Partindo do princípio de que quanto mais alta a escolaridade, maior a produtividade, impõe-se a necessidade de criar mais massa crítica na nossa sociedade. Como fazê-lo? revela-se uma questão muito mais difícil do que o mero reduzir aqui e aumentar ali que tem vindo a caracterizar as sucessivas reformas curriculares. Neste sentido, um artigo pelo título de «Pôr os jovens a ler jornais», da pena de Feliciano Barreiras Duarte, Secretário de Estado-Adjunto do Ministro da Presidência (publicado n’O Expresso de 30/10/04, 1º Caderno, pp. 28s.), suscitou-me muitas dúvidas e ainda mais interrogações. A escola é um espaço de aprendizagem bem como de socialização. Exterior à escola existe um meio sociocultural e geográfico que continua a ser um foco inibidor de progressos, apesar do fenómeno da globalização. O nível de literacia do povo português é proporcional aos seus hábitos de leitura. Como combater a falta de hábitos de leitura dos nossos alunos sem sensibilizar as famílias para a aquisição de uma maior bagagem cultural? A interrogação fica suspensa, como ficará suspensa a resposta. Será muito difícil combater séculos de letargia cultural e democrática a que o nosso povo foi sujeito. Quando efectivamente tínhamos meios, humanos e económicos, para superar esse défice, houve uma classe dominante que se impôs e esbanjou ao desbarato recursos preciosos de um país pobre; a Inquisição, por outro lado, estropiou, silenciou e afugentou quem de conhecimento e quando alguém surgiu que pôs algum cobro à situação, apesar de algumas medidas controversas, refiro-me ao Marquês de Pombal, logo foi levado ao exílio interior. O panorama não podia ser pior, se não falássemos no 25 de Abril. Mesmo este deixou muito boa gente de pantanas, sem saber ao certo a definição de democracia. Tem vindo a ser aprendida, mas com muitas dificuldades. A mesma dificuldade perpetua-se nos nossos governantes, que continuam a não fazer o trabalho de casa, preferindo atirar o barro à parede para ver o que dá. Tudo é avulso e mediático, em vez de se estudar, ponderar e reavaliar, esperam-se apenas reacções públicas. Escrevem-se uns artigos para jornais, de preferência com reputação, boa tiragem e publicação. São eles figuras destacadas: ministros, secretários de estado, políticos, professores universitários, e mais um rol deles [não querendo eu ferir susceptibilidades, sendo mais certo que o faça]. As razões das publicações: políticas, auto-promoção, currículo, mas há aqueles que o fazem com seriedade – afinal, nem todos somos iguais. Há ainda aqueles que escrevem coisas interessantes, mas nem descobriram a pólvora, nem dizem nada de novo, muito menos acrescentam matéria relevante para os assuntos em questão. Refiro-me ao suprarreferido artigo: «Pôr os jovens a ler jornais». Pretendendo ser claro na minha opinião, a gravidade deste artigo é a hipocrisia e a falácia que lhe subjazem. Por outras palavras, a incoerência política. Eu pergunto, de que vale a assinatura gratuita do JL numa biblioteca/mediateca escolar de uma EB 2,3? São poucos os professores que o lêem, os alunos nem lhe tocam. Coloquem lá O Record, A Bola, o 24 Horas ou o Correio da Manhã, por muito sensacionalistas que estes jornais sejam, os alunos – pelo menos – abrem-nos. Quanto à imprensa regional, por muito louvável que a existência desta seja (temos jornais reputadíssimos como o do Fundão), mas, para além de raras excepções, em geral são pouco receptivos à participação em projectos escolares (não pretendo falar no conteúdo de alguns para não melindrar ninguém). As boas intenções, uma prosa bem articulada, o mero facto da impressão da palavra em suporte de papel, não leva a lado algum. É tão parada como as acções desses senhores. Há que definir o «quê», o «como» e o «quando e onde». Sendo o «quê» o conhecimento a transmitir; o «como», a forma de o operacionalizar; o «quando e onde», o seu contexto sociocultural, físico e temporal. Para isso é necessário dotar, primeiro, as escolas de recursos para que, de seguida, se possam implementar métodos e estratégias activas que levem à