No travesseiro, Marcelo é angolano

23-05-2019
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Foi uma confissão, uma graça e mais um soundbyte na campanha de charme que está a fazer pela aceitação de Portugal em Angola: Marcelo Rebelo de Sousa diz que tem pena de "não ser possível percorrer todo o territorial angolano”, até porque seria preciso convencer a Assembleia da República a autorizar uma longa presença em Angola, o que suscitaria alguns problemas políticos internos e externos”, gracejou num discurso na Escola Portuguesa de Luanda, onde almoçou este sábado com a comunidade portuguesa."Poderia ser interpretado por uma preferência presidencial por Angola, e há coisas que um presidente não pode dizer, a não ser para o travesseiro.”

Marcelo Rebelo de Sousa comemora três anos de mandato este sábado, em Luanda, e depois do último encontro de manhã com João Lourenço no Palácio da Cidade Alta (sem declarações à imprensa), o Presidente português passou do poder temporal para o espiritual sem aviso prévio (nem alguns dos assessores sabiam). Aquela reunião não estava no programa, mas Marcelo, o católico, saiu da residência oficial, deu uma volta de carro só para sair das instalações da Cidade Alta e entrou na porta ao lado, no palácio episcopal - que fica colado ao palacete dos presidentes angolanos - para se encontrar com o Cardeal D. Alexande Nascimento, arcebispo emérito de Luanda.

Foi mais um momento com valor simbólico: o cardeal, com 94 anos, é uma das figuras de referência da sociedade angolana, que teve um especial papel na reconciliação antes e depois da guerra civil.

No primeiro ponto de agenda, Marcelo tinha visitado a Fortaleza de Luanda e o Museu Histórico-Militar, onde estão expostos os símbolos da luta dos movimentos de libertação. É sempre um momento de potencial de embaraço para dirigentes políticos portugueses (por exemplo, estão expostos objectos como uma catana usada nos primeiros ataques da UPA aos colonos portugueses em 1961, e há referências a atrocidades cometidas por tropas portuguesas, que Marcelo não viu). Quando visitou o local em setembro, António Costa viu-se forçado, no fim, a dizer que “o passado fica no museu”. Mas Marcelo deu a volta ao texto de outra maneira. No discurso que faria horas depois na Escola Portuguesa de Luanda disse ter encontrado na fortaleza "a junção de duas histórias". A história de Portugal "marcada por altos e baixos, altos importantes e muitos baixos”. E a segunda, que "abriu caminho para a unidade de Angola”.

Uma comemoração cavaquista

Na intervenção feita perante centenas de portugueses na escola onde também estudam os filhos da elite angolana - o ministro de Estado que acompanha Marcelo disse-lhe que os seus filhos estudaram aqui - Marcelo deixou um recado implícito para os dirigentes locais: os políticos servem o povo e não a si mesmos (é preciso ver que muitos discursos de Marcelo ao longo da visita de Estado são emitidos em direto nas televisões angolanas). O Presidente português reforçava a ideia de que os acordos celebrados entre os dois países, “antes de serem uma questão de políticos, de poderes políticos, são uma questão de povos, uma questão de pessoas. Tenho repetido ao longo destes dias intensos, que os políticos servem para servir as pessoas". Ou seja: que este poder representado por João Lourenço não repita os erros de José Eduardo dos Santos e família.

Em dia de celebração do terceiro aniversário da tomada de posse, uma bicada no antecessor: “Cavaco Silva gostava de celebrar os mandatos juntos das comunidade. Como veem há realidades em que sou cavaquista”. Risos na assistência. Depois corrigiu, ou suavizou: "Na afirmação de Portugal no mundo" - e aqui citou o nome de todos os presidentes que o antecederam - “o que nos une é muito superior ao que em termos de estilo nos pode separar".

Acordos vão ser seguidos por comissão ministerial

Os 35 acordos entre Portugal e Angola estão firmados e agora há que lhes dar seguimento. Foi o próprio Marcelo Rebelo de Sousa que o disse num dos discursos: os protocolos não eram para ficar apenas em intenções, no papel. No primeiro semestre de 2019 vai realizar-se a primeira reunião da comissão ministerial permanente em Luanda, entre equipas dos dois países (no segundo semestre reúnem-se em Lisboa), avançaram as duas delegações em comunicado, depois da última reunião entre o Presidente português e João Lourenço, no Palácio da Cidade Alta.

A conclusão do acordo para eliminar a dupla tributação em matéria de impostos e rendimento e prevenir a fraude e evasão fiscal foi destacado no comunicado como a medida mais importante. É o primeiro acordo destes firmado por Angola e, para o Governo português, significa a remoção de um dos principais obstáculos ao investimento no país.

Tanto este acordo como a credenciação e pagamento das dívidas às empresas portuguesas começaram a ser negociadas antes da visita de António Costa em setembro a Luanda, sabe o Expresso, e terá sido uma das contrapartidas apresentadas para Portugal aumentar a linha especial de crédito da COSEC para apoiar o investimento português em Angola de mil milhões para 1,5 mil milhões (uma espécie de seguro que permite às empresas portuguesas terem liquidez enquanto as dívidas não são liquidadas). Marcelo Rebelo de Sousa regressa a Portugal este sábado à tarde.

