Sob a influência cultural de Tia Louca, iniciei meus preparativos para o ano novo com uma leitura ininterrupta de quase 400 páginas. O livro Tim Maia Vale Tudo havia sido o presente de Natal que ela ganhara do Tio Hipocondríaco, mas quem descabaçou fui eu (o livro, o livro!) no templo sagrado do humor familiar, localizado na aprazível praia de Japaratinga (AL). Devorei a publicação numa "deitada de rede", inspirado pela biografia do gordinho maloqueiro da Tijuca.Depois que terminei a leitura, devolvi o livro e comentei apenas: "Adorei, Tia Louca. Vou logo dizendo que Tim Maia morre no final". Ela quase deu em mim, antes de se ligar que eu fazia uma piada em cima do óbvio.Foi engraçado ter lido o livro na antevéspera do ano novo, porque o "estilo Tim Maia" casou perfeitamente com a descontração que se abateu sobre a nossa casa e a do vizinho, alugada para um grupo emotional hardcore. O clima "Vale Tudo" tomou conta daquele pedacinho de paraíso, no litoral norte alagoano.Fazendo jus ao apelido de "Os Insaciáveis" empregado pelo dono da casa, a Família Bagunça Feliz iniciou a maratona gastronômico-etílica pontualmente ao meio-dia do dia 30 de dezembro. Assim como a pira dos jogos olímpicos, as chamas dos fogões (um é pouco!) seriam mantidas acesas pelas 48 horas seguintes, fritando, cozinhando e assando de um tudo.Eu devia ter seguido à risca a recomendação médica de parar o medicamento dois dias antes de começar as atividades etílicas. Em vez disso, interrompi o remedinho do Ortomolecular apenas no dia 31. À noite, saquei meu copinho de Cachaça Germana e... pirei, literalmente. Por sorte eu havia tomado o primeiro gole às 19h e tive tempo para tomar um banho e tirar um cochilo até parar de ver os vultos. Mhuahaha.Enquanto isso, no Castelo de Graiscull (a casa vizinha), a festinha bombava com hits techno-clubber e também clássicos do brega, como "Abra a Rodinha". Exercitei meu lado sádico aplicando um teste-surpresa para tentar diagnosticar se os meus dois primos adolescentes seriam Emos. A pergunta era uma só: "Estás gostando desse som?". Quem balançasse a cabeça positivamente estaria taxado pelo resto da vida.Infelizmente, contei meu plano malígno para aquela com quem divido os lençóis e, enquanto eu fazia a perguntinha inocente com cara de "tranqüilidade", a minha mulher gesticulava um "NÃO" apavorado pelas minhas costas. Foi a última vez que antecipei uma brincadeira pra ela.Tia Louca estava radiante. Enfim, uma turma de "doidões" ocupava a casa vizinha, para seu deleite de "careta que adora especular sobre elocubrações alheias". As hipóteses mais apregoadas por Tia Louca para aquele som que varava a terceira madrugada seguida variavam entre a cocaína e o ecstasy.O momento ímpar da noite aconteceu quando um fumacê característico tomou conta do ambiente, despertando comentários quase orgásticos da minha querida parente. "A galera tá dando uma bola! a galera tá dando uma bola!", gritava ela, segundo testemunhas. Infelizmente, perdi essa parte da festa porque justamente naquela hora eu havia descido para a praia (a casa fica em cima de uma falésia), para ter um momento só meu - sabe como é que é, né? Mhuahaha...Tio Hipocondríaco arrumou um macrosystem de quase dois metros quadrados e combateu fogo com fogo, tomando o cuidado de virar as duas mega-caixas de som na direção do Castelo de Graiscull. Os emos atacaram de Michael Jackson Thriller, enquanto Tio Hipocondríaco esquentava as picapes com Não Existe Pecado do Lado de Baixo do Equador. No auge da lombra do remédio + álcool, ainda cedo, instiguei um "Vale Tudo" do meu novo ídolo Tim Maia. Tia Louca delirou e mandou parar. "É cedo, gordinho, desse jeito você me mata! hahahaha!!!", ela gritou.Engraçados foram os preparativos para a meia-noite. Tio