Houve um tempo em que era proibido organizar conferências sobre a origem da vida na Faculdade de Ciências. Houve um tempo em que ficar a conversar à porta da faculdade podia ser considerado subversivo. Houve um tempo em que estudantes se barricavam e se defendiam da PIDE com jactos de amoníaco. Houve um tempo em que estudantes que lutavam pela liberdade morriam na guerra colonial.Depois abriram-se as portas e todos lá podiam entrar. E discutia-se todo o mundo numa sala de aulas. E eram os estudantes que estruturavam os seus cursos conforme as suas necessidades. E as faculdades pertenciam a quem lá vivia e estavam ao serviço de todos.Mas, a pouco e pouco as portas foram sendo fechadas, por alguns daqueles que as tinham ajudado a abrir.Primeiro, o ensino superior já não era bem para toda a gente, criaram-se numeros clausus ao mesmo tempo em que se abriam as primeiras universidades privadas. E como as universidades já não eram para a toda a gente, começou-se a pensar que a educação devia ser vista como um investimento individual para entrar no mercado de trabalho e não como uma prioridade social para um desenvolvimento assente no conhecimento. Vieram as propinas, que eram uma pequena contribuição para melhorar a qualidade do ensino. Mas a contribuição foi crescendo, a par com o discurso de que estudar não era um direito, mas uma espécie de serviço que se tem de comprar. E o estudante já não era um agente activo na vida da faculdade mas apenas um cliente. O que o estudante comprava era um bilhete para o mercado de trabalho, por isso trocou-se o conhecimento de fundo por aquilo que o mercado pedia. As universidades deixaram de ter uma gestão democrática e partilhada para se estruturarem como uma empresa. E as propinas continuaram a crescer enquanto o financiamento público descia, descia, descia.Em 35 anos muitas portas se fecharam. Agora, quem não pode pagar, desiste. Ou endivida-se à banca. Quem trabalha, não pode estudar. Empresários decidem o rumo das universidades. Há cartazes a serem arrancados das paredes por motivos políticos. Há seguranças privados a pedirem identificação e a controlar os movimentos das pessoas.Nós somos os filhos de Abril. E está nas nossas mãos voltar a abrir as portas que Abril abriu.
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Houve um tempo em que era proibido organizar conferências sobre a origem da vida na Faculdade de Ciências. Houve um tempo em que ficar a conversar à porta da faculdade podia ser considerado subversivo. Houve um tempo em que estudantes se barricavam e se defendiam da PIDE com jactos de amoníaco. Houve um tempo em que estudantes que lutavam pela liberdade morriam na guerra colonial.Depois abriram-se as portas e todos lá podiam entrar. E discutia-se todo o mundo numa sala de aulas. E eram os estudantes que estruturavam os seus cursos conforme as suas necessidades. E as faculdades pertenciam a quem lá vivia e estavam ao serviço de todos.Mas, a pouco e pouco as portas foram sendo fechadas, por alguns daqueles que as tinham ajudado a abrir.Primeiro, o ensino superior já não era bem para toda a gente, criaram-se numeros clausus ao mesmo tempo em que se abriam as primeiras universidades privadas. E como as universidades já não eram para a toda a gente, começou-se a pensar que a educação devia ser vista como um investimento individual para entrar no mercado de trabalho e não como uma prioridade social para um desenvolvimento assente no conhecimento. Vieram as propinas, que eram uma pequena contribuição para melhorar a qualidade do ensino. Mas a contribuição foi crescendo, a par com o discurso de que estudar não era um direito, mas uma espécie de serviço que se tem de comprar. E o estudante já não era um agente activo na vida da faculdade mas apenas um cliente. O que o estudante comprava era um bilhete para o mercado de trabalho, por isso trocou-se o conhecimento de fundo por aquilo que o mercado pedia. As universidades deixaram de ter uma gestão democrática e partilhada para se estruturarem como uma empresa. E as propinas continuaram a crescer enquanto o financiamento público descia, descia, descia.Em 35 anos muitas portas se fecharam. Agora, quem não pode pagar, desiste. Ou endivida-se à banca. Quem trabalha, não pode estudar. Empresários decidem o rumo das universidades. Há cartazes a serem arrancados das paredes por motivos políticos. Há seguranças privados a pedirem identificação e a controlar os movimentos das pessoas.Nós somos os filhos de Abril. E está nas nossas mãos voltar a abrir as portas que Abril abriu.