RSF denuncia cultura da impunidadeRégis Bourgeat (*)Os jornalistas brasileiros estão pagando caro pelo exercício da liberdade de imprensa. O assassinato de Tim Lopes, da TV Globo, no início de junho de 2002, em um subúrbio do Rio de Janeiro, é uma clara demonstração dessa realidade. Mas esse crime o assassinato de um jornalista de uma importante rede de televisão, morto por uma organização criminal em uma das maiores cidades do país não constitui uma imagem representativa da violência da qual a imprensa é tradicionalmente vítima no Brasil.Na verdade, dos 15 jornalistas assassinados no país desde 1991, a maioria trabalhava para pequenas publicações ou rádios de cidades do interior. Eles pagaram com a vida as revelações que fizeram sobre fraudes cometidas por políticos locais e atos de extorsão praticados por membros da polícia. Contrariamente ao caso de Tim Lopes, em que os assassinos acabaram sendo presos apesar de contarem com a cumplicidade de policiais, quase todos esses crimes permaneceram impunes.Essa impunidade conduz ao questionamento sobre a organização do poder judiciário no país. Na condição de Federação, o Brasil é regido por uma Constituição que confere amplos poderes aos 26 Estados e ao Distrito Federal que o compõem, em particular na área da Justiça. Assim, o assassinato de um jornalista é da competência exclusiva da justiça dos Estados, mais sensível a pressões locais, e da Polícia Civil, controlada pelos políticos locais.Só no Estado da Bahia, 10 jornalistas foram assassinados entre 1991 e 1998, na maioria das vezes por razões políticas. Manuel Leal de Oliveira, diretor do jornal semanal A Região, de Itabuna, foi a vítima do mais recente desses crimes. Todos esses delitos continuam, até hoje, impunes.Com um território pouco maior que o da França, a Bahia continua vivendo, no plano político, sob um regime feudalista anacrônico. Quarto estado brasileiro no ranking econômico, a Bahia atravessou, a partir dos anos 70, além dos problemas nacionais, uma grave crise agrícola. No apogeu dessa crise, Antonio Carlos Magalhães, cacique político onipotente da Bahia e figura dominante da direita brasileira (PFL, Partido da Frente Liberal), consolidou seu poderio pessoal e familiar sobre seu vasto feudo baiano. Foi nesse contexto que Manuel Leal de Oliveira foi assassinado, no dia 14 de janeiro de 1998, em Itabuna, município situado a 450 km ao sul de Salvador.Os primeiros meses do inquérito, sob a responsabilidade da Polícia Civil da Bahia, constituem um verdadeiro símbolo em matéria de impunidade: uma testemunha foi assassinada, os álibis dos suspeitos foram apenas superficialmente verificados, testemunhas importantes nem sequer foram ouvidas. Em setembro de 1998, o caso Manuel Leal de Oliveira foi "arquivado" pela Justiça de Itabuna, sem que nenhum suspeito tenha sido preso e sem que Fernando Gomes, considerado o principal instigador do crime, tenha prestado depoimento. Prefeito de Itabuna na época, Fernando Gomes é aliado político de Antonio Carlos Magalhães.fonte: Observatório da Imprensa
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RSF denuncia cultura da impunidadeRégis Bourgeat (*)Os jornalistas brasileiros estão pagando caro pelo exercício da liberdade de imprensa. O assassinato de Tim Lopes, da TV Globo, no início de junho de 2002, em um subúrbio do Rio de Janeiro, é uma clara demonstração dessa realidade. Mas esse crime o assassinato de um jornalista de uma importante rede de televisão, morto por uma organização criminal em uma das maiores cidades do país não constitui uma imagem representativa da violência da qual a imprensa é tradicionalmente vítima no Brasil.Na verdade, dos 15 jornalistas assassinados no país desde 1991, a maioria trabalhava para pequenas publicações ou rádios de cidades do interior. Eles pagaram com a vida as revelações que fizeram sobre fraudes cometidas por políticos locais e atos de extorsão praticados por membros da polícia. Contrariamente ao caso de Tim Lopes, em que os assassinos acabaram sendo presos apesar de contarem com a cumplicidade de policiais, quase todos esses crimes permaneceram impunes.Essa impunidade conduz ao questionamento sobre a organização do poder judiciário no país. Na condição de Federação, o Brasil é regido por uma Constituição que confere amplos poderes aos 26 Estados e ao Distrito Federal que o compõem, em particular na área da Justiça. Assim, o assassinato de um jornalista é da competência exclusiva da justiça dos Estados, mais sensível a pressões locais, e da Polícia Civil, controlada pelos políticos locais.Só no Estado da Bahia, 10 jornalistas foram assassinados entre 1991 e 1998, na maioria das vezes por razões políticas. Manuel Leal de Oliveira, diretor do jornal semanal A Região, de Itabuna, foi a vítima do mais recente desses crimes. Todos esses delitos continuam, até hoje, impunes.Com um território pouco maior que o da França, a Bahia continua vivendo, no plano político, sob um regime feudalista anacrônico. Quarto estado brasileiro no ranking econômico, a Bahia atravessou, a partir dos anos 70, além dos problemas nacionais, uma grave crise agrícola. No apogeu dessa crise, Antonio Carlos Magalhães, cacique político onipotente da Bahia e figura dominante da direita brasileira (PFL, Partido da Frente Liberal), consolidou seu poderio pessoal e familiar sobre seu vasto feudo baiano. Foi nesse contexto que Manuel Leal de Oliveira foi assassinado, no dia 14 de janeiro de 1998, em Itabuna, município situado a 450 km ao sul de Salvador.Os primeiros meses do inquérito, sob a responsabilidade da Polícia Civil da Bahia, constituem um verdadeiro símbolo em matéria de impunidade: uma testemunha foi assassinada, os álibis dos suspeitos foram apenas superficialmente verificados, testemunhas importantes nem sequer foram ouvidas. Em setembro de 1998, o caso Manuel Leal de Oliveira foi "arquivado" pela Justiça de Itabuna, sem que nenhum suspeito tenha sido preso e sem que Fernando Gomes, considerado o principal instigador do crime, tenha prestado depoimento. Prefeito de Itabuna na época, Fernando Gomes é aliado político de Antonio Carlos Magalhães.fonte: Observatório da Imprensa