abro Paginas Encontro Espelhos: cartas que talvez nunca tenha lido até ao fim

19-06-2020
marcar artigo

Apenas 

uma coisa inteiramente transparente: 

o céu, e por baixo dele a linha obscura do horizonte 

nos teus olhos, que pude ver ainda 

através de pálpebras semicerradas, pestanas húmidas 

da geada matinal, uma névoa de palavras murmuradas 

num silêncio de hesitações. Há quanto tempo, 

tudo isto? Abro o armário onde o tempo antigo 

se enche de bolor e fungos; limpo os papéis, 

cartas que talvez nunca tenha lido até ao fim, foto- 

grafias cuja cor desaparece, substituindo os corpos 

por manchas vagas como aparições; e sinto, eu 

próprio, que uma parte da minha vida se apaga 

com esses restos. 

Nuno Júdice

Apenas 

uma coisa inteiramente transparente: 

o céu, e por baixo dele a linha obscura do horizonte 

nos teus olhos, que pude ver ainda 

através de pálpebras semicerradas, pestanas húmidas 

da geada matinal, uma névoa de palavras murmuradas 

num silêncio de hesitações. Há quanto tempo, 

tudo isto? Abro o armário onde o tempo antigo 

se enche de bolor e fungos; limpo os papéis, 

cartas que talvez nunca tenha lido até ao fim, foto- 

grafias cuja cor desaparece, substituindo os corpos 

por manchas vagas como aparições; e sinto, eu 

próprio, que uma parte da minha vida se apaga 

com esses restos. 

Nuno Júdice

marcar artigo