O Cachimbo de Magritte: Curso de literatura pátria em cinco dias

05-08-2010
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Da outra margem, Paulo Pinto demanda a raça cavaquista por entre as brumas dos Lusíadas. Parece que a não topou - só cavalos mouros. Nos comentários, a Maria João Pires e a Fernanda Câncio exortam-no a ir ao Gil Vicente, quiçá mais longe.Talvez "se mais mundos houvera, lá chegara", mas a malta de esquerda é muito conservadora. Ó camaradas, autos não sei de quê? "Ai Deus e u é"? Mas porque não ides aos founding fathers da nossa modernidade republicana e socialista? (Esta foi boa, em estrangeiro. Câncio vai gostar.)Olhem, o Antero de Quental, por exemplo. Aqui vai: "Logo na época romana aparecem os caracteres essenciais da raça peninsular: espírito de independência local e originalidade do génio inventivo. (...) A tolerância pelos mouros e pelos judeus, raças infelizes e tão meritórias, será sempre uma das glórias do sentimento cristão da Península da Idade Média. A caridade triunfava das repugnâncias e preconceitos de raça e de crença. (...) Esta é a tendência do século: esta deve também ser a nossa. Somos uma raça decaída por ter rejeitado o espírito moderno: regenerar-nos-emos abraçando francamente esse espírito" (Causas da Decadência dos Povos Peninsulares, 1871) .Ou o Eça, mesmo na fase descendente: "- Tem muita raça, exclamou o Titó. - E é o que o salva dos defeitos. (...) Tem a raça que o salva. (...) - Sabem vocês quem ele me lembra? (...) Até aquela antiguidade de raça, aqui pegada à sua velha Torre, há mil anos... Até agora aquele arranque para África... Assim todo completo, com o bem, com o mal, sabem vocês quem ele me lembra? - Quem?... - Portugal" (A Ilustre Casa de Ramires, 1900).O Teófilo Braga era um chato, mas era o Pai da Pátria na Primeira República. Também serve: "País estabelecido por uma raça sofredora e resistente sobre a orla ocidental de Espanha, e em contacto activo com o Atlântico, o mar é a paisagem suprema. Se toda a nossa história, independência nacional e descobrimentos derivam do mar, que nunca foi para Portugal barreira defensiva, mas prolongamento do território e caminho de acção, a nossa vida sentimental e poética encontra no mar a mais profunda inspiração poética, como se patenteia nos Lusíadas" (in Serões, 31, 1907).Eis pois, camaradas, um florilégio de ditos dos nossos maiores que fareis bem em meditar. Tende presente o nacionalismo néscio e o ímpio imperialismo de tais sentenças quando festejardes o centenário da República, de ora a dois anos. E Pinto, o fero Pinto que não quer ser cambiado por cavalo, não dê jamais razão a Cavaco. A mocidade portuguesa pode não ler o Teófilo ou o Antero, mas, ah!, por Deus (ou por deus, se vos apraz) , sabe bem quantos cantos tem a gesta.


Da outra margem, Paulo Pinto demanda a raça cavaquista por entre as brumas dos Lusíadas. Parece que a não topou - só cavalos mouros. Nos comentários, a Maria João Pires e a Fernanda Câncio exortam-no a ir ao Gil Vicente, quiçá mais longe.Talvez "se mais mundos houvera, lá chegara", mas a malta de esquerda é muito conservadora. Ó camaradas, autos não sei de quê? "Ai Deus e u é"? Mas porque não ides aos founding fathers da nossa modernidade republicana e socialista? (Esta foi boa, em estrangeiro. Câncio vai gostar.)Olhem, o Antero de Quental, por exemplo. Aqui vai: "Logo na época romana aparecem os caracteres essenciais da raça peninsular: espírito de independência local e originalidade do génio inventivo. (...) A tolerância pelos mouros e pelos judeus, raças infelizes e tão meritórias, será sempre uma das glórias do sentimento cristão da Península da Idade Média. A caridade triunfava das repugnâncias e preconceitos de raça e de crença. (...) Esta é a tendência do século: esta deve também ser a nossa. Somos uma raça decaída por ter rejeitado o espírito moderno: regenerar-nos-emos abraçando francamente esse espírito" (Causas da Decadência dos Povos Peninsulares, 1871) .Ou o Eça, mesmo na fase descendente: "- Tem muita raça, exclamou o Titó. - E é o que o salva dos defeitos. (...) Tem a raça que o salva. (...) - Sabem vocês quem ele me lembra? (...) Até aquela antiguidade de raça, aqui pegada à sua velha Torre, há mil anos... Até agora aquele arranque para África... Assim todo completo, com o bem, com o mal, sabem vocês quem ele me lembra? - Quem?... - Portugal" (A Ilustre Casa de Ramires, 1900).O Teófilo Braga era um chato, mas era o Pai da Pátria na Primeira República. Também serve: "País estabelecido por uma raça sofredora e resistente sobre a orla ocidental de Espanha, e em contacto activo com o Atlântico, o mar é a paisagem suprema. Se toda a nossa história, independência nacional e descobrimentos derivam do mar, que nunca foi para Portugal barreira defensiva, mas prolongamento do território e caminho de acção, a nossa vida sentimental e poética encontra no mar a mais profunda inspiração poética, como se patenteia nos Lusíadas" (in Serões, 31, 1907).Eis pois, camaradas, um florilégio de ditos dos nossos maiores que fareis bem em meditar. Tende presente o nacionalismo néscio e o ímpio imperialismo de tais sentenças quando festejardes o centenário da República, de ora a dois anos. E Pinto, o fero Pinto que não quer ser cambiado por cavalo, não dê jamais razão a Cavaco. A mocidade portuguesa pode não ler o Teófilo ou o Antero, mas, ah!, por Deus (ou por deus, se vos apraz) , sabe bem quantos cantos tem a gesta.

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