Palavrar

25-06-2005
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É frequente, em entrevistas, principalmente em entrevistas televisivas ou radiofónicas, ouvirem-se as maiores barbaridades “en passant”, sem darmos muito por elas como se apenas fizessem cócegas no ouvido, ou, ouvindo-as com alguma atenção, rapidamente as esquecemos porque as colocamos no “arquivo” dos lapsos do entrevistado, que, coitado, deve ter sido apanhado de surpresa, não era bem aquilo que ele queria dizer mas isto, porque também não é pêra doce ser entrevistado por jornalistas, muito menos é frequente gente com capacidade de improvisação e ao mesmo tempo qualidade de exposição verbal, no imediato: “olhe, então diga lá vôscência o que é que pensa disto e daquilo, e mais aquilo?”. Assim de chofre é fácil a escorregadela para a asneira. Asneira que não tem necessariamente de ser sinónimo de erro. Pode ser somente sinceridade desbocada, ou deslocada. Ou outra coisa qualquer.Seja com for, um caso semelhante ouvi e vi há pouco na TV, num programa dedicado a promover o Europeu de Futebol cá na terra. Um tipo entrevistava o filho que todas as mães gostavam de ter: Luís Figo, o nosso herói desportivo, modelo incensado de ponderação e virtude, dentro e fora dos relvados, pai de família extremado: O gajo certinho. Tudo no sítio como deve ser. O rapaz do microfone perguntou a certo ponto o que é que Figo sentia ao ser uma bandeira nacional. Como é que é ser uma bandeira deste país? O futebolista encolheu o sobrolho e os ombros num trejeito de humildade e envergonhada modéstia, que não se sentia minimamente uma bandeira de Portugal. Ena pá que grande responsabilidade está este gajo agora a meter-me nos ombros. Seria este o raciocínio se Figo não estivesse habituado a responder a esta pergunta, que por estas alturas de selecção deve ser das interrogações mais frequentes. Destas ou parecidas, mas que desembocariam sempre no mesmo padrão, ou modelo, de resposta. Ninguém neste mundo, aliás, consegue arranjar do pé para a mão e num curto espaço de tempo (esta do espaço de tempo tem que se lhe diga…) dezenas de respostas iguais para a mesma pergunta. E Figo, mesmo não pensando no universo restrito do futebol, da respectiva tribo, mas indo para o mais vasto universo mediático do desporto e do espectáculo, é sem dúvida dos indivíduos mais inteligentes que por ali aparecem. Na pantalha, vá lá.Daí que me tenha espantado a restante resposta do atleta, que ainda agora estou para ver se arquivo na pasta das “gaffes inocentes” ou das dos “lapsus linguae”, no sector das coisas sem importância e com o carimbo «Para Esquecer Porque O Gajo Nem Sequer Pensou No Que Disse, De Certeza». Portanto, num contexto de exaltação patriótica, do apelo constante, pelos políticos, pelos engravatados todos da bola e dos partidos que aplaudem o circo, por comentadores e jornalistas, até as cabinas telefónicas em Lisboa andam em forma de bola de futebol, uma coisa galvanizante para o país, que nos vai tirar da fossa. O Presidente da República vai pessoalmente ao sítio onde a briosa Selecção de Todos Nós está a estagiar para o torneio que se aproxima, em visita oficial e de Estado, com a esposa, para encorajar e moralizar a rapaziada. Andam os táxis quase todos, pelo menos é o que me parece aqui em Almada, com bandeiras portuguesas ao vento. Faltam seis dias! Uma nação em suspense! Ena pá dois mil! Enfim, é este o contexto, e isto é só palavrar, para treinar as diferentes formas do português e a escrita, por isso não abrevio.Que não senhor, com aquele ar grave e sincero (do estilo: porra, eu comprava um carro em segunda-mão a este gajo, carago), não me sinto nada a bandeira de Portugal. Sou apenas uma pessoa que tenta dar o máximo para cumprir com as suas responsabilidades profissionais. Sou profissional, e é o que faço, dar o meu melhor em termos profissionais. Em suma, e só, foi isto. O rapaz vai enfrentar as tribos estrangeiras por motivações profissionais. Não são patrióticas nem idealistas, são