Poema do homem novoNiels Armstrong pôs os pés na Luae a Humanidade saudou neleo Homem Novo.No calendário da História sublinhou-secom espesso traço o memorável feito.Tudo nele era novo.Vestia quinze fatos sobrepostos.Primeiro, sobre a pele, cobrindo-o de alto a baixo,um colante poroso de rede tricotadapara ventilação e temperatura próprias.Logo após, outros fatos, e outros e mais outros,catorze, no total,de película de nylone borracha sintética.Envolvendo o conjunto, do tronco até aos pés,na cabeça e nos braços,confusíssima trama de canaispara circulação dos fluidos necessários,da água e do oxigénio.A cobrir tudo, enfim, como um balão ao vento,um envólucro soprado de tela de alumínio.Capacete de rosca, de especial fibra de vidro,auscultadores e microfones,e, nas mãos penduradas, tentáculos programados,luvas com luz nos dedos.Numa cama de rede, penduradadas paredes do módulo,na majestade augusta do silêncio,dormia o Homem Novo a caminho da Lua.Cá de longe, na Terra, num borborinho ansioso,bocas de espanto e olhos de humidade,todos se interpelavam e falava,do Homem Novo,do Homem Novo,do Homem Novo.Sobre a Lua, Armstrong pôs finalmente os pés.caminhava hesitante e cauteloso,pé aqui,pé ali,as pernas afastadas,os braços insuflados como balões pneumáticos,o tronco debruçado sobre o solo.Lá vai ele.Lá vai o Homem Novomedindo e calculando cada passo,puxando pelo corpo como bloco emperrado.Mais um passo.Mais outro.Num sobre-humano esforçolevanta a mão sapuda e qualquer coisa nela.com redobrado alento avança mais um passo,e a Humanidade inteira, com o coração pequeno e ressequidoviu, com os olhos que a terra há-de comer,o Homem Novo espetar, no chão poeirento da Lua, a bandeira da sua Pátria,exactamente como faria o Homem Velho.in Novos Poemas Póstumos (1990) - António Gedeão
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Poema do homem novoNiels Armstrong pôs os pés na Luae a Humanidade saudou neleo Homem Novo.No calendário da História sublinhou-secom espesso traço o memorável feito.Tudo nele era novo.Vestia quinze fatos sobrepostos.Primeiro, sobre a pele, cobrindo-o de alto a baixo,um colante poroso de rede tricotadapara ventilação e temperatura próprias.Logo após, outros fatos, e outros e mais outros,catorze, no total,de película de nylone borracha sintética.Envolvendo o conjunto, do tronco até aos pés,na cabeça e nos braços,confusíssima trama de canaispara circulação dos fluidos necessários,da água e do oxigénio.A cobrir tudo, enfim, como um balão ao vento,um envólucro soprado de tela de alumínio.Capacete de rosca, de especial fibra de vidro,auscultadores e microfones,e, nas mãos penduradas, tentáculos programados,luvas com luz nos dedos.Numa cama de rede, penduradadas paredes do módulo,na majestade augusta do silêncio,dormia o Homem Novo a caminho da Lua.Cá de longe, na Terra, num borborinho ansioso,bocas de espanto e olhos de humidade,todos se interpelavam e falava,do Homem Novo,do Homem Novo,do Homem Novo.Sobre a Lua, Armstrong pôs finalmente os pés.caminhava hesitante e cauteloso,pé aqui,pé ali,as pernas afastadas,os braços insuflados como balões pneumáticos,o tronco debruçado sobre o solo.Lá vai ele.Lá vai o Homem Novomedindo e calculando cada passo,puxando pelo corpo como bloco emperrado.Mais um passo.Mais outro.Num sobre-humano esforçolevanta a mão sapuda e qualquer coisa nela.com redobrado alento avança mais um passo,e a Humanidade inteira, com o coração pequeno e ressequidoviu, com os olhos que a terra há-de comer,o Homem Novo espetar, no chão poeirento da Lua, a bandeira da sua Pátria,exactamente como faria o Homem Velho.in Novos Poemas Póstumos (1990) - António Gedeão