Portugal e outras touradas: À maneira dos geómetras

03-07-2011
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Ontem, dia que precisaria de ter mais algumas horas para que eu conseguisse fazer tudo aquilo de que precisava, captaram, apesar disso, os meus olhos e ouvidos, provinda dos telejornais da hora do almoço, a notícia de que o Governo, no prosseguimento do combate à crise que aflige e acabrunha o país, determinou que os preços de alguns dos serviços prestados pelo Estado aos portugueses fossem actualizados. Essa actualização dos montantes que o Professor Doutor Salazar, do alto dos seus inigualáveis conhecimentos sobre Finanças, grandeza de alma e supremo humanismo, estabelecera, a Bem da Nação, no ano (que se assemelha ainda mais longínquo por virtude desta República Nova que Abril nos trouxe) de 1968, foi considerada inaceitável por todos os entrevistados, ao porem em relevo um número impensável de aumentos situados acima dos mil por cento. Lembro-me, por exemplo, do caso das inspecções periódicas obrigatórias aos restaurantes, que passaram de 15 a 400€.Outra houve, porém, que me pareceu apropriada a uma breve e esclarecedora reflexão sobre a natureza moral dos presentes governantes e respectivos padrões éticos. Refiro-me à escalada de 5000% registada no custo dos atestados de incapacidade, que subiram dos 0,99€ para os 50€. Assim, cingindo-me ao método cartesiano, de raiz matemática, adaptado por Spinoza à sua Ética e também estruturante do seu Tratado Teológico-Político, procurarei, embora abreviadamente para que ninguém se enfastie em demasia, fazer uma demonstração que passo a expor.Tenhamos em conta os dados seguintes: 1- Sendo, em 1968, o rendimento mensal familiar médio da ordem dos - por conversão - cerca de 20€, o preço do atestado desse tipo representava, para uma família que tivesse um filho deficiente, uma despesa equivalente a cerca 1/20 (cerca de 5%) desse rendimento. Se considerarmos que o rendimento médio actual ronda aproximadamente os 1000€, os 50€ que o atestado custa a partir de agora restabelecem essa proporção.2- O presente subsídio de invalidez, segundo o que afirmou o presidente da Associação Portuguesa de Deficientes, é de 189€. Desconheço qual seria o estabelecido pelo frugalidade e parcimónia esclarecida de António de Oliveira Salazar, mas basta fazer as contas para verificar que os 50€ do atestado correspondem a mais de 1/4 dessa quantia, mais exactamente a 26,5%. Nesse mês, o deficiente terá que se alimentar apenas uma vez por dia - e sem se poder alargar muito!Pela soma do primeiro com o segundo conjunto de elementos, constata-se, pois, que a diferença ética e política entre o Professor Salazar e o Engenheiro Sócrates é igual a zero.Quod est demonstratum.Dúvidas?


Ontem, dia que precisaria de ter mais algumas horas para que eu conseguisse fazer tudo aquilo de que precisava, captaram, apesar disso, os meus olhos e ouvidos, provinda dos telejornais da hora do almoço, a notícia de que o Governo, no prosseguimento do combate à crise que aflige e acabrunha o país, determinou que os preços de alguns dos serviços prestados pelo Estado aos portugueses fossem actualizados. Essa actualização dos montantes que o Professor Doutor Salazar, do alto dos seus inigualáveis conhecimentos sobre Finanças, grandeza de alma e supremo humanismo, estabelecera, a Bem da Nação, no ano (que se assemelha ainda mais longínquo por virtude desta República Nova que Abril nos trouxe) de 1968, foi considerada inaceitável por todos os entrevistados, ao porem em relevo um número impensável de aumentos situados acima dos mil por cento. Lembro-me, por exemplo, do caso das inspecções periódicas obrigatórias aos restaurantes, que passaram de 15 a 400€.Outra houve, porém, que me pareceu apropriada a uma breve e esclarecedora reflexão sobre a natureza moral dos presentes governantes e respectivos padrões éticos. Refiro-me à escalada de 5000% registada no custo dos atestados de incapacidade, que subiram dos 0,99€ para os 50€. Assim, cingindo-me ao método cartesiano, de raiz matemática, adaptado por Spinoza à sua Ética e também estruturante do seu Tratado Teológico-Político, procurarei, embora abreviadamente para que ninguém se enfastie em demasia, fazer uma demonstração que passo a expor.Tenhamos em conta os dados seguintes: 1- Sendo, em 1968, o rendimento mensal familiar médio da ordem dos - por conversão - cerca de 20€, o preço do atestado desse tipo representava, para uma família que tivesse um filho deficiente, uma despesa equivalente a cerca 1/20 (cerca de 5%) desse rendimento. Se considerarmos que o rendimento médio actual ronda aproximadamente os 1000€, os 50€ que o atestado custa a partir de agora restabelecem essa proporção.2- O presente subsídio de invalidez, segundo o que afirmou o presidente da Associação Portuguesa de Deficientes, é de 189€. Desconheço qual seria o estabelecido pelo frugalidade e parcimónia esclarecida de António de Oliveira Salazar, mas basta fazer as contas para verificar que os 50€ do atestado correspondem a mais de 1/4 dessa quantia, mais exactamente a 26,5%. Nesse mês, o deficiente terá que se alimentar apenas uma vez por dia - e sem se poder alargar muito!Pela soma do primeiro com o segundo conjunto de elementos, constata-se, pois, que a diferença ética e política entre o Professor Salazar e o Engenheiro Sócrates é igual a zero.Quod est demonstratum.Dúvidas?

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