profissionais, porque o rapaz é um grande profissional. Profissional de alguém que exerce uma profissão e é pago a peso de ouro para isso. Epá, se calhar não é nada, mas as palavras do rapaz, que foram mais explícitas, de resto, que as aqui roufenhamente transcritas, fizeram-me uma certa comichão, a mim, que não concordo com nada destas merdas do euro e dos novos estádios, acho tudo uma pegada estupidez para um país como este está. Mas pronto, esqueça-se a conjuntura, adoro que a nossa selecção nacional de futebol jogue bem e ganhe, e também adoro um bom jogo de futebol em geral, e adoro ainda mais jogar um bom (ou mau) jogo de futebol, e tenho uns tiques nacionalistas esquisitos. E foda-se, o gajo é um dos meus ídolos do estádio, o Méne!, o nosso menino, o Fundação Luís Figo, e está-me para ali a confessar que é um reles mercenário? Ora gaita ou bolas. Também não é porque eu estivesse à espera que o homem disse-se bem eu cá sou um patriota e um cidadão interessado e como tal vou comer relva para dar uma alegria aos portugueses e ao gajo do palavrar em particular. Nada disso. Mas podia ter sido uma coisa a meio termo. A meio caminho.A este despropósito, lembrei-me de um fórum de dois dias recente que acompanhei aqui em Lisboa, sobre Futebol Gestão e Paixão, coisa em grande e séria com direito a Governo de Portugal, da Liga, da federação e do Real Madrid e etc. na sessão de encerramento. Na de abertura também falaram uns figurões de gravata. Depois foi um desfiar de economistas, contabilistas e gestores, dirigentes e pensadores do fenómeno da ripanarápaqueca, intelectuais da bola e do liberalismo ex-capitalismo, juntos a pensar dois dias, com o contributo de alguns jornalistas especializados. Um dos oradores de gravata, a inevitável gravata, profissional look power point modernaço representava a empresa que geria a carreira profissional do Figo, a imagem do Figo, o marketing do Figo, os contratos do Figo, a agenda do Figo, as gravatas do Figo e muitas coisas mais do Figo, Figo que mais parecia uma SA, ou uma SAD, ou uma SARL, ou, mais elegante e poderoso, uma Corp. de Corporation ou Ind. De Industries, sendo o cavalheiro do Fórum respectivo membro do Conselho de Administração, com o pelouro dos Fóruns. Esta foi das intervenções que achei mais interessantes e enriquecedoras, para perceber o nível de profissionalização a que chegou realmente o futebol (calma patriotas! Lá fora, lá fora! que o Figo é pioneiro e ainda “case study” em Portugal no que respeita a este patamar de negócio e dinheiro, Portugal, foi outra das lições que retive daquele seminário, é ainda um aprendiz, um patético aprendiz, que está a levar o barco do futebol à bancarrota, ao fundo, sim, ao fundo, se não se aplicam reformas de alto a baixo no sistema, sem aspas, cortando nas despesas faraónicas e irrealistas e aumentando as receitas. Como? Tivessem assistido ao seminário, mas basicamente é isso: cortar despesas, diminuir salários, valores contratuais, cláusulas de rescisão, etc., e aumentar receitas como se passa a explicar, de resto e para atalhar este parágrafo, na notícia que escrevi na ocasião para o jornal, e que tomo a liberdade de colocar em post scriptum que é: ps.:. É esta a receita, meus senhores! E já pareço um teórico do futebol e até já parece que isto tem tudo muita importância real e significativa nas nossas vidas concretas) e, mais alargadamente, o espectáculo e o entretenimento. Um parágrafo difícil de ler depois, temos que Figo, por exemplo, que começou a jogar à bola no Pastilhas aqui mais ou menos ao lado de minha casa, ali para baixo na Cova da Piedade, tem hoje em dia o passe estimado em 180 milhões de euros, menos milhão mais milhão, e isto é só valor futebolístico intrínseco, depois há o valor extrínseco, aquele que não se apalpa ou se pontapeia, como a barba do Figo ou falta dela, a pinta do Figo, o sex appeall do Figo, o sorriso do Figo, que vai dar nas swetters do Figo, canecas e cachecóis do Figo, video-games do Figo, ténis da Nike e tudo