O blog do Manelito Caracol !: A sequela.

23-05-2009
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  Este texto já aqui foi publicado, mas hoje, não sei bem porquê, fez mais sentido do que nunca. Para ouvir, enquanto lê:   Quantos de nós merecerão um óscar? Vinha a pensar nisto no caminho para Lisboa. Música alta, pensamentos livres, telas feitas de vidros, paisagens cinzentas de verde esbatidas, casas perdidas, algumas gotas de chuva a salpicar o parabrisas, tranquilidade também, não muita, apenas a necessária para realizar o meu filme. As cenas seguiram-se rapidamente na minha cabeça. Uma mulher perdida, choro de alguém, um papagaio de papel, tiros, melancolia, gritos, um rio, um homem de barba grisalha, um carro que pára no meio da estrada, luzes, nevoeiro, música , sorrisos, reencontro, fim. Criei assim o filme à minha maneira, fora da minha vida, rebuscando clichés, frases célebres de outrora, personagens já mortas e reinventadas. Não me importei com as personagens, com os protagonistas sedentos de fama, com a luz da fotografia nem sequer com os efeitos especiais ou com a beleza do guarda-roupa. Apenas a história me interessava. A minha história. Aquela que eu quis criar, imaginando-a à pressa para montar o meu espectáculo enquanto os cenários iam sendo ocupados, utilizados e morrendo lá atrás, no fim da estrada. Quando a ficha técnica me subia nos olhos e eu suspirava de orgulho, dei comigo a pensar se seria merecedor de um prémio da academia. Melhor realização, talvez melhor argumento original, quem sabe melhor interpretação. Nada. Nenhum. Impossível. O meu filme não era real. É estranho pensar assim, mas arrisquei-me a fazê-lo. Quantos de nós, nos nossos filmes reais a quem dão o nome de vida, andarão a interpretar um personagem, a seguir um papel? Quantos fingirão o sorriso quando o olhos da alma lhe choram? Quantos andarão perdidos nas entrelinhas dos guiões? Quantos não fingem? Quantos não serão actores dignos de óscares e condecorações? Os filmes reais não são fáceis. Não há momentos para cortes, para um refresco debaixo do toldo enquanto os aderecistas montam o cenário, as cenas não se podem repetir (apenas se assim tiver de ser), são gravados à primeira sem nenhum tipo de preparação, sem duplos, sem almofadas ou colchões para nos amparar as quedas. O sangue é de verdade e as dores também. Esqueçam o saquinho de tinta vermelha ou o croma azul que transforma um cenário todo azul numa varanda doirada por cima do Central Park. Nos filmes reais as lágrimas são a sério, salgadas, sentidas, desfeitas quando a mão as trava. Nesse mundo não há só finais felizes, casamentos de sonho ou paixões à primeira vista. No mundo dos filmes reais há dores, tristezas, angústias, tragédias, sonhos interrompidos e gente esperançada. Há ainda protagonistas simples que dividem as suas histórias, gente bonita, gente feia e normal, há medos, desejos, alegrias e sonhos. E os protagonistas desses filmes? Saberão eles que estão no meio de uma história assim? Muitos sim, tal como eu, e até fingem para a câmara na esperança pela conquista de um prémio de interpretação. Já os outros, aqueles mais distraídos, continuam perdidos nas suas histórias até que, sem darem conta, a vida lhes é interrompida pelo clássico "the end"... E depois disso não há mais nada a fazer. Poderá ainda haver uma sequela, uma parte dois, mas todos nós sabemos que as continuações nunca são tão boas como o filme original...


  Este texto já aqui foi publicado, mas hoje, não sei bem porquê, fez mais sentido do que nunca. Para ouvir, enquanto lê:   Quantos de nós merecerão um óscar? Vinha a pensar nisto no caminho para Lisboa. Música alta, pensamentos livres, telas feitas de vidros, paisagens cinzentas de verde esbatidas, casas perdidas, algumas gotas de chuva a salpicar o parabrisas, tranquilidade também, não muita, apenas a necessária para realizar o meu filme. As cenas seguiram-se rapidamente na minha cabeça. Uma mulher perdida, choro de alguém, um papagaio de papel, tiros, melancolia, gritos, um rio, um homem de barba grisalha, um carro que pára no meio da estrada, luzes, nevoeiro, música , sorrisos, reencontro, fim. Criei assim o filme à minha maneira, fora da minha vida, rebuscando clichés, frases célebres de outrora, personagens já mortas e reinventadas. Não me importei com as personagens, com os protagonistas sedentos de fama, com a luz da fotografia nem sequer com os efeitos especiais ou com a beleza do guarda-roupa. Apenas a história me interessava. A minha história. Aquela que eu quis criar, imaginando-a à pressa para montar o meu espectáculo enquanto os cenários iam sendo ocupados, utilizados e morrendo lá atrás, no fim da estrada. Quando a ficha técnica me subia nos olhos e eu suspirava de orgulho, dei comigo a pensar se seria merecedor de um prémio da academia. Melhor realização, talvez melhor argumento original, quem sabe melhor interpretação. Nada. Nenhum. Impossível. O meu filme não era real. É estranho pensar assim, mas arrisquei-me a fazê-lo. Quantos de nós, nos nossos filmes reais a quem dão o nome de vida, andarão a interpretar um personagem, a seguir um papel? Quantos fingirão o sorriso quando o olhos da alma lhe choram? Quantos andarão perdidos nas entrelinhas dos guiões? Quantos não fingem? Quantos não serão actores dignos de óscares e condecorações? Os filmes reais não são fáceis. Não há momentos para cortes, para um refresco debaixo do toldo enquanto os aderecistas montam o cenário, as cenas não se podem repetir (apenas se assim tiver de ser), são gravados à primeira sem nenhum tipo de preparação, sem duplos, sem almofadas ou colchões para nos amparar as quedas. O sangue é de verdade e as dores também. Esqueçam o saquinho de tinta vermelha ou o croma azul que transforma um cenário todo azul numa varanda doirada por cima do Central Park. Nos filmes reais as lágrimas são a sério, salgadas, sentidas, desfeitas quando a mão as trava. Nesse mundo não há só finais felizes, casamentos de sonho ou paixões à primeira vista. No mundo dos filmes reais há dores, tristezas, angústias, tragédias, sonhos interrompidos e gente esperançada. Há ainda protagonistas simples que dividem as suas histórias, gente bonita, gente feia e normal, há medos, desejos, alegrias e sonhos. E os protagonistas desses filmes? Saberão eles que estão no meio de uma história assim? Muitos sim, tal como eu, e até fingem para a câmara na esperança pela conquista de um prémio de interpretação. Já os outros, aqueles mais distraídos, continuam perdidos nas suas histórias até que, sem darem conta, a vida lhes é interrompida pelo clássico "the end"... E depois disso não há mais nada a fazer. Poderá ainda haver uma sequela, uma parte dois, mas todos nós sabemos que as continuações nunca são tão boas como o filme original...

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