por Pedro BingreRecomendo a todos aqueles que se preocupam com o território e com a economia de Portugal a leitura do editorial e do importante artigo publicados nesta semana na revista Economist, a respeito do "crash" iminente do mercado imobiliário.Permitam-me que cite o remate daquele editorial: "Toda a economia mundial está em perigo. O FMI avisou que assim como o aumento dos preços da habitação foi um fenómeno global, também a sua queda deverá ser sincronizada, e os seus efeitos sentidos por todos. O 'boom' imobiliário foi divertido enquanto durou, mas a verdade é que o maior aumento de riqueza de toda a História não passou de uma ilusão." O artigo seguinte adverte ainda : "[O recente aumento do preço das casas] não só ultrapassou largamente quaisquer bolhas imobiliárias anteriores, como chega a ser maior do que as bolhas accionistas americanas dos finais dos anos 1990 e dos finais dos anos 1920. Por outras palavras, trata-se da maior bolha especulativa da História".Portugal, nisto como em tantos outros assuntos, continua na vanguarda da retaguarda. Atrás do progresso e à frente da crise. Fomos o país com menor controle jurídico e tributário da especulação imobiliária, menor restrição à construção de novos fogos, e agora colheremos os efeitos de toda essa falta de previdência: sofreremos mais com a crise que aí vem do que os nossos congéneres.Em "posts" anteriores havia comentado os excessos da especulação imobiliária no nosso país, que graças à falta de regulação jurídica atingiu proporções mais graves do que nos restantes países ocidentais. Com efeito, apesar de o "boom" imobiliário ter sido comum a todo o Ocidente desde os finais da década de 90 até aos nossos dias, criando um empolamento artificial dos preços e um aumento ilusório da riqueza, Portugal foi o único país onde a construção de novas habitações excedeu largamente as necessidades habitacionais efectivas. Construiu-se para saciar a procura especulativa e não a procura habitacional, que era muitíssimo menor.No instante em que os milhares de proprietários que açambarcam especulativamente imóveis desocupados quiserem reaver a liquidez do seu capital, vendendo a casa a quem a deseje de facto habitar, hão-de constatar que não existem compradores-habitantes em número suficiente para adquirir todos os imóveis. Há centenas de milhar de fogos habitacionais novos em Portugal que nunca tiveram, nem nunca vão ter, quem neles resida. E a má notícia para os especuladores é que a escassa procura para habitação deixará de ser compensada pela procura para especulação, ou seja: cairá dramaticamente a procura agregada de imóveis e o enorme excesso de oferta encarregar-se-á de fazer baixar os preços. É o fim do regabofe imobiliário. E é o princípio de uma gravíssima crise estrutural: o imobiliário e a construção civil foram o motor da economia, da política e da sociedade portuguesas. Um motor ineficiente, poluente, e incapaz de galgar a ladeira do desenvolvimento real - mas mesmo assim foi o único motor que usámos.Há anos que os analistas previam este desfecho. Todavia, os decisores públicos nacionais e locais que tutelavam o sector estiveram demasiado inebriados com as fortunas fáceis e parasitárias oferecidas pelos alvarás de loteamento, pelas expansões urbanas, e pela falta de legislação anti-especulatória.Volta, conde de Avranches: acabou-se o fartar da vilanagem.
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por Pedro BingreRecomendo a todos aqueles que se preocupam com o território e com a economia de Portugal a leitura do editorial e do importante artigo publicados nesta semana na revista Economist, a respeito do "crash" iminente do mercado imobiliário.Permitam-me que cite o remate daquele editorial: "Toda a economia mundial está em perigo. O FMI avisou que assim como o aumento dos preços da habitação foi um fenómeno global, também a sua queda deverá ser sincronizada, e os seus efeitos sentidos por todos. O 'boom' imobiliário foi divertido enquanto durou, mas a verdade é que o maior aumento de riqueza de toda a História não passou de uma ilusão." O artigo seguinte adverte ainda : "[O recente aumento do preço das casas] não só ultrapassou largamente quaisquer bolhas imobiliárias anteriores, como chega a ser maior do que as bolhas accionistas americanas dos finais dos anos 1990 e dos finais dos anos 1920. Por outras palavras, trata-se da maior bolha especulativa da História".Portugal, nisto como em tantos outros assuntos, continua na vanguarda da retaguarda. Atrás do progresso e à frente da crise. Fomos o país com menor controle jurídico e tributário da especulação imobiliária, menor restrição à construção de novos fogos, e agora colheremos os efeitos de toda essa falta de previdência: sofreremos mais com a crise que aí vem do que os nossos congéneres.Em "posts" anteriores havia comentado os excessos da especulação imobiliária no nosso país, que graças à falta de regulação jurídica atingiu proporções mais graves do que nos restantes países ocidentais. Com efeito, apesar de o "boom" imobiliário ter sido comum a todo o Ocidente desde os finais da década de 90 até aos nossos dias, criando um empolamento artificial dos preços e um aumento ilusório da riqueza, Portugal foi o único país onde a construção de novas habitações excedeu largamente as necessidades habitacionais efectivas. Construiu-se para saciar a procura especulativa e não a procura habitacional, que era muitíssimo menor.No instante em que os milhares de proprietários que açambarcam especulativamente imóveis desocupados quiserem reaver a liquidez do seu capital, vendendo a casa a quem a deseje de facto habitar, hão-de constatar que não existem compradores-habitantes em número suficiente para adquirir todos os imóveis. Há centenas de milhar de fogos habitacionais novos em Portugal que nunca tiveram, nem nunca vão ter, quem neles resida. E a má notícia para os especuladores é que a escassa procura para habitação deixará de ser compensada pela procura para especulação, ou seja: cairá dramaticamente a procura agregada de imóveis e o enorme excesso de oferta encarregar-se-á de fazer baixar os preços. É o fim do regabofe imobiliário. E é o princípio de uma gravíssima crise estrutural: o imobiliário e a construção civil foram o motor da economia, da política e da sociedade portuguesas. Um motor ineficiente, poluente, e incapaz de galgar a ladeira do desenvolvimento real - mas mesmo assim foi o único motor que usámos.Há anos que os analistas previam este desfecho. Todavia, os decisores públicos nacionais e locais que tutelavam o sector estiveram demasiado inebriados com as fortunas fáceis e parasitárias oferecidas pelos alvarás de loteamento, pelas expansões urbanas, e pela falta de legislação anti-especulatória.Volta, conde de Avranches: acabou-se o fartar da vilanagem.