criação de dinâmicas que motivem os alunos para a leitura. Para que se não pense que estou a ser demasiado académico ou teórico, vou tentar dar um exemplo entre os muitos métodos e estratégias activos possíveis: Todos os anos se fazem Feiras do Livro nas escolas, que regra geral não passam de meras livrarias transplantadas para um meio escolar. Depois, levam-se turma a turma numa hora X à exposição dos livros Y, melhor seria levá-las ao cinema – divertiam-se mais. Por que razão não se fazem jogos: puzzels, palavras cruzadas, sopas de letras, inquéritos (elaborados pelos próprios alunos) ou questionários sobre um determinado livro ou livros, que os aproxime e os faça procurar de uma forma activa o livro ou os livros, a revista ou o jornal. Para ultrapassar letargias socioculturais é preciso ser um pouco mais inventivo e dinâmico, não basta falar. O artigo de Feliciano Barreiras Duarte, Secretário de Estado-Adjunto do Ministro da Presidência, «Pôr os jovens a ler jornais», não passa disso mesmo: uma ida à Feira do Livro numa escola do interior. O artigo que o Sr Feliciano Barreiras Duarte escreveu deveria ter sido em carta (de predferência Correio Azul) à Ministra da Educação, a sugerir-lhe a necessidade de dotar as escolas de jornais e revistas que atraiam os alunos e que sejam capazes de competir com os meios audio-visuais que são colocados nas mediatecas/bibliotecas. Tal como ultimamente se tem vindo a verificar, as bibliotecas escolares têm vindo a ser cada vez mais utilizadas pelos alunos como salas de jogos e de cinema, chegando-se ao cúmulo de, por vezes, alugarem filmes para ver na mediateca, aliás, neste caso, ludoteca. Porém, não se deve entender a educação como uma domesticação, antes como a activação de saberes e conhecimentos, como uma forma de levar mais massa crítica à nossa sociedade. Quanto mais cultos os portugueses forem menor serão os atropelos à natureza, à democracia e, fundamentalmente, à dignidade humana e assim se aprende a ser democrático e pluralista.
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Partindo do princípio de que quanto mais alta a escolaridade, maior a produtividade, impõe-se a necessidade de criar mais massa crítica na nossa sociedade. Como fazê-lo? revela-se uma questão muito mais difícil do que o mero reduzir aqui e aumentar ali que tem vindo a caracterizar as sucessivas reformas curriculares. Neste sentido, um artigo pelo título de «Pôr os jovens a ler jornais», da pena de Feliciano Barreiras Duarte, Secretário de Estado-Adjunto do Ministro da Presidência (publicado n’O Expresso de 30/10/04, 1º Caderno, pp. 28s.), suscitou-me muitas dúvidas e ainda mais interrogações. A escola é um espaço de aprendizagem bem como de socialização. Exterior à escola existe um meio sociocultural e geográfico que continua a ser um foco inibidor de progressos, apesar do fenómeno da globalização. O nível de literacia do povo português é proporcional aos seus hábitos de leitura. Como combater a falta de hábitos de leitura dos nossos alunos sem sensibilizar as famílias para a aquisição de uma maior bagagem cultural? A interrogação fica suspensa, como ficará suspensa a resposta. Será muito difícil combater séculos de letargia cultural e democrática a que o nosso povo foi sujeito. Quando efectivamente tínhamos meios, humanos e económicos, para superar esse défice, houve uma classe dominante que se impôs e esbanjou ao desbarato recursos preciosos de um país pobre; a Inquisição, por outro lado, estropiou, silenciou e afugentou quem de conhecimento e quando alguém surgiu que pôs algum cobro à situação, apesar de algumas medidas controversas, refiro-me ao Marquês de Pombal, logo foi levado ao exílio interior. O panorama não podia ser pior, se não falássemos no 25 de Abril. Mesmo este deixou muito boa gente de pantanas, sem saber ao certo a definição de democracia. Tem vindo a ser aprendida, mas com muitas dificuldades. A mesma dificuldade perpetua-se nos nossos governantes, que continuam a não fazer o trabalho de casa, preferindo atirar o barro à parede para ver o que dá. Tudo é