isso. Portanto, o Figo é mesmo uma SA ou em rigor uma SPA Sociedade Pouco Anónima e tem dinheiro suficiente para ter uma carrada de tipos muito profissionais a pensar e a decidir melhor que ele e por ele a sua carreira, as suas gravatas, a sua agenda, o penteado da belíssima e amantíssima barbie-esposa, e tudo isso, etc.. Enfim, um mundo Figo! Figo Corporation! Tudo muito calculadinho, tudo muito últimos gritos da gestão e promoção de um “ídolo”, tudo muito profissional, em suma. De resto, estava agora a aqui a ver nos apontamentos, a dissertação do gestor da empresa que gere o Figo chamava-se “A criação de uma celebridade – a indústria das celebridades”. Já lhe subiu à cabeça.ps.:Mais gestão e menos paixão no dirigismo desportivoNovos figurinos para o futebolCom uma ou outra nuance, todos concordam no essencial dos problemas do futebol nacional no que toca à sua componente gestionária. De Valentim Loureiro a Gilberto Madail, passando por uma mão cheia de economistas e gestores profissionais, pelo vice-presidente do Futebol Clube do Porto, Fernando Gomes, ou por exemplos de fora, como o relatado por Florentino Peres, presidente do “galáctico” Real Madrid. Todos concordam que o futebol não pode continuar a dar passos maiores que as pernas e que tem de assumir como sua a máxima «quem não tem dinheiro não tem vícios». Ou como sublinhou o mesmo dirigente portista no Fórum Nacional – Futebol Gestão e Paixão, que decorreu em Lisboa, «o grande problema do futebol não é o aumento de receitas, mas a contenção das despesas».Reunindo dezenas de dirigentes do mundo da bola, esta jornada promovida pela Associação Portuguesa de Management, não se limitou a apresentar diagnósticos, contribuindo com soluções para um equilíbrio minimamente razoável entre a “suicidária” paixão e o racional profissionalismo no que se refere à gestão dos clubes e competições de futebol, regra geral entregue a voluntariosos dirigentes endinheirados que de gestão do fenómeno futebolístico têm apenas vagas noções, apesar deste ser hoje uma verdadeira indústria que em Portugal, só na Super Liga, movimentou receitas da ordem dos 219 milhões de euros em 2001/02 (por curiosidade, refira-se que a milionária Premier League britânica envolveu no mesmo ano nada menos que 1 bilião e 748 mil euros…), segundo dados da multinacional de consultadoria Deloitte&Touche, ali apresentados. Deste volume de receitas, por outro lado, 70% cabem aos quatro grandes (Porto, Sporting, Benfica e Boavista), quando a Liga tem 18 equipas – segundo a empresa, «a receita agregada dos 4 Grandes foi de aproximadamente 151 milhões de euros, sendo que as outras 14 equipas geraram os restantes 68 milhões de euros, ou seja, menos de 25% do total das receitas contabilizadas». O problema é que, parecendo muito, estes números traduzem um desequilíbrio enorme relativamente aos custos, bastando constatar que, como sublinhou Hélder Varandas, da Deloitte, «só os custos com pessoal (na Super Liga) aumentaram 68% nas últimas cinco épocas, atingindo 134 milhões de euros na última época». Por outro lado, «a evolução dos resultados (financeiros) também não é animadora. Nos últimos cinco anos nunca houve resultados líquidos positivos» em termos globais, frisou, atribuindo isto a três principais ordens de factores: concentração da actividade nos três grandes, sobreendividamento e descapitalização na generalidade dos clubes e um «deficit estrutural» da “indústria” do pontapé na bola.Soluções. Para além das aparentemente óbvias, como a preconizada pelo secretário de Estado Hermínio Loureiro, «uma gestão rigorosa e responsável», para os peritos da Deloitte, estas passarão por três vectores: «alteração do modelo competitivo»; «alteração do modelo de remunerações dos agentes desportivos», designadamente jogadores; e «aposta na formação». Quanto à primeira sugestão, que compreende principalmente a redução do número de clubes nas principais ligas, parece haver consenso, quer da parte do presidente da Federação, que se revelou «absolutamente