António Costa defendeu Siza Vieira até ao limite. Colocou o futuro do ministro nas mãos do Constitucional e da PGR e deu o peito às balas: assumiu a autoria da mudança ao Código dos Valores Mobiliários propositada para beneficiar os chineses na EDP e tirou a pressão sobre o ministro Adjunto
Texto Vítor Matos
António Costa, como costumam fazer todos os primeiros-ministros, defende os seus ministros até ao limite. Esta quarta-feira, no debate quinzenal, foi até onde podia pelo ministro Adjunto, Pedro Siza Vieira. Desculpou-lhe uma ilegalidade com um “lapso”. E assumiu a autoria de uma decisão que favorece os chineses acionistas da EDP, tirando a carga negativa que ensombrava o ministro, seu amigo há muitos anos.
A sensação que fica do debate parlamentar é que a história não deve ficar por aqui. Fernando Negrão, líder parlamentar do PSD, falou da necessidade de o Tribunal Constitucional se pronunciar sobre o “lapso” de Siza Vieira por se ter mantido dois meses no Governo apesar de ter uma incompatibilidade (por ter sido gerente de uma empresa imobiliária com a sua mulher quando já estava em funções). “Se tem consequências por outras entidades, só outras entidades a pode ter [sic]”, respondeu Costa.
Com aquela frase, atirou para o Constitucional ou para a Procuradoria-Geral da República - talvez para o Presidente da República - a interpretação da lei que diz que estas situações de incompatibilidade têm a demissão de um ministro como consequência. Significado? Costa desculpa o lapso do seu ministro, retira-lhe a carga intencional - até porque ele próprio já teve outros lapsos com declarações ao TC -, mas percebe-se que Siza Vieira está num limbo político neste momento. Costa aqui já só controla o que pode controlar.
Noutro momento, António Costa deu ele próprio o peito às balas como escudo protetor de Siza Veira. Assumiu que foi por proposta do seu gabinete e não por sugestão da Estrutura de Missão para o Programa Capitalizar - que Siza Veira integrava ainda como advogado antes de ir para o Governo - que se fez a alteração ao Código dos Valores Mobiliários para permitir aos acionistas chineses da EDP poderem votar em separado e terem maior peso na assembleia geral. O primeiro-ministro assumiu que a intenção era mesmo beneficiar os investidores chineses (a dúvida que recaía sobre Siza Vieira), embora alegando que há um ano não se sabia da intenção de haver uma OPA. Por aqui, Costa tentou blindar o ministro de mais suspeitas. Tendo em conta a pressão do PSD, o tema do alegado benefício aos chineses também poderá não morrer aqui.
O primeiro-ministro tem, de facto, uma imensa capacidade de driblar as perguntas incómodas da oposição, mas desta vez fez menos uso da sua habilidade retórica e mais o papel de um defesa central aflito que tenta salvar a equipa e chuta a bola para a bancada. Não respondeu de forma esclarecedora a muitas perguntas.
Até quando Assunção Cristas lhe perguntou sobre a eutanásia, Costa disse que era uma matéria da Assembleia da República e não do Governo - embora em entrevistas já tenha hesitado na defesa da morte assistida. Manifestou dúvidas que aqui não confessou.
Quando o Bloco colocou no plenário a nulidade de medidas de Manuel Pinho sobre a eletricidade, Costa atirou para um grupo de trabalho e disse que não interessava personalizar o problema. Percebe-se por aqui como vai o Bloco de Esquerda tentar conduzir a comissão de inquérito que tomou posse também esta quarta-feira para investigar as rendas da energia e o próprio papel do ex-ministro do PS Manuel Pinho.
Debate a debate, o líder parlamentar do PSD - que começou muito fragilizado e sem apoio da bancada - tem melhorando a prestação em segurança e agressividade. Duas semanas depois de ter sido o primeiro deputado a suscitar o caso Sócrates no Parlamento, encostou Costa às cordas em relação a Pedro Siza Vieira. O primeiro-ministro defendeu quase todas as bolas. Mas já se percebeu que o jogo terá prolongamento.