avulso e mediático, em vez de se estudar, ponderar e reavaliar, esperam-se apenas reacções públicas. Escrevem-se uns artigos para jornais, de preferência com reputação, boa tiragem e publicação. São eles figuras destacadas: ministros, secretários de estado, políticos, professores universitários, e mais um rol deles [não querendo eu ferir susceptibilidades, sendo mais certo que o faça]. As razões das publicações: políticas, auto-promoção, currículo, mas há aqueles que o fazem com seriedade – afinal, nem todos somos iguais. Há ainda aqueles que escrevem coisas interessantes, mas nem descobriram a pólvora, nem dizem nada de novo, muito menos acrescentam matéria relevante para os assuntos em questão. Refiro-me ao suprarreferido artigo: «Pôr os jovens a ler jornais». Pretendendo ser claro na minha opinião, a gravidade deste artigo é a hipocrisia e a falácia que lhe subjazem. Por outras palavras, a incoerência política. Eu pergunto, de que vale a assinatura gratuita do JL numa biblioteca/mediateca escolar de uma EB 2,3? São poucos os professores que o lêem, os alunos nem lhe tocam. Coloquem lá O Record, A Bola, o 24 Horas ou o Correio da Manhã, por muito sensacionalistas que estes jornais sejam, os alunos – pelo menos – abrem-nos. Quanto à imprensa regional, por muito louvável que a existência desta seja (temos jornais reputadíssimos como o do Fundão), mas, para além de raras excepções, em geral são pouco receptivos à participação em projectos escolares (não pretendo falar no conteúdo de alguns para não melindrar ninguém). As boas intenções, uma prosa bem articulada, o mero facto da impressão da palavra em suporte de papel, não leva a lado algum. É tão parada como as acções desses senhores. Há que definir o «quê», o «como» e o «quando e onde». Sendo o «quê» o conhecimento a transmitir; o «como», a forma de o operacionalizar; o «quando e onde», o seu contexto sociocultural, físico e temporal. Para isso é necessário dotar, primeiro, as escolas de recursos para que, de seguida, se possam implementar métodos e estratégias activas que levem à criação de dinâmicas que motivem os alunos para a leitura. Para que se não pense que estou a ser demasiado académico ou teórico, vou tentar dar um exemplo entre os muitos métodos e estratégias activos possíveis: Todos os anos se fazem Feiras do Livro nas escolas, que regra geral não passam de meras livrarias transplantadas para um meio escolar. Depois, levam-se turma a turma numa hora X à exposição dos livros Y, melhor seria levá-las ao cinema – divertiam-se mais. Por que razão não se fazem jogos: puzzels, palavras cruzadas, sopas de letras, inquéritos (elaborados pelos próprios alunos) ou questionários sobre um determinado livro ou livros, que os aproxime e os faça procurar de uma forma activa o livro ou os livros, a revista ou o jornal. Para ultrapassar letargias socioculturais é preciso ser um pouco mais inventivo e dinâmico, não basta falar. O artigo de Feliciano Barreiras Duarte, Secretário de Estado-Adjunto do Ministro da Presidência, «Pôr os jovens a ler jornais», não passa disso mesmo: uma ida à Feira do Livro numa escola do interior. O artigo que o Sr Feliciano Barreiras Duarte escreveu deveria ter sido em carta (de predferência Correio Azul) à Ministra da Educação, a sugerir-lhe a necessidade de dotar as escolas de jornais e revistas que atraiam os alunos e que sejam capazes de competir com os meios audio-visuais que são colocados nas mediatecas/bibliotecas. Tal como ultimamente se tem vindo a verificar, as bibliotecas escolares têm vindo a ser cada vez mais utilizadas pelos alunos como salas de jogos e de cinema, chegando-se ao cúmulo de, por vezes, alugarem filmes para ver na mediateca, aliás, neste caso, ludoteca. Porém, não se deve entender a educação como uma domesticação, antes como a activação de saberes e conhecimentos, como uma forma de levar mais massa crítica à nossa sociedade. Quanto mais cultos os portugueses forem menor serão os atropelos à natureza, à democracia e, fundamentalmente, à dignidade humana e assim se aprende a ser democrático e pluralista.