Interrupções: (E)vidências

18-07-2005
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Foto: James Philip PeggAnfiteatro Nobre da Faculdade de Letras do Porto, num dia indefinido de 2001. Estou num intrigante exercício de equilibrismo, a tentar passar um papel para as primeiras filas do auditório. Vou chamando a atenção de todos menos de quem pretendia, o que fere de morte a solenidade do evento – um colóquio sobre José Gomes Ferreira –, perturbando até o discurso do conferencista. O que tentarei mostrar, em menos de um minuto, é que este meu esbracejar, pouco discreto no silêncio atento de um auditório, não é mera atribulação de desastrado, mas sim um oráculo clarividente e fatal. Para já, deixemos este arriscado gesto em suspenso, bem como o que o motivou. Deixem-me em stand still, em desequilíbrio incívico sobre as doutas cabeças do vasto auditório, que lá voltaremos em breves instantes.Assistimos hoje a um duelo sem tréguas. Neste preciso momento, é provável que Rui Rio e Isabel Pires de Lima ensaiem jogadas guerreiras cozinhadas em ódios figadais. Agora mesmo, uma lança desdém às politiquices do outro, enquanto o outro saca de pistola contra a cultura de uma; para uma, o túnel de Rio é um mar de lama, enquanto este, usualmente pouco fluido, tenta fazer túnel sobre (ou antes, sob) asneiras anteriores, dizendo que não é Rio para meter água. E túnel por túnel, vivemos enterrados no caos!Retomemos o gesto – o meu – que ameaça desastre lá na Faculdade de Letras. Para o justificar, recuemos um pouco.- Psst, ó jovem, passava-me este papel aí à doutora Pires de Lima?... – eis a voz que tudo fundamenta. Sussurro anónimo que eu ouvi, que ouço agora, enquanto tento imaginar um túnel para fazer passar a missiva. Ou uma ponte? Sim, talvez uma ponte, já que a antipatia da “doutora Isabel” por túneis pode revelar-se um autêntico presságio. Se bem que a opção túnel é uma solução menos desarmada. Se tudo desabar, ao menos temos um buraco em que nos enfiar.E por via aérea, finalmente, entrego o bem-dito papel à futura ministra da cultura... Sem túneis de vento, mas, neste dia perdido de 2001, com a incerteza própria de quem entrega um vaticínio .Aguardamos desenvolvimentos.

Foto: James Philip PeggAnfiteatro Nobre da Faculdade de Letras do Porto, num dia indefinido de 2001. Estou num intrigante exercício de equilibrismo, a tentar passar um papel para as primeiras filas do auditório. Vou chamando a atenção de todos menos de quem pretendia, o que fere de morte a solenidade do evento – um colóquio sobre José Gomes Ferreira –, perturbando até o discurso do conferencista. O que tentarei mostrar, em menos de um minuto, é que este meu esbracejar, pouco discreto no silêncio atento de um auditório, não é mera atribulação de desastrado, mas sim um oráculo clarividente e fatal. Para já, deixemos este arriscado gesto em suspenso, bem como o que o motivou. Deixem-me em stand still, em desequilíbrio incívico sobre as doutas cabeças do vasto auditório, que lá voltaremos em breves instantes.Assistimos hoje a um duelo sem tréguas. Neste preciso momento, é provável que Rui Rio e Isabel Pires de Lima ensaiem jogadas guerreiras cozinhadas em ódios figadais. Agora mesmo, uma lança desdém às politiquices do outro, enquanto o outro saca de pistola contra a cultura de uma; para uma, o túnel de Rio é um mar de lama, enquanto este, usualmente pouco fluido, tenta fazer túnel sobre (ou antes, sob) asneiras anteriores, dizendo que não é Rio para meter água. E túnel por túnel, vivemos enterrados no caos!Retomemos o gesto – o meu – que ameaça desastre lá na Faculdade de Letras. Para o justificar, recuemos um pouco.- Psst, ó jovem, passava-me este papel aí à doutora Pires de Lima?... – eis a voz que tudo fundamenta. Sussurro anónimo que eu ouvi, que ouço agora, enquanto tento imaginar um túnel para fazer passar a missiva. Ou uma ponte? Sim, talvez uma ponte, já que a antipatia da “doutora Isabel” por túneis pode revelar-se um autêntico presságio. Se bem que a opção túnel é uma solução menos desarmada. Se tudo desabar, ao menos temos um buraco em que nos enfiar.E por via aérea, finalmente, entrego o bem-dito papel à futura ministra da cultura... Sem túneis de vento, mas, neste dia perdido de 2001, com a incerteza própria de quem entrega um vaticínio .Aguardamos desenvolvimentos.

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