favorável a que se faça a redução, não só nas ligas profissionais mas também nas supostamente amadoras, na 2ª B, na 3ª, nos distritais, o futebol português tem de emagrecer todo, de alto a baixo», preconizou, quer da parte de Fernando Gomes, que também defendeu a redução, apesar de frisar a salvaguarda dos clubes ditos pequenos nesse corte.Hélder Varandas, porém, foi mais longe, apresentado um plano concreto de viabilização económica do futebol nacional em torno daqueles três vectores. A ver: a redução do futebol profissional para apenas 20 equipas, criando-se duas Ligas com 10 clubes cada. As primeiras dez constituiriam uma Super Liga disputada a quatro voltas, e as segundas uma Liga de Honra, igualmente a quatro rondas, procedendo-se ao «fecho» mais rigoroso das duas Ligas, com a promoção e despromoção apenas de uma equipa, tudo isto conjugado com uma «selecção rigorosa das equipas» que participem nas competições profissionais. Daqui resultaria, defendeu, um substancial aumento das receitas correntes e uma distribuição mais equitativa das mesmas, clubes com orçamentos mais equilibrados e um aumento da competitividade. No que toca à componente salarial, defende a Deloitte que esta deverá ser decomposta em duas vertentes, fixa e variável, esta última em função dos resultados financeiros do clube/empresa, e não dos resultados desportivos. Quanto à formação, advogou ser fundamental «recrutar e formar talentos a preços competitivos», assumindo-os como «futura fonte adicional de receitas». «Deverá ser colocada uma aposta forte na formação e venda de jogadores, não na compra de jogadores», como tem acontecido em Portugal, muitas das vezes com resultados duvidosos.(notícia publicada na edição de oito Abril do semanário de Coimbra CP, para o qual vendo o meu trabalho) Ps.s.: Isto não é embirração com o homem. É mesmo só para palavrar e desopilar palavras. Fazer um bocadinho de exercício a corta-mato, sem ser numa pista plana a direito a bater recordes de velocidade aos cem metros.

É frequente, em entrevistas, principalmente em entrevistas televisivas ou radiofónicas, ouvirem-se as maiores barbaridades “en passant”, sem darmos muito por elas como se apenas fizessem cócegas no ouvido, ou, ouvindo-as com alguma atenção, rapidamente as esquecemos porque as colocamos no “arquivo” dos lapsos do entrevistado, que, coitado, deve ter sido apanhado de surpresa, não era bem aquilo que ele queria dizer mas isto, porque também não é pêra doce ser entrevistado por jornalistas, muito menos é frequente gente com capacidade de improvisação e ao mesmo tempo qualidade de exposição verbal, no imediato: “olhe, então diga lá vôscência o que é que pensa disto e daquilo, e mais aquilo?”. Assim de chofre é fácil a escorregadela para a asneira. Asneira que não tem necessariamente de ser sinónimo de erro. Pode ser somente sinceridade desbocada, ou deslocada. Ou outra coisa qualquer.Seja com for, um caso semelhante ouvi e vi há pouco na TV, num programa dedicado a promover o Europeu de Futebol cá na terra. Um tipo entrevistava o filho que todas as mães gostavam de ter: Luís Figo, o nosso herói desportivo, modelo incensado de ponderação e virtude, dentro e fora dos relvados, pai de família extremado: O gajo certinho. Tudo no sítio como deve ser. O rapaz do microfone perguntou a certo ponto o que é que Figo sentia ao ser uma bandeira nacional. Como é que é ser uma bandeira deste país? O futebolista encolheu o sobrolho e os ombros num trejeito de humildade e envergonhada modéstia, que não se sentia minimamente uma bandeira de Portugal. Ena pá que grande responsabilidade está este gajo agora a meter-me nos ombros. Seria este o raciocínio se Figo não estivesse habituado a responder a esta pergunta, que por estas alturas de selecção deve ser das interrogações mais frequentes. Destas ou parecidas, mas que desembocariam sempre no mesmo padrão, ou modelo, de resposta. Ninguém neste mundo, aliás, consegue arranjar do pé para a mão e num curto espaço de tempo (esta do espaço