Hipocondríaco, mandão como sempre, puxou a contagem regressiva a partir do SESSENTA, gritando feito um alucinado. Todo mundo continuou no coro e, quando chegamos a QUARENTA E DOIS o mundo já explodia em fogos de artifício, celebrando o "feliz ano novo". Eu apaguei as luzes na hora e Tio Hipocondríaco berrou, irritadíssimo, para que a contagem continuasse. Recomeçamos do DEZENOVE e fomos até o fim, para deleite dos Emos, que riam dos retardatários.Tia Louca sacou um CD de marchinhas carnavalescas e levou a tradicional prensa coletiva de todos os sobrinhos homens, numa dança quase Yanomami, em roda, permeada com os gritos de guerra "ÔI, ÔI, ÔI, ÔI, ÔI, ÔI, ÔI, ÔI", enquanto ela ficava no centro da roda, levando bimbadas ao som de "alalaô, mas que calor".A partir daí, só alegria. Dançamos abraçados, nos fartamos no banquete nababesco by Tia Marta & Cia, celebrando 2008 no maior alto astral.Interrompemos esta narrativa para uma curiosidade do capitalismo selvagem, em Japaratinga: As três casas vizinhas - entre elas a da minha família - são vigiadas pelo mesmo caseiro, um coroa cinqüentão, aborígene local. Por causa disso, ele costuma fazer "visitas- surpresa" nas três residências, em horários alternados, para ver se está tudo bem. Segundo Tia Louca, o velho é um tarado que vive à espreita para ver se espia alguém nua, trocando de roupa, pelas frestas das janelas; e essas vistorias seriam na verdade "incertas" que ele dá, na tentativa de contar com a sorte, bem ao estilo "quem procura, acha". Passava das duas da madrugada quando o Caseiro Tarado apareceu no Castelo de Graiscull. Chegou lá todo animadinho e já foi logo entrando na casa, no meio do jogo de luz multicolorida. Alguém da minha família comentou "Lá vai o caseiro, dar uma incerta na festa emo". Rimos todos, imaginando que naquela noite ele finalmente poderia se dar bem.
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Sob a influência cultural de Tia Louca, iniciei meus preparativos para o ano novo com uma leitura ininterrupta de quase 400 páginas. O livro Tim Maia Vale Tudo havia sido o presente de Natal que ela ganhara do Tio Hipocondríaco, mas quem descabaçou fui eu (o livro, o livro!) no templo sagrado do humor familiar, localizado na aprazível praia de Japaratinga (AL). Devorei a publicação numa "deitada de rede", inspirado pela biografia do gordinho maloqueiro da Tijuca.Depois que terminei a leitura, devolvi o livro e comentei apenas: "Adorei, Tia Louca. Vou logo dizendo que Tim Maia morre no final". Ela quase deu em mim, antes de se ligar que eu fazia uma piada em cima do óbvio.Foi engraçado ter lido o livro na antevéspera do ano novo, porque o "estilo Tim Maia" casou perfeitamente com a descontração que se abateu sobre a nossa casa e a do vizinho, alugada para um grupo emotional hardcore. O clima "Vale Tudo" tomou conta daquele pedacinho de paraíso, no litoral norte alagoano.Fazendo jus ao apelido de "Os Insaciáveis" empregado pelo dono da casa, a Família Bagunça Feliz iniciou a maratona gastronômico-etílica pontualmente ao meio-dia do dia 30 de dezembro. Assim como a pira dos jogos olímpicos, as chamas dos fogões (um é pouco!) seriam mantidas acesas pelas 48 horas seguintes, fritando, cozinhando e assando de um tudo.Eu devia ter seguido à risca a recomendação médica de parar o medicamento dois dias antes de começar as atividades etílicas. Em vez disso, interrompi o remedinho do Ortomolecular apenas no dia 31. À noite, saquei meu copinho de Cachaça Germana e... pirei, literalmente. Por sorte eu havia tomado o primeiro gole às 19h e tive tempo para tomar um banho e tirar um cochilo até parar de ver os vultos. Mhuahaha.Enquanto isso, no Castelo de Graiscull (a casa vizinha), a festinha bombava com hits techno-clubber e também clássicos