Foi uma confissão, uma graça e mais um soundbyte na campanha de charme que está a fazer pela aceitação de Portugal em Angola: Marcelo Rebelo de Sousa diz que tem pena de "não ser possível percorrer todo o territorial angolano”, até porque seria preciso convencer a Assembleia da República a autorizar uma longa presença em Angola, o que suscitaria alguns problemas políticos internos e externos”, gracejou num discurso na Escola Portuguesa de Luanda, onde almoçou este sábado com a comunidade portuguesa."Poderia ser interpretado por uma preferência presidencial por Angola, e há coisas que um presidente não pode dizer, a não ser para o travesseiro.”

Marcelo Rebelo de Sousa comemora três anos de mandato este sábado, em Luanda, e depois do último encontro de manhã com João Lourenço no Palácio da Cidade Alta (sem declarações à imprensa), o Presidente português passou do poder temporal para o espiritual sem aviso prévio (nem alguns dos assessores sabiam). Aquela reunião não estava no programa, mas Marcelo, o católico, saiu da residência oficial, deu uma volta de carro só para sair das instalações da Cidade Alta e entrou na porta ao lado, no palácio episcopal - que fica colado ao palacete dos presidentes angolanos - para se encontrar com o Cardeal D. Alexande Nascimento, arcebispo emérito de Luanda.

Foi mais um momento com valor simbólico: o cardeal, com 94 anos, é uma das figuras de referência da sociedade angolana, que teve um especial papel na reconciliação antes e depois da guerra civil.

No primeiro ponto de agenda, Marcelo tinha visitado a Fortaleza de Luanda e o Museu Histórico-Militar, onde estão expostos os símbolos da luta dos movimentos de libertação. É sempre um momento de potencial de embaraço para dirigentes políticos portugueses (por exemplo, estão expostos objectos como uma catana usada nos primeiros ataques da UPA aos colonos portugueses em 1961, e há referências a atrocidades cometidas por tropas portuguesas, que Marcelo não viu). Quando visitou o local em setembro, António Costa viu-se forçado, no fim, a dizer que “o passado fica no museu”. Mas Marcelo deu a volta ao texto de outra maneira. No discurso que faria horas depois na Escola Portuguesa de Luanda disse ter encontrado na fortaleza "a junção de duas histórias". A história de Portugal "marcada por altos e baixos, altos importantes e muitos baixos”. E a segunda, que "abriu caminho para a unidade de Angola”.

Uma comemoração cavaquista

Na intervenção feita perante centenas de portugueses na escola onde também estudam os filhos da elite angolana - o ministro de Estado que acompanha Marcelo disse-lhe que os seus filhos estudaram aqui - Marcelo deixou um recado implícito para os dirigentes locais: os políticos servem o povo e não a si mesmos (é preciso ver que muitos discursos de Marcelo ao longo da visita de Estado são emitidos em direto nas televisões angolanas). O Presidente português reforçava a ideia de que os acordos celebrados entre os dois países, “antes de serem uma questão de políticos, de poderes políticos, são uma questão de povos, uma questão de pessoas. Tenho repetido ao longo destes dias intensos, que os políticos servem para servir as pessoas". Ou seja: que este poder representado por João Lourenço não repita os erros de José Eduardo dos Santos e família.

Em dia de celebração do terceiro aniversário da tomada de posse, uma bicada no antecessor: “Cavaco Silva gostava de celebrar os mandatos juntos das comunidade. Como veem há realidades em que sou cavaquista”. Risos na assistência. Depois corrigiu, ou suavizou: "Na afirmação de Portugal no mundo" - e aqui citou o nome de todos os presidentes que o antecederam - “o que nos une é muito superior ao que em termos de estilo nos pode separar".

Acordos vão ser seguidos por comissão ministerial

Os 35 acordos entre Portugal e Angola estão firmados e agora há que lhes dar seguimento. Foi o próprio Marcelo Rebelo de Sousa que o disse num dos discursos: os protocolos não eram para ficar apenas em intenções, no papel. No primeiro semestre de 2019 vai realizar-se a primeira reunião da comissão ministerial permanente em Luanda, entre equipas dos dois países (no segundo semestre reúnem-se em Lisboa), avançaram as duas delegações em comunicado, depois da última reunião entre o Presidente português e João Lourenço, no Palácio da Cidade Alta.

A conclusão do acordo para eliminar a dupla tributação em matéria de impostos e rendimento e prevenir a fraude e evasão fiscal foi destacado no comunicado como a medida mais importante. É o primeiro acordo destes firmado por Angola e, para o Governo português, significa a remoção de um dos principais obstáculos ao investimento no país.

Tanto este acordo como a credenciação e pagamento das dívidas às empresas portuguesas começaram a ser negociadas antes da visita de António Costa em setembro a Luanda, sabe o Expresso, e terá sido uma das contrapartidas apresentadas para Portugal aumentar a linha especial de crédito da COSEC para apoiar o investimento português em Angola de mil milhões para 1,5 mil milhões (uma espécie de seguro que permite às empresas portuguesas terem liquidez enquanto as dívidas não são liquidadas). Marcelo Rebelo de Sousa regressa a Portugal este sábado à tarde.

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