OS FUSILAMENTOS DE GOYA

01-07-2011
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JORGE SENA - OS FUSILAMENTOS DE GOYA via DA TAILÂNDIA COM AMOR E HUMOR de Jose Martins em 11/09/09 Sexta-feira, Setembro 11, 2009CARTA A MEUS FILHOS SOBRE OS FUZILAMENTOS DE GOYANão sei, meus filhos, que mundo será o vosso.É possível, porque tudo é possível, que ele seja aquele que eu desejo para vós. Um simples mundo,onde tudo tenha apenas a dificuldade que advém de nada haver que não seja simples e natural.Um mundo em que tudo seja permitido,conforme o vosso gosto, o vosso anseio, o vosso prazer,o vosso respeito pelos outros, o respeito dos outros por vós.E é possível que não seja isto, nem seja sequer isto o que vos interesse para viver. Tudo é possível,ainda quando lutemos, como devemos lutar,por quanto nos pareça a liberdade e a justiça,ou mais que qualquer delas uma fiel dedicação à honra de estar vivo.(...)Acreditai que nenhum mundo, que nada nem ninguém vale mais que uma vida ou a alegria de tê-la.É isto o que mais importa - essa alegria.Acreditai que a dignidade em que hão-de falar-vos tanto não é senão essa alegria que vem de estar-se vivo e sabendo que nenhuma vez alguém está menos vivo ou sofre ou morre para que um só de vós resista um pouco mais à morte que é de todos e virá.Que tudo isto sabereis serenamente,sem culpas a ninguém, sem terror, sem ambição, e sobretudo sem desapego ou indiferença,ardentemente espero. Tanto sangue,tanta dor, tanta angústia, um dia - mesmo que o tédio de um mundo feliz vos persiga - não hão-de ser em vão. Confesso que muitas vezes, pensando no horror de tantos séculos de opressão e crueldade, hesito por momentos e uma amargura me submerge inconsolável.Serão ou não em vão? Mas, mesmo que o não sejam,quem ressuscita esses milhões, quem restituinão só a vida, mas tudo o que lhes foi tirado?Nenhum Juízo Final, meus filhos, pode dar-lhes aquele instante que não viveram, aquele objeto que não fruíram, aquele gestode amor, que fariam «amanhã».E, por isso, o mesmo mundo que criemos nos cumpre tê-lo com cuidado, como coisa que não é nossa, que nos é cedida para a guardarmos respeitosamente em memória do sangue que nos corre nas veias, da nossa carne que foi outra, do amor que outros não amaram porque lho roubaram.Jorge de Sena Lisboa, 25/6/1959Fonte: Jornal do Pau


JORGE SENA - OS FUSILAMENTOS DE GOYA via DA TAILÂNDIA COM AMOR E HUMOR de Jose Martins em 11/09/09 Sexta-feira, Setembro 11, 2009CARTA A MEUS FILHOS SOBRE OS FUZILAMENTOS DE GOYANão sei, meus filhos, que mundo será o vosso.É possível, porque tudo é possível, que ele seja aquele que eu desejo para vós. Um simples mundo,onde tudo tenha apenas a dificuldade que advém de nada haver que não seja simples e natural.Um mundo em que tudo seja permitido,conforme o vosso gosto, o vosso anseio, o vosso prazer,o vosso respeito pelos outros, o respeito dos outros por vós.E é possível que não seja isto, nem seja sequer isto o que vos interesse para viver. Tudo é possível,ainda quando lutemos, como devemos lutar,por quanto nos pareça a liberdade e a justiça,ou mais que qualquer delas uma fiel dedicação à honra de estar vivo.(...)Acreditai que nenhum mundo, que nada nem ninguém vale mais que uma vida ou a alegria de tê-la.É isto o que mais importa - essa alegria.Acreditai que a dignidade em que hão-de falar-vos tanto não é senão essa alegria que vem de estar-se vivo e sabendo que nenhuma vez alguém está menos vivo ou sofre ou morre para que um só de vós resista um pouco mais à morte que é de todos e virá.Que tudo isto sabereis serenamente,sem culpas a ninguém, sem terror, sem ambição, e sobretudo sem desapego ou indiferença,ardentemente espero. Tanto sangue,tanta dor, tanta angústia, um dia - mesmo que o tédio de um mundo feliz vos persiga - não hão-de ser em vão. Confesso que muitas vezes, pensando no horror de tantos séculos de opressão e crueldade, hesito por momentos e uma amargura me submerge inconsolável.Serão ou não em vão? Mas, mesmo que o não sejam,quem ressuscita esses milhões, quem restituinão só a vida, mas tudo o que lhes foi tirado?Nenhum Juízo Final, meus filhos, pode dar-lhes aquele instante que não viveram, aquele objeto que não fruíram, aquele gestode amor, que fariam «amanhã».E, por isso, o mesmo mundo que criemos nos cumpre tê-lo com cuidado, como coisa que não é nossa, que nos é cedida para a guardarmos respeitosamente em memória do sangue que nos corre nas veias, da nossa carne que foi outra, do amor que outros não amaram porque lho roubaram.Jorge de Sena Lisboa, 25/6/1959Fonte: Jornal do Pau

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