Já havíamos, aqui no devaneios, abordado as questões do café etíope no comércio mundial. Fizémo-lo aquando da nossa análise do mais recente livro de Jean Ziegler: L'Empire de la honte. Dissémos então que, segundo o autor, em pouco mais de 3 anos, o preço do quilograma de café etíope passou de 3 dólares para 80 cêntimos, lançando os camponeses na autêntica penúria e fome. A poderosa mulinacional helvética Nestlé comprava, à data de escrita do livro, quase toda a produção etíope de café, fixando unilateralmente os preços. O facto de cerca de 95% dos produtores serem camponeses de produção de base familiar, reduz-lhes ainda mais a parca capacidade negocial (se é que tinham alguma...) num país em que 75% da população vive com menos de 0,85 €/dia e cerca de 15 milhões de pessoas dependem da produção de café, responsável por 40 a 60% das exportações etíopes.A questão volta, agora, à ribalta da imprensa internacional na sequência do embate entre o Governo de Addis Abeba e a poderosa e conhecida multinacional norteamericanade cafés Starbucks. Segundo a Oxfam, uma ONG inglesa de apoio humanitário, a Starbucks terá intercedido junto da National Coffee Association para impedir a tentativa do Governo etíope de registar a patente de 3 marcas de café de produção exclusivamente etíope que, embora subindo os custos à Starbucks, assegurariam o aumento da quota parte dos produtores etíopes, na tentativa de travar a redução das verbas pagas à Etiópia pelo seu café, cifrada nos últimos 3 anos em cerca de 59%.Claro está que a Starbucks nega por completo semelhante "boato", reafirmando a sua responsabilidade social para com os produtores de cafés etíopes "cuja actividade muito preza". Mas para os quais, segundo a OXFAM, apenas destina 5 a 10% dos seus lucros. A luta por uma globalização mais justa, baseada num comércio mais equitativo, não é apenas uma questão de defesa do politicamente correcto e da pertinência de manifestações ocasionais quando se unem os líderes mundiais. Longe de ser apenas mais um idealismo de uma qualquer urbanidade intelectual alterglobalizante, estas são questões práticas de consequências possivelmente dramáticas. A persistência de políticas tendentes a aprofundar o fosso entre o norte desenvolvido e o sul longe de qualquer progresso, mais não fará do que agravar tensões sociais. Justificar ódios. Cavar sepulturas onde se enterrarão as résteas de qualquer esperança numa concórdia internacional de facto.
Categorias
Entidades
Já havíamos, aqui no devaneios, abordado as questões do café etíope no comércio mundial. Fizémo-lo aquando da nossa análise do mais recente livro de Jean Ziegler: L'Empire de la honte. Dissémos então que, segundo o autor, em pouco mais de 3 anos, o preço do quilograma de café etíope passou de 3 dólares para 80 cêntimos, lançando os camponeses na autêntica penúria e fome. A poderosa mulinacional helvética Nestlé comprava, à data de escrita do livro, quase toda a produção etíope de café, fixando unilateralmente os preços. O facto de cerca de 95% dos produtores serem camponeses de produção de base familiar, reduz-lhes ainda mais a parca capacidade negocial (se é que tinham alguma...) num país em que 75% da população vive com menos de 0,85 €/dia e cerca de 15 milhões de pessoas dependem da produção de café, responsável por 40 a 60% das exportações etíopes.A questão volta, agora, à ribalta da imprensa internacional na sequência do embate entre o Governo de Addis Abeba e a poderosa e conhecida multinacional norteamericanade cafés Starbucks. Segundo a Oxfam, uma ONG inglesa de apoio humanitário, a Starbucks terá intercedido junto da National Coffee Association para impedir a tentativa do Governo etíope de registar a patente de 3 marcas de café de produção exclusivamente etíope que, embora subindo os custos à Starbucks, assegurariam o aumento da quota parte dos produtores etíopes, na tentativa de travar a redução das verbas pagas à Etiópia pelo seu café, cifrada nos últimos 3 anos em cerca de 59%.Claro está que a Starbucks nega por completo semelhante "boato", reafirmando a sua responsabilidade social para com os produtores de cafés etíopes "cuja actividade muito preza". Mas para os quais, segundo a OXFAM, apenas destina 5 a 10% dos seus lucros. A luta por uma globalização mais justa, baseada num comércio mais equitativo, não é apenas uma questão de defesa do politicamente correcto e da pertinência de manifestações ocasionais quando se unem os líderes mundiais. Longe de ser apenas mais um idealismo de uma qualquer urbanidade intelectual alterglobalizante, estas são questões práticas de consequências possivelmente dramáticas. A persistência de políticas tendentes a aprofundar o fosso entre o norte desenvolvido e o sul longe de qualquer progresso, mais não fará do que agravar tensões sociais. Justificar ódios. Cavar sepulturas onde se enterrarão as résteas de qualquer esperança numa concórdia internacional de facto.