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António Costa defendeu Siza Vieira até ao limite. Colocou o futuro do ministro nas mãos do Constitucional e da PGR e deu o peito às balas: assumiu a autoria da mudança ao Código dos Valores Mobiliários propositada para beneficiar os chineses na EDP e tirou a pressão sobre o ministro Adjunto
Texto Vítor Matos
António Costa, como costumam fazer todos os primeiros-ministros, defende os seus ministros até ao limite. Esta quarta-feira, no debate quinzenal, foi até onde podia pelo ministro Adjunto, Pedro Siza Vieira. Desculpou-lhe uma ilegalidade com um “lapso”. E assumiu a autoria de uma decisão que favorece os chineses acionistas da EDP, tirando a carga negativa que ensombrava o ministro, seu amigo há muitos anos.
A sensação que fica do debate parlamentar é que a história não deve ficar por aqui. Fernando Negrão, líder parlamentar do PSD, falou da necessidade de o Tribunal Constitucional se pronunciar sobre o “lapso” de Siza Vieira por se ter mantido dois meses no Governo apesar de ter uma incompatibilidade (por ter sido gerente de uma empresa imobiliária com a sua mulher quando já estava em funções). “Se tem consequências por outras entidades, só outras entidades a pode ter [sic]”, respondeu Costa.
Com aquela frase, atirou para o Constitucional ou para a Procuradoria-Geral da República - talvez para o Presidente da República - a interpretação da lei que diz que estas situações de incompatibilidade têm a demissão de um ministro como consequência. Significado? Costa desculpa o lapso do seu ministro, retira-lhe a carga intencional - até porque ele próprio já teve outros lapsos com declarações ao TC -, mas percebe-se que Siza Vieira está num limbo político neste momento. Costa aqui já só controla o que pode controlar.
Noutro momento, António Costa deu ele próprio o peito às balas como escudo protetor de Siza Veira. Assumiu que foi por proposta do seu gabinete e não por sugestão da Estrutura de Missão para o Programa Capitalizar - que Siza Veira integrava ainda como advogado antes de ir para o Governo - que se fez a alteração ao Código dos Valores Mobiliários para permitir aos acionistas chineses da EDP poderem votar em separado e terem maior peso na assembleia geral. O primeiro-ministro assumiu que a intenção era mesmo beneficiar os investidores chineses (a dúvida que recaía sobre Siza Vieira), embora alegando que há um ano não se sabia da intenção de haver uma OPA. Por aqui, Costa tentou blindar o ministro de mais suspeitas. Tendo em conta a pressão do PSD, o tema do alegado benefício aos chineses também poderá não morrer aqui.
O primeiro-ministro tem, de facto, uma imensa capacidade de driblar as perguntas incómodas da oposição, mas desta vez fez menos uso da sua habilidade retórica e mais o papel de um defesa central aflito que tenta salvar a equipa e chuta a bola para a bancada. Não respondeu de forma esclarecedora a muitas perguntas.
Até quando Assunção Cristas lhe perguntou sobre a eutanásia, Costa disse que era uma matéria da Assembleia da República e não do Governo - embora em entrevistas já tenha hesitado na defesa da morte assistida. Manifestou dúvidas que aqui não confessou.
Quando o Bloco colocou no plenário a nulidade de medidas de Manuel Pinho sobre a eletricidade, Costa atirou para um grupo de trabalho e disse que não interessava personalizar o problema. Percebe-se por aqui como vai o Bloco de Esquerda tentar conduzir a comissão de inquérito que tomou posse também esta quarta-feira para investigar as rendas da energia e o próprio papel do ex-ministro do PS Manuel Pinho.
Debate a debate, o líder parlamentar do PSD - que começou muito fragilizado e sem apoio da bancada - tem melhorando a prestação em segurança e agressividade. Duas semanas depois de ter sido o primeiro deputado a suscitar o caso Sócrates no Parlamento, encostou Costa às cordas em relação a Pedro Siza Vieira. O primeiro-ministro defendeu quase todas as bolas. Mas já se percebeu que o jogo terá prolongamento.