do brega, como "Abra a Rodinha". Exercitei meu lado sádico aplicando um teste-surpresa para tentar diagnosticar se os meus dois primos adolescentes seriam Emos. A pergunta era uma só: "Estás gostando desse som?". Quem balançasse a cabeça positivamente estaria taxado pelo resto da vida.Infelizmente, contei meu plano malígno para aquela com quem divido os lençóis e, enquanto eu fazia a perguntinha inocente com cara de "tranqüilidade", a minha mulher gesticulava um "NÃO" apavorado pelas minhas costas. Foi a última vez que antecipei uma brincadeira pra ela.Tia Louca estava radiante. Enfim, uma turma de "doidões" ocupava a casa vizinha, para seu deleite de "careta que adora especular sobre elocubrações alheias". As hipóteses mais apregoadas por Tia Louca para aquele som que varava a terceira madrugada seguida variavam entre a cocaína e o ecstasy.O momento ímpar da noite aconteceu quando um fumacê característico tomou conta do ambiente, despertando comentários quase orgásticos da minha querida parente. "A galera tá dando uma bola! a galera tá dando uma bola!", gritava ela, segundo testemunhas. Infelizmente, perdi essa parte da festa porque justamente naquela hora eu havia descido para a praia (a casa fica em cima de uma falésia), para ter um momento só meu - sabe como é que é, né? Mhuahaha...Tio Hipocondríaco arrumou um macrosystem de quase dois metros quadrados e combateu fogo com fogo, tomando o cuidado de virar as duas mega-caixas de som na direção do Castelo de Graiscull. Os emos atacaram de Michael Jackson Thriller, enquanto Tio Hipocondríaco esquentava as picapes com Não Existe Pecado do Lado de Baixo do Equador. No auge da lombra do remédio + álcool, ainda cedo, instiguei um "Vale Tudo" do meu novo ídolo Tim Maia. Tia Louca delirou e mandou parar. "É cedo, gordinho, desse jeito você me mata! hahahaha!!!", ela gritou.Engraçados foram os preparativos para a meia-noite. Tio Hipocondríaco, mandão como sempre, puxou a contagem regressiva a partir do SESSENTA, gritando feito um alucinado. Todo mundo continuou no coro e, quando chegamos a QUARENTA E DOIS o mundo já explodia em fogos de artifício, celebrando o "feliz ano novo". Eu apaguei as luzes na hora e Tio Hipocondríaco berrou, irritadíssimo, para que a contagem continuasse. Recomeçamos do DEZENOVE e fomos até o fim, para deleite dos Emos, que riam dos retardatários.Tia Louca sacou um CD de marchinhas carnavalescas e levou a tradicional prensa coletiva de todos os sobrinhos homens, numa dança quase Yanomami, em roda, permeada com os gritos de guerra "ÔI, ÔI, ÔI, ÔI, ÔI, ÔI, ÔI, ÔI", enquanto ela ficava no centro da roda, levando bimbadas ao som de "alalaô, mas que calor".A partir daí, só alegria. Dançamos abraçados, nos fartamos no banquete nababesco by Tia Marta & Cia, celebrando 2008 no maior alto astral.Interrompemos esta narrativa para uma curiosidade do capitalismo selvagem, em Japaratinga: As três casas vizinhas - entre elas a da minha família - são vigiadas pelo mesmo caseiro, um coroa cinqüentão, aborígene local. Por causa disso, ele costuma fazer "visitas- surpresa" nas três residências, em horários alternados, para ver se está tudo bem. Segundo Tia Louca, o velho é um tarado que vive à espreita para ver se espia alguém nua, trocando de roupa, pelas frestas das janelas; e essas vistorias seriam na verdade "incertas" que ele dá, na tentativa de contar com a sorte, bem ao estilo "quem procura, acha". Passava das duas da madrugada quando o Caseiro Tarado apareceu no Castelo de Graiscull. Chegou lá todo animadinho e já foi logo entrando na casa, no meio do jogo de luz multicolorida. Alguém da minha família comentou "Lá vai o caseiro, dar uma incerta na festa emo". Rimos todos, imaginando que naquela noite ele finalmente poderia se dar bem.