa de Bailado Contemporâneo (CPBC) estreia hoje no Parque Palmela, em Cascais, o coreógrafo Rui Lopes Graça sabia apenas que queria ter por referência a tarantella. Se a interpretação que faz desta tradição musical italiana acabou por ser muito diferente da original é certamente porque "os bailarinos assim o quiseram". "A música e o movimento da tarantella, que, por vezes, chega a ter um tom festivo, está muito ligada à mordida da tarântula e ao seu veneno", explica Lopes Graça. "Daí os movimentos rápidos e a atmosfera que envolve a forma tradicional de a tocar, cantar e dançar. Aqui deixámos que o veneno da tarântula se transformasse." E o resultado é uma criação que está já longe do registo habitual de Lopes Graça, coreógrafo que tem desenvolvido a maior parte do seu trabalho na Companhia Nacional de Bailado. O facto de estar a compor para outra companhia - é a segunda vez que cria para a CPBC, dirigida por Vasco Wellenkamp - levou-o a alterar vocabulários e processos. Muito do que acontece em veneno nasceu da "intenção que cada bailarino põe no gesto que lhe sugiro, a partir de uma situação determinada ou de uma sensação qualquer". Uma peça "no limite" Os "picos dramáticos" que Lopes Graça tem tentado evitar nas anteriores criações são evidentes em "Veneno". As gargalhadas descontroladas de Emílio Cuenca, a fragilidade incómoda de Conceição Castro, o discurso compulsivo de Susana Lima e as convulsões cíclicas de Ana Sendas constroem uma tensão que faz de "Veneno" uma peça "no limite". "Este bailado está dominado por sensações e experiências contraditórias. As situações estão sempre à beira de se transformar no seu oposto." Rui Lopes Graça teve a sensação que tinha chegado o momento de "arriscar outra abordagem". Os intérpretes à sua disposição estavam dispostos a experimentar. "Há bailarinos que fazem com o corpo o que me passa pela cabeça mas não sou capaz de repetir fisicamente. Aqui aconteceu o mesmo, não do ponto de vista da estética do movimento, mas da intencionalidade do gesto." Explorando os sentimentos interiores de cada um, tantas vezes escondidos, "Veneno" apresenta ao público uma nova tarantella, em que "o indivíduo é levado ao exagero". Quando Ana Sendas e Gustavo Oliveira se encontram ao som de uma tarantella em que alguém confessa que sente necessidade de morrer ("Homo fugit velut, umbra", tema interpretado pela formação L'Arpeggiata), e Rita Judas se deixa cair nos braços de Stephan Ehrlich, não há espaço para arrependimentos nem redenções. Do programa de hoje e de amanhã fazem ainda parte duas criações de Vasco Wellenkamp: "Duo Appassionato" e "Missa". Veneno Coreografia de Rui Lopes Graça Pela Companhia Portuguesa de Bailado Contemporâneo CASCAIS Auditório Fernando Lopes Graça. Parque Palmela (junto ao Estoril Sol). Hoje e amanhã, às 22h. Entrada livre. OUTROS TÍTULOS EM CULTURA O cometa Mayra passou pelo Festival Sete Sóis Sete Luas
Amália revista em italiano
Spencer Tunick fotografa em Santa Maria da Feira
Salzburgo, Mozart e "lingerie"
Uma nova tarantella por Rui Lopes Graça
Morreu compositor Kurt Pahlen
Morreu o cineasta John Schlesinger
EM TRÂNSITO
Morreu o actor Luís Santos
CRÍTICA DE MÚSICA
Música de câmara para uma noite de Verão
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