Está mesmo convicto de que "Portugal mudou nesse dia", que "o regime económico caiu aí", "para o melhor e para o pior e com todas as consequências que aí estão", declarou o antigo ministro da Economia de um governo Guterres aos microfones da Rádio Renascença. O economista pode ter razão quando diz que a ‘nega' de Passos foi determinante para tudo o que se seguiu: o colapso de um grupo financeiro que se julgava grande demais para cair, a perda de influência de um banqueiro que todos julgavam poderoso demais para cair. Permitiu ainda a denúncia de más práticas no mercado, a exposição das fragilidades de reguladores e supervisores. E abriu a porta a um Novo Banco cujo futuro ainda gera mais incertezas do que garantias para o sistema financeiro português. Mas terá o regime mudado assim tanto? Aquela ‘nega' traduziu uma verdadeira mudança ou limitou-se a transferir provisoriamente um centro de decisão de influência?
Terá sido esse o "momento zero" de que fala Daniel Bessa?
A questão é, sempre foi, pertinente. E é ainda mais agora, quando o país se prepara para escolher quem vai orientar os seus destinos nos próximos anos. Que regime querem, que regime esperam, que regime exigem? Não é certo que muita coisa tenha mudado com aquele ‘não' de um político a um banqueiro. Mas é certo que muito já devia ter mudado e muito mais vai ter de mudar. Porque não basta dizer ‘não' a um banqueiro para depois dizer ‘sim' a grupos movidos por interesses pouco transparentes subservientes a outros poderes obscuros. Não basta mudar os nomes dos cargos públicos ou quem os ocupa se não se filtram melhor as suas escolhas ou se escrutinamas suas competências. Não basta contestar os níveis de desemprego no país e não saber depois como contribuir para a sua criação. Não basta prometer mundos e fundos para a segurança social, para a educação, para a saúde, para grandes obras públicas e depois não ter um plano realista que permita cumprir essas mesmas promessas. O país onde ainda há escolas a abrir com atraso, em que as urgências nos hospitais públicos ainda entopem, em que os tribunais demoram eternidades a decidir,e tantos outros problemas, é o país em que ainda há tanto por fazer. Claro que podemos ser ainda mais pessimistas e pensar que os vícios encarcerados nas últimas décadas vão dar a lugar a novas capelinhas com os maus hábitos de sempre. Ou podemos ser optimistas e acreditar que é possível converter esse velho regime numa nova ordem. Talvez por issoo dia em que Passos deu a ‘nega' a Salgado não tenha mudado grande coisa - mas foi seguramente o dia em que essa viragem começou.
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Está mesmo convicto de que "Portugal mudou nesse dia", que "o regime económico caiu aí", "para o melhor e para o pior e com todas as consequências que aí estão", declarou o antigo ministro da Economia de um governo Guterres aos microfones da Rádio Renascença. O economista pode ter razão quando diz que a ‘nega' de Passos foi determinante para tudo o que se seguiu: o colapso de um grupo financeiro que se julgava grande demais para cair, a perda de influência de um banqueiro que todos julgavam poderoso demais para cair. Permitiu ainda a denúncia de más práticas no mercado, a exposição das fragilidades de reguladores e supervisores. E abriu a porta a um Novo Banco cujo futuro ainda gera mais incertezas do que garantias para o sistema financeiro português. Mas terá o regime mudado assim tanto? Aquela ‘nega' traduziu uma verdadeira mudança ou limitou-se a transferir provisoriamente um centro de decisão de influência?
Terá sido esse o "momento zero" de que fala Daniel Bessa?
A questão é, sempre foi, pertinente. E é ainda mais agora, quando o país se prepara para escolher quem vai orientar os seus destinos nos próximos anos. Que regime querem, que regime esperam, que regime exigem? Não é certo que muita coisa tenha mudado com aquele ‘não' de um político a um banqueiro. Mas é certo que muito já devia ter mudado e muito mais vai ter de mudar. Porque não basta dizer ‘não' a um banqueiro para depois dizer ‘sim' a grupos movidos por interesses pouco transparentes subservientes a outros poderes obscuros. Não basta mudar os nomes dos cargos públicos ou quem os ocupa se não se filtram melhor as suas escolhas ou se escrutinamas suas competências. Não basta contestar os níveis de desemprego no país e não saber depois como contribuir para a sua criação. Não basta prometer mundos e fundos para a segurança social, para a educação, para a saúde, para grandes obras públicas e depois não ter um plano realista que permita cumprir essas mesmas promessas. O país onde ainda há escolas a abrir com atraso, em que as urgências nos hospitais públicos ainda entopem, em que os tribunais demoram eternidades a decidir,e tantos outros problemas, é o país em que ainda há tanto por fazer. Claro que podemos ser ainda mais pessimistas e pensar que os vícios encarcerados nas últimas décadas vão dar a lugar a novas capelinhas com os maus hábitos de sempre. Ou podemos ser optimistas e acreditar que é possível converter esse velho regime numa nova ordem. Talvez por issoo dia em que Passos deu a ‘nega' a Salgado não tenha mudado grande coisa - mas foi seguramente o dia em que essa viragem começou.