de tempo tem que se lhe diga…) dezenas de respostas iguais para a mesma pergunta. E Figo, mesmo não pensando no universo restrito do futebol, da respectiva tribo, mas indo para o mais vasto universo mediático do desporto e do espectáculo, é sem dúvida dos indivíduos mais inteligentes que por ali aparecem. Na pantalha, vá lá.Daí que me tenha espantado a restante resposta do atleta, que ainda agora estou para ver se arquivo na pasta das “gaffes inocentes” ou das dos “lapsus linguae”, no sector das coisas sem importância e com o carimbo «Para Esquecer Porque O Gajo Nem Sequer Pensou No Que Disse, De Certeza». Portanto, num contexto de exaltação patriótica, do apelo constante, pelos políticos, pelos engravatados todos da bola e dos partidos que aplaudem o circo, por comentadores e jornalistas, até as cabinas telefónicas em Lisboa andam em forma de bola de futebol, uma coisa galvanizante para o país, que nos vai tirar da fossa. O Presidente da República vai pessoalmente ao sítio onde a briosa Selecção de Todos Nós está a estagiar para o torneio que se aproxima, em visita oficial e de Estado, com a esposa, para encorajar e moralizar a rapaziada. Andam os táxis quase todos, pelo menos é o que me parece aqui em Almada, com bandeiras portuguesas ao vento. Faltam seis dias! Uma nação em suspense! Ena pá dois mil! Enfim, é este o contexto, e isto é só palavrar, para treinar as diferentes formas do português e a escrita, por isso não abrevio.Que não senhor, com aquele ar grave e sincero (do estilo: porra, eu comprava um carro em segunda-mão a este gajo, carago), não me sinto nada a bandeira de Portugal. Sou apenas uma pessoa que tenta dar o máximo para cumprir com as suas responsabilidades profissionais. Sou profissional, e é o que faço, dar o meu melhor em termos profissionais. Em suma, e só, foi isto. O rapaz vai enfrentar as tribos estrangeiras por motivações profissionais. Não são patrióticas nem idealistas, são profissionais, porque o rapaz é um grande profissional. Profissional de alguém que exerce uma profissão e é pago a peso de ouro para isso. Epá, se calhar não é nada, mas as palavras do rapaz, que foram mais explícitas, de resto, que as aqui roufenhamente transcritas, fizeram-me uma certa comichão, a mim, que não concordo com nada destas merdas do euro e dos novos estádios, acho tudo uma pegada estupidez para um país como este está. Mas pronto, esqueça-se a conjuntura, adoro que a nossa selecção nacional de futebol jogue bem e ganhe, e também adoro um bom jogo de futebol em geral, e adoro ainda mais jogar um bom (ou mau) jogo de futebol, e tenho uns tiques nacionalistas esquisitos. E foda-se, o gajo é um dos meus ídolos do estádio, o Méne!, o nosso menino, o Fundação Luís Figo, e está-me para ali a confessar que é um reles mercenário? Ora gaita ou bolas. Também não é porque eu estivesse à espera que o homem disse-se bem eu cá sou um patriota e um cidadão interessado e como tal vou comer relva para dar uma alegria aos portugueses e ao gajo do palavrar em particular. Nada disso. Mas podia ter sido uma coisa a meio termo. A meio caminho.A este despropósito, lembrei-me de um fórum de dois dias recente que acompanhei aqui em Lisboa, sobre Futebol Gestão e Paixão, coisa em grande e séria com direito a Governo de Portugal, da Liga, da federação e do Real Madrid e etc. na sessão de encerramento. Na de abertura também falaram uns figurões de gravata. Depois foi um desfiar de economistas, contabilistas e gestores, dirigentes e pensadores do fenómeno da ripanarápaqueca, intelectuais da bola e do liberalismo ex-capitalismo, juntos a pensar dois dias, com o contributo de alguns jornalistas especializados. Um dos oradores de gravata, a inevitável gravata, profissional look power point modernaço representava a empresa que geria a carreira profissional do Figo, a imagem do Figo, o marketing do Figo, os contratos do Figo, a agenda do Figo, as gravatas do Figo e muitas coisas mais do Figo, Figo que mais parecia uma SA, ou uma SAD, ou uma SARL, ou, mais elegante e poderoso, uma Corp. de Corporation ou Ind. De Industries, sendo o cavalheiro do Fórum respectivo membro do Conselho de Administração, com o pelouro dos Fóruns. Esta foi das intervenções que achei mais interessantes e enriquecedoras, para perceber o nível de profissionalização a que chegou realmente o futebol (calma patriotas! Lá fora, lá fora! que o Figo é pioneiro e ainda “case study” em Portugal no que respeita a este patamar de negócio e dinheiro, Portugal, foi outra das lições que retive daquele seminário, é ainda um aprendiz, um patético aprendiz, que está a levar o barco do futebol à bancarrota, ao fundo, sim, ao fundo, se não se aplicam reformas de alto a baixo no sistema, sem aspas, cortando nas despesas faraónicas e irrealistas e aumentando as receitas. Como? Tivessem assistido ao seminário, mas basicamente é isso: cortar despesas, diminuir salários, valores contratuais, cláusulas de rescisão, etc., e aumentar receitas como se passa a explicar, de resto e para atalhar este parágrafo, na notícia que escrevi na ocasião para o jornal, e que tomo a liberdade de colocar em post scriptum que é: ps.:. É esta a receita, meus senhores! E já pareço um teórico do futebol e até já parece que isto tem tudo muita importância real e significativa nas nossas vidas concretas) e, mais alargadamente, o espectáculo e o entretenimento. Um parágrafo difícil de ler depois, temos que Figo, por exemplo, que começou a jogar à bola no Pastilhas aqui mais ou menos ao lado de minha casa, ali para baixo na Cova da Piedade, tem hoje em dia o passe estimado em 180 milhões de euros, menos milhão mais milhão, e isto é só valor futebolístico intrínseco, depois há o valor extrínseco, aquele que não se apalpa ou se pontapeia, como a barba do Figo ou falta dela, a pinta do Figo, o sex appeall do Figo, o sorriso do Figo, que vai dar nas swetters do Figo, canecas e cachecóis do Figo, video-games do Figo, ténis da Nike e tudo isso. Portanto, o Figo é mesmo uma SA ou em rigor uma SPA Sociedade Pouco Anónima e tem dinheiro suficiente para ter uma carrada de tipos muito profissionais a pensar e a decidir melhor que ele e por ele a sua carreira, as suas gravatas, a sua agenda, o penteado da belíssima e amantíssima barbie-esposa, e tudo isso, etc.. Enfim, um mundo Figo! Figo Corporation! Tudo muito calculadinho, tudo muito últimos gritos da gestão e promoção de um “ídolo”, tudo muito profissional, em suma. De resto, estava agora a aqui a ver nos apontamentos, a dissertação do gestor da empresa que gere o Figo chamava-se “A criação de uma celebridade – a indústria das celebridades”. Já lhe subiu à cabeça.ps.:Mais gestão e menos paixão no dirigismo desportivoNovos figurinos para o futebolCom uma ou outra nuance, todos concordam no essencial dos problemas do futebol nacional no que toca à sua componente gestionária. De Valentim Loureiro a Gilberto Madail, passando por uma mão cheia de economistas e gestores profissionais, pelo vice-presidente do Futebol Clube do Porto, Fernando Gomes, ou por exemplos de fora, como o relatado por Florentino Peres, presidente do “galáctico” Real Madrid. Todos concordam que o futebol não pode continuar a dar passos maiores que as pernas e que tem de assumir como sua a máxima «quem não tem dinheiro não tem vícios». Ou como sublinhou o mesmo dirigente portista no Fórum Nacional – Futebol Gestão e Paixão, que decorreu em Lisboa, «o grande problema do futebol não é o aumento de receitas, mas a contenção das despesas».Reunindo dezenas de dirigentes do mundo da bola, esta jornada promovida pela Associação Portuguesa de Management, não se limitou a apresentar diagnósticos, contribuindo com soluções para um equilíbrio minimamente razoável entre a “suicidária” paixão e o racional profissionalismo no que se refere à gestão dos clubes e competições de futebol, regra geral entregue a voluntariosos dirigentes endinheirados que de gestão do fenómeno futebolístico têm apenas vagas noções, apesar deste ser hoje uma verdadeira indústria que em Portugal, só na Super Liga, movimentou receitas da ordem dos 219 milhões de euros em 2001/02 (por curiosidade, refira-se que a milionária Premier League britânica envolveu no mesmo ano nada menos que 1 bilião e 748 mil euros…), segundo dados da multinacional de consultadoria Deloitte&Touche, ali apresentados. Deste volume de receitas, por outro lado, 70% cabem aos quatro grandes (Porto, Sporting, Benfica e Boavista), quando a Liga tem 18 equipas – segundo a empresa, «a receita agregada dos 4 Grandes foi de aproximadamente 151 milhões de euros, sendo que as outras 14 equipas geraram os restantes 68 milhões de euros, ou seja, menos de 25% do total das receitas contabilizadas». O problema é que, parecendo muito, estes números traduzem um desequilíbrio enorme relativamente aos custos, bastando constatar que, como sublinhou Hélder Varandas, da Deloitte, «só os custos com pessoal (na Super Liga) aumentaram 68% nas últimas cinco épocas, atingindo 134 milhões de euros na última época». Por outro lado, «a evolução dos resultados (financeiros) também não é animadora. Nos últimos cinco anos nunca houve resultados líquidos positivos» em termos globais, frisou, atribuindo isto a três principais ordens de factores: concentração da actividade nos três grandes, sobreendividamento e descapitalização na generalidade dos clubes e um «deficit estrutural» da “indústria” do pontapé na bola.Soluções. Para além das aparentemente óbvias, como a preconizada pelo secretário de Estado Hermínio Loureiro, «uma gestão rigorosa e responsável», para os peritos da Deloitte, estas passarão por três vectores: «alteração do modelo competitivo»; «alteração do modelo de remunerações dos agentes desportivos», designadamente jogadores; e «aposta na formação». Quanto à primeira sugestão, que compreende principalmente a redução do número de clubes nas principais ligas, parece haver consenso, quer da parte do presidente da Federação, que se revelou «absolutamente favorável a que se faça a redução, não só nas ligas profissionais mas também nas supostamente amadoras, na 2ª B, na 3ª, nos distritais, o futebol português tem de emagrecer todo, de alto a baixo», preconizou, quer da parte de Fernando Gomes, que também defendeu a redução, apesar de frisar a salvaguarda dos clubes ditos pequenos nesse corte.Hélder Varandas, porém, foi mais longe, apresentado um plano concreto de viabilização económica do futebol nacional em torno daqueles três vectores. A ver: a redução do futebol profissional para apenas 20 equipas, criando-se duas Ligas com 10 clubes cada. As primeiras dez constituiriam uma Super Liga disputada a quatro voltas, e as segundas uma Liga de Honra, igualmente a quatro rondas, procedendo-se ao «fecho» mais rigoroso das duas Ligas, com a promoção e despromoção apenas de uma equipa, tudo isto conjugado com uma «selecção rigorosa das equipas» que participem nas competições profissionais. Daqui resultaria, defendeu, um substancial aumento das receitas correntes e uma distribuição mais equitativa das mesmas, clubes com orçamentos mais equilibrados e um aumento da competitividade. No que toca à componente salarial, defende a Deloitte que esta deverá ser decomposta em duas vertentes, fixa e variável, esta última em função dos resultados financeiros do clube/empresa, e não dos resultados desportivos. Quanto à formação, advogou ser fundamental «recrutar e formar talentos a preços competitivos», assumindo-os como «futura fonte adicional de receitas». «Deverá ser colocada uma aposta forte na formação e venda de jogadores, não na compra de jogadores», como tem acontecido em Portugal, muitas das vezes com resultados duvidosos.(notícia publicada na edição de oito Abril do semanário de Coimbra CP, para o qual vendo o meu trabalho) Ps.s.: Isto não é embirração com o homem. É mesmo só para palavrar e desopilar palavras. Fazer um bocadinho de exercício a corta-mato, sem ser numa pista plana a direito a bater recordes de velocidade